CapÃtulo 9 - Constância
Constância, o filho, Helena e pequena comitiva saÃram logo pela manhã.
Seguiam rumo a Nicomédia, onde LicÃnio se refugiara, buscando algum tempo para que pudesse negociar algo em seu favor, junto ao seu opositor.
Assim que o pequeno grupo alcançou o seu destino, LicÃnio foi avisado da chegada da famÃlia.
Ao avistá-lo, o coração de Constância disparou. O marido estava pálido e abatido, visivelmente doente. Ela correu-lhe ao encontro, angustiada:
- Como está, querido? Fiquei tão preocupada...
Erguendo um pouco a cabeça, ele respondeu, agressivo:
- Como acha que posso estar? Seu irmão me tirou tudo... Abraçando-o com ternura, ela pediu:
- Querido, é hora de abrir mão dessa disputa.
Acabou. Constantino ocupou Bizâncio, mas lhe concedeu o perdão e o direito de ficarmos todos juntos. Poderemos viver nossa vida...
- Que vida? O que me resta além da vergonha, da humilhação da derrota? Uma vida medÃocre, em um buraco qualquer, fugindo e temendo as atitudes de Constantino?
Aproximando-se, Juliano tocou o ombro do pai, que permanecia sentado, cabisbaixo, e pediu:
- Anime-se, pai. Com sua experiência, pode ainda realizar muitas coisas...
Erguendo a cabeça o imperador abatido fitou o filho e comentou:
- Você não tem mesmo brios, não é? Estou derrotado. Minha famÃlia está envergonhada, vencida... Meu reino foi tirado, eu perdi tudo...
Estou derrotado... Já nada mais me interessa...
- Constantino permitirá que vivamos com tudo aquilo de que necessitamos - aduziu Constância.
- Você poderá fazer as coisas de que gosta, ou pelo menos gostava quando nos conhecemos...
Olhando para a esposa, ele permaneceu em silêncio. Depois indagou:
- E para onde vai nos enviar? Decerto para algum fim de mundo, abandonado por todos...
- Não sei bem, mas acho que nos enviará para Tessalônica. Erguendo-se, LicÃnio indagou:
- Tessalônica?
- Acho que sim.
- E por quê? -Quando me disse que concordava em perdoá-lo, ouvi uma conversa breve entre ele e Marco, e parece que falaram algo sobre Tessalônica. Gostaria de ir para lá, LicÃnio?
- Mas é claro! É um lugar de onde posso fazer muitos contatos e, quem sabe, reorganizar um exército...
Colocando o dedo indicador sobre os lábios do marido, ela pediu:
- Não fale nada, por favor.
Olhou na direção dos soldados que os haviam acompanhado e pediu:
- Agora temos de ir. Constantino nos aguarda.
Ainda sem ânimo, LicÃnio juntou-se ao grupo e retornaram para Bizâncio. Ao entrarem na localidade fortificada, LicÃnio não conseguia conter o ódio que sentia por ter perdido aquela poderosa cidade. Via o desprezo no olhar daque-les que haviam sido seus súditos. Seu ódio crescia a cada passo que dava. Ao aproximar-se da ampla sala que havia sido seu lugar preferido para governar, sua cólera aumentou ainda mais. Seu coração batia descompassado, suas mãos estavam geladas e trêmulas, mas LicÃnio sabia, como ninguém, controlar e dissimular as emoções. Ao divisar seu trono ocupado pelo rival, sentiu como se todo o sangue do corpo lhe subisse à cabeça.
Seu coração parecia que explodiria dentro do peito. Ao vê-lo, Constantino ergueu-se e aproximou-se. LicÃnio, ciente de sua posição, ajoelhou-se diante do inimigo e permaneceu de cabeça quase no chão. Constantino observou-o atentamente e depois de alguns segundos disse:
- Levante-se, LicÃnio. Você está perdoado. Poderá passar o resto de seus dias com todo o conforto e toda a sua riqueza. Seu exÃlio será em Tessalônica. Partem pela manhã.
Sem dizer nada, LicÃnio balançou a cabeça e ajoelhou-se outra vez em reverência diante do opositor. Constantino pediu:
- Agora vamos, como forma de encerrarmos de vez essa disputa. E hora de agirmos como cidadãos romanos da alta estirpe que somos. Venha sentar-se comigo á mesa. Cearemos e encerraremos essa discórdia de vez. Fomos amigos, afinal.
Consideremos que a posição que ocupávamos nos obrigou aos atos que tivemos. Mas entre nós, LicÃnio, nada existe que nos faça reais inimigos...
Concordando mais uma vez com a cabeça, em silêncio, LicÃnio acompanhou a comitiva que seguia Constantino até uma enorme sala onde grande mesa estava montada. Acomodaram-se.
Constância, que ocupava o lugar ao lado do marido, buscava distraÃ-lo e animá-lo o quanto podia. Mas sabia que aquele era um momento tremendamente difÃcil para ele. O ato de perdão e concórdia de Constantino tornava-o ainda mais forte diante dos cidadãos de Bizancio e de seus próprios comandados. Aquele parecia um homem perfeito, quase um deus...
Na manhã seguinte, número considerável de homens seguiu para Tessalônica com LicÃnio e sua famÃlia. O imperador vencido seguiu calado a maior parte do caminho. Por mais que Constância tentasse conversar, permaneceu mudo.
Depois de acomodado em ampla mansão, com todo o conforto e trazendo consigo as riquezas pessoais, conforme Constantino havia prometido, LicÃnio descansou pelo resto do dia. À noite, pouco antes do jantar, avisou:
- Não me esperem para o jantar. Surpresa, a esposa perguntou:
- Aonde vai?
- Preciso encontrar alguns velhos amigos. Espero que eles possam ajudar-me.
Pressentindo com clareza as intenções do marido, Constância pediu:
- Querido, acabamos de chegar e você precisa se recuperar. Ainda está cansado...
Sem esperar que terminasse ele falou:
- Cale-se, Constância. Sua voz me irrita! Com lágrimas nos olhos ela respondeu:
- Eu só quero o seu bem...
- Então deixe-me em paz!
E saiu imediatamente, sem dizer mais nada.
Distante dali, Constantino jantava exultante com seus homens de confiança e com a famÃlia.
Crispus estava sentado à sua direita e Fausta ocupava o outro lado da mesa. A bela e sensual esposa do imperador tinha traços delicados. Sua beleza era suave e discreta, carregada de feminilidade e sutilezas. Ela sabia da atração que causava no sexo oposto e utilizava esse poder conscientemente. Era altiva, e sua posição a envaidecia e alimentava fortemente seu orgulho.
Constantino conversava animado sobre seus planos:
- Vou transformar Bizâncio na capital do império.
Aqui será o centro do mundo!
Marco sorriu e indagou:
- E quanto a Roma?
- Roma está decadente. Quero algo especial, que marque minha passagem sobre este império para sempre.
Fausta acompanhava a conversa em silêncio. Depois de longa pausa do pai, Crispus indagou:
- Confia em LicÃnio? Vai deixá-lo mesmo livre?
Acho que ele será perigoso... DeverÃamos tê-lo aqui conosco, como seu prisioneiro...
Constantino fitou o filho e comentou:
- Ora, Crispus, por que sempre questiona minhas ordens? Não consegue confiar em minhas decisões, não é?
O rapaz ficou imediatamente lÃvido. Não conseguia aproximar-se mais de seu pai e isso o incomodava muito. Respirou fundo antes de responder:
- Não é isso, pai... Mas ele é um homem perigoso, você sabe... Constantino bateu com toda a força sobre a mesa e disse:
- Acha que porque venceu uma batalhazinha no mar pode questionar minhas ordens, minhas decisões?
Fez uma pausa, depois concluiu:
- Sei muito bem o que estou fazendo.
Rubro de raiva, Crispus baixou a cabeça e continuou comendo. Constantino comentou com Marco, sentado à sua direita:
- Insolente, esse meu filho...
Na verdade, Marco também não compreendia a reação do imperador. Quando recebera a notÃcia da corajosa e brava vitória que o rapaz havia alcançado no estreito do Helesponto, ele demonstrara quase desdém. O homem de maior confiança de Constantino não conseguia compreender-lhe a reação.
Fausta, que tudo observava em silêncio, comentou com sua serva pouco depois, em seu quarto, enquanto aquela lhe penteava os longos cabelos castanhos:
- Sei bem por que Constantino não reconhece a fragorosa vitória do filho.
- E por que, minha senhora?
- Ficou com ciúme, isso sim.
- A senhora acha?!
- Tenho certeza. Ele tem medo até da própria sombra. Não tardará e esse ciúme vai controlá-lo.
Até porque Crispus está ficando cansado de fazer tudo pelo pai e não ser reconhecido.
Sorrindo maliciosamente, ela completou:
- Vamos dar uma ajudazinha à natureza, é claro...
Sem compreender, a serva terminou o que fazia e então ajudou sua senhora a trocar de roupa, acomodou-a na cama e saiu do quarto apagando uma das velas.
segunda-feira, 18 de setembro de 2017
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