segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Capítulo 8 - Não Tardou

Não tardou e dezenas de pequenas embarcações atracaram. O de-sembarque foi rápido e ágil. Assim que a maioria de seus homens alcançou terra firme, Constantino subiu depressa em seu cavalo e tomou a dianteira dos soldados. Andou um pouco e logo avistou o exército de Licínio. Intensa bata-lha se seguiu. Embora quase 25 mil homens tenham sido dizimados naquela tarde, Constantino não se sentia satisfeito. Caminhou, sem sucesso, entre os corpos estendidos à procura do rival. Depois se aproximou dos homens derrotados e perguntou irritado:

- Onde está seu vencido imperador? Por que não o encontro em parte alguma? Fugiu novamente, aquele covarde?


Os soldados de Licínio mantinham-se de cabeça baixa, temerosos. Constantino insistia, erguendo mais e mais a voz:


- Todos ficarão a noite inteira sem água ou comida, e amanhã também, e assim sucessivamente, até que me digam onde está o covarde!


Um dos soldados ergueu levemente o rosto e, sem olhar diretamente para Constantino, balbuciou quase num murmúrio:


- Ele fugiu para a Nicomédia.


Constantino virou-se e olhou para a direção de onde vinha a voz, quase em enxergar o homem.


Aproximou-se, agachou-se e, segurando-lhe o queixo, ordenou:

- Fale sem medo, homem! Não lhe farei mal. Não um mal maior do que o seu general lhes fez! Não tenha piedade de alguém que não se preocupa com seus próprios soldados!


Ainda temeroso, o homem prosseguiu:


- Ele fugiu assim que viu seus barcos se aproximarem; antes mesmo que seu exército tocasse o solo, fugiu para a Nicomédia.


Erguendo-se satisfeito, Constantino ordenou: 


- Água e comida a todos os prisioneiros. Cuidem dos feridos e coloquem-nos nos barcos. Vamos voltar imediatamente a Bizâncio.

E silenciando por alguns instantes, balbuciou por fim, como se pensasse alto:


- Deixem esse covarde comigo...


Quando adentrou os pesados portões de Bizâncio, o imperador encontrou seus cidadãos a esperá-lo. 


Não pareciam um povo vencido, mas sim um povo que aguardava ansiosamente por seu imperador. 

Aquele povo estava cansado dos desmandos e agressões de Licínio e esperavam que ò novo imperador fosse mais condescendente com eles, pois a fama do heroísmo e grandeza de Constantino a todos encantava.

Em seu quarto, andando de um lado a outro, Constância aguardava angustiada pelo irmão. 


Desejava notícias do marido e temia pela sua vida. 

Pressentia que Licínio estivesse vivo, mas sabia que mesmo que isso fosse verdade, não era garantia alguma para o futuro de sua família. 

Estava profundamente abatida. O filho pediu:

- Por favor, mãe, sente-se. Você parece exausta. Assim não terá forças para falar com tio Constantino, quando ele chegar.


Constância sentou-se ao lado de Juliano e de Helena, e segurando as mãos do rapaz, desabafou:


- Tem razão, meu filho. Estou sendo tola. É que sinto que falhei de algum modo. Não deveria ser assim...


O rapaz obtemperou:


- Ora, mãe, o que está dizendo? Não conheço ninguém que tenha tido tanta paciência e perseverança com outra pessoa, como você com meu pai. Mesmo sendo ele um homem tão rude, você jamais desistiu ou mudou sua conduta com ele. Como pode ainda sentir-se em falta, seja da forma que for?


Olhando o filho nos olhos, ela respondeu como se olhasse para o infinito:


- Não sei explicar, meu filho... Mas sinto que falhei... Meu dever era ajudar seu pai a ser, junto de seu tio, o forte pulso do império...


Estranhando muito, o rapaz comentou admirado:
- Mãe, estou surpreso. Você, envolvida em questões políticas...


- Não se trata disso...


Antes que ela pudesse concluir, Marco entrou no quarto e comunicou, gentil:


- Seu irmão a aguarda, senhora.


Com o coração batendo descompassado, ela balbuciou:


- E Licínio...


Abrindo a porta para que ela passasse, Marco limitou-se a dizer:


- Ele está vivo. Constância dirigiu por sobre os ombros olhar quase aliviado para o filho e para a amiga, depois seguiu Marco em silêncio. Assim que Constantino a viu, abriu largo e sincero sorriso, estendendo-lhe os braços:


- Minha irmã, como está? Fiquei deveras preocupado com você. Tocando de leve a cicatriz na cabeça da irmã, ele continuou:


- O que foi que aquele monstro lhe fez?


Ela sorriu com ternura, evitando fitar o irmão, e pediu:


- Não fale assim de Licínio.


- E ainda tem coragem de defendê-lo, Constância?


- Ele fez isso numa hora de desespero extremado...


- Ele vive em desespero extremado. Não consegue conviver com sua própria estupidez. E pare de defendê-lo, minha irmã. Já chega! Tem de parar com isso. Precisa desistir de vez desse homem que só lhe fez mal.


Ajoelhando-se aos pés do irmão, ela implorou:


- Não lhe faça mal, por favor, meu irmão...


Erguendo-a com ternura, Constantino comentou enquanto lhe afagava os cabelos:


- Como você se parece com nossa mãe, é impressionante. Seus gestos, seu carinho, sua dedicação... Vocês se parecem muito. Sente-se aqui, venha.


E acomodando a irmã ao seu lado, pediu que lhe servissem comida e bebida. Convidou seus homens de confiança para que se sentassem também.


- Vamos celebrar a fragorosa derrota de Licínio. 


Constância calou-se por longo tempo. Bem mais tarde, quando terminaram o demorado jantar, quando estavam praticamente a sós, Constância pediu de novo:

- Meu irmão, pelo amor que você tem por mim, eu lhe imploro pela vida de Licínio. Deixe que ele viva...


E, envolvida pelas energias de Angélica, que lhe influenciava o pensamento, disse sem que pudesse dar conta de suas palavras:


- Não destrua sua oportunidade de reconstrução... Constantino sentiu forte arrepio a percorrer-lhe o corpo. Olhou sério para a irmã e indagou:


- Do que está falando?


Sem esperar resposta, continuou:


- Não importa. Vou descansar agora e você deve fazer o mesmo. Falaremos sobre isso em outro dia, outra hora.


Constância ia insistir, mas deteve-se percebendo que naquele momento o melhor era silenciar. 


Constantino, por outro lado, pensou muito por quase toda a noite. Tinha ímpetos de enviar soldados para eliminar o seu rival, mas ao mesmo tempo pensava no impacto que causaria sobre o povo. Já era quase dia claro quando finalmente decidiu o que fazer. Ao encontrar-se com a irmã para o desjejum, informou-lhe, solícito:

- Tenho notícias que lhe agradarão muito. Decidi conceder perdão a Licínio. Vou mandar chamá-lo.


Com lágrimas nos olhos, Constância quase não conseguia conter a emoção. Abraçou efusiva o irmão e agradeceu:


- Deus seja louvado! Graças a Deus! Você é mesmo um homem bom e dig-no, Constantino. A verdadeira dignidade de um chefe de estado, a meu ver, está em sua capacidade de clemência. Eu lhe agradeço, meu irmão.


Abraçando-a também, ele comentou:


- Não poderia agir diferente com você, não é mesmo?


Ela sorriu e, limpando as lágrimas de alegria que lhe desciam pela face, perguntou:


- E como vai informá-lo?


- Ainda não sei.


- Posso ir ao encontro dele pessoalmente, assim ele confiará em você.


- Não gostaria de fazê-la expor-se a uma viagem, ainda que curta, depois de tudo pelo que passou...


- Não me será pesado. Vou levar Juliano e Helena comigo.


- Tem certeza?


- Sim, eu quero ir.


- Pois muito bem. Vou designar um grupo de alta confiança para acompanhá-los.


E depois de breve pausa, perguntou:


- Acha que consegue trazê-lo?


- E claro, ele confiará em mim.


- Então, boa sorte.


Abraçando o irmão mais uma vez, ela confirmou:


- Partiremos após o desjejum. Não quero esperar mais.


Sem nada acrescentar, Constantino tomou seu lugar à mesa e se acomodando, em local cuidadosamente escolhido, de onde conseguia ver pela janela as construções da cobiçada cidade que acabara de conquistar.

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