Capítulo 8 - Não Tardou
Não tardou e dezenas de pequenas embarcações atracaram. O de-sembarque foi rápido e ágil. Assim que a maioria de seus homens alcançou terra firme, Constantino subiu depressa em seu cavalo e tomou a dianteira dos soldados. Andou um pouco e logo avistou o exército de Licínio. Intensa bata-lha se seguiu. Embora quase 25 mil homens tenham sido dizimados naquela tarde, Constantino não se sentia satisfeito. Caminhou, sem sucesso, entre os corpos estendidos à procura do rival. Depois se aproximou dos homens derrotados e perguntou irritado:
- Onde está seu vencido imperador? Por que não o encontro em parte alguma? Fugiu novamente, aquele covarde?
Os soldados de Licínio mantinham-se de cabeça baixa, temerosos. Constantino insistia, erguendo mais e mais a voz:
- Todos ficarão a noite inteira sem água ou comida, e amanhã também, e assim sucessivamente, até que me digam onde está o covarde!
Um dos soldados ergueu levemente o rosto e, sem olhar diretamente para Constantino, balbuciou quase num murmúrio:
- Ele fugiu para a Nicomédia.
Constantino virou-se e olhou para a direção de onde vinha a voz, quase em enxergar o homem.
Aproximou-se, agachou-se e, segurando-lhe o queixo, ordenou:
- Fale sem medo, homem! Não lhe farei mal. Não um mal maior do que o seu general lhes fez! Não tenha piedade de alguém que não se preocupa com seus próprios soldados!
Ainda temeroso, o homem prosseguiu:
- Ele fugiu assim que viu seus barcos se aproximarem; antes mesmo que seu exército tocasse o solo, fugiu para a Nicomédia.
Erguendo-se satisfeito, Constantino ordenou:
- Água e comida a todos os prisioneiros. Cuidem dos feridos e coloquem-nos nos barcos. Vamos voltar imediatamente a Bizâncio.
E silenciando por alguns instantes, balbuciou por fim, como se pensasse alto:
- Deixem esse covarde comigo...
Quando adentrou os pesados portões de Bizâncio, o imperador encontrou seus cidadãos a esperá-lo.
Não pareciam um povo vencido, mas sim um povo que aguardava ansiosamente por seu imperador.
Aquele povo estava cansado dos desmandos e agressões de Licínio e esperavam que ò novo imperador fosse mais condescendente com eles, pois a fama do heroísmo e grandeza de Constantino a todos encantava.
Em seu quarto, andando de um lado a outro, Constância aguardava angustiada pelo irmão.
Desejava notícias do marido e temia pela sua vida.
Pressentia que Licínio estivesse vivo, mas sabia que mesmo que isso fosse verdade, não era garantia alguma para o futuro de sua família.
Estava profundamente abatida. O filho pediu:
- Por favor, mãe, sente-se. Você parece exausta. Assim não terá forças para falar com tio Constantino, quando ele chegar.
Constância sentou-se ao lado de Juliano e de Helena, e segurando as mãos do rapaz, desabafou:
- Tem razão, meu filho. Estou sendo tola. É que sinto que falhei de algum modo. Não deveria ser assim...
O rapaz obtemperou:
- Ora, mãe, o que está dizendo? Não conheço ninguém que tenha tido tanta paciência e perseverança com outra pessoa, como você com meu pai. Mesmo sendo ele um homem tão rude, você jamais desistiu ou mudou sua conduta com ele. Como pode ainda sentir-se em falta, seja da forma que for?
Olhando o filho nos olhos, ela respondeu como se olhasse para o infinito:
- Não sei explicar, meu filho... Mas sinto que falhei... Meu dever era ajudar seu pai a ser, junto de seu tio, o forte pulso do império...
Estranhando muito, o rapaz comentou admirado:
- Mãe, estou surpreso. Você, envolvida em questões políticas...
- Não se trata disso...
Antes que ela pudesse concluir, Marco entrou no quarto e comunicou, gentil:
- Seu irmão a aguarda, senhora.
Com o coração batendo descompassado, ela balbuciou:
- E Licínio...
Abrindo a porta para que ela passasse, Marco limitou-se a dizer:
- Ele está vivo. Constância dirigiu por sobre os ombros olhar quase aliviado para o filho e para a amiga, depois seguiu Marco em silêncio. Assim que Constantino a viu, abriu largo e sincero sorriso, estendendo-lhe os braços:
- Minha irmã, como está? Fiquei deveras preocupado com você. Tocando de leve a cicatriz na cabeça da irmã, ele continuou:
- O que foi que aquele monstro lhe fez?
Ela sorriu com ternura, evitando fitar o irmão, e pediu:
- Não fale assim de Licínio.
- E ainda tem coragem de defendê-lo, Constância?
- Ele fez isso numa hora de desespero extremado...
- Ele vive em desespero extremado. Não consegue conviver com sua própria estupidez. E pare de defendê-lo, minha irmã. Já chega! Tem de parar com isso. Precisa desistir de vez desse homem que só lhe fez mal.
Ajoelhando-se aos pés do irmão, ela implorou:
- Não lhe faça mal, por favor, meu irmão...
Erguendo-a com ternura, Constantino comentou enquanto lhe afagava os cabelos:
- Como você se parece com nossa mãe, é impressionante. Seus gestos, seu carinho, sua dedicação... Vocês se parecem muito. Sente-se aqui, venha.
E acomodando a irmã ao seu lado, pediu que lhe servissem comida e bebida. Convidou seus homens de confiança para que se sentassem também.
- Vamos celebrar a fragorosa derrota de Licínio.
Constância calou-se por longo tempo. Bem mais tarde, quando terminaram o demorado jantar, quando estavam praticamente a sós, Constância pediu de novo:
- Meu irmão, pelo amor que você tem por mim, eu lhe imploro pela vida de Licínio. Deixe que ele viva...
E, envolvida pelas energias de Angélica, que lhe influenciava o pensamento, disse sem que pudesse dar conta de suas palavras:
- Não destrua sua oportunidade de reconstrução... Constantino sentiu forte arrepio a percorrer-lhe o corpo. Olhou sério para a irmã e indagou:
- Do que está falando?
Sem esperar resposta, continuou:
- Não importa. Vou descansar agora e você deve fazer o mesmo. Falaremos sobre isso em outro dia, outra hora.
Constância ia insistir, mas deteve-se percebendo que naquele momento o melhor era silenciar.
Constantino, por outro lado, pensou muito por quase toda a noite. Tinha ímpetos de enviar soldados para eliminar o seu rival, mas ao mesmo tempo pensava no impacto que causaria sobre o povo. Já era quase dia claro quando finalmente decidiu o que fazer. Ao encontrar-se com a irmã para o desjejum, informou-lhe, solícito:
- Tenho notícias que lhe agradarão muito. Decidi conceder perdão a Licínio. Vou mandar chamá-lo.
Com lágrimas nos olhos, Constância quase não conseguia conter a emoção. Abraçou efusiva o irmão e agradeceu:
- Deus seja louvado! Graças a Deus! Você é mesmo um homem bom e dig-no, Constantino. A verdadeira dignidade de um chefe de estado, a meu ver, está em sua capacidade de clemência. Eu lhe agradeço, meu irmão.
Abraçando-a também, ele comentou:
- Não poderia agir diferente com você, não é mesmo?
Ela sorriu e, limpando as lágrimas de alegria que lhe desciam pela face, perguntou:
- E como vai informá-lo?
- Ainda não sei.
- Posso ir ao encontro dele pessoalmente, assim ele confiará em você.
- Não gostaria de fazê-la expor-se a uma viagem, ainda que curta, depois de tudo pelo que passou...
- Não me será pesado. Vou levar Juliano e Helena comigo.
- Tem certeza?
- Sim, eu quero ir.
- Pois muito bem. Vou designar um grupo de alta confiança para acompanhá-los.
E depois de breve pausa, perguntou:
- Acha que consegue trazê-lo?
- E claro, ele confiará em mim.
- Então, boa sorte.
Abraçando o irmão mais uma vez, ela confirmou:
- Partiremos após o desjejum. Não quero esperar mais.
Sem nada acrescentar, Constantino tomou seu lugar à mesa e se acomodando, em local cuidadosamente escolhido, de onde conseguia ver pela janela as construções da cobiçada cidade que acabara de conquistar.
segunda-feira, 18 de setembro de 2017
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