tag:blogger.com,1999:blog-35311317342906157872024-03-13T03:18:21.386-07:00Jornada Dos Anjos 🌹 LuciusUnknownnoreply@blogger.comBlogger69125tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-64065865786509127182017-09-18T16:11:00.002-07:002017-09-18T16:15:24.487-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Introdução - O Mar Estava Agitado</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">O mar estava agitado. A pequena embarcação se afastava com dificuldade, buscando alcançar o navio que esperava para partir. Com as vestes ensopadas e água até a cintura, João<span style="font-size: small;">1</span> e os outros Cristãos tentavam atingir a praia, mas eram jogados, pelas fortes ondas da arrebentação, exatamente onde acabavam de ser deixados. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Cefas - uma senhora Cristã, exilada junto com os demais do grupo - caiu e, na tentativa de se levantar, chorava desesperada:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que será de nós agora? Como sairemos deste lugar? Vamos morrer aqui!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Paciente e amoroso, João procurava acalmá-la:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenha fé, minha irmã, Deus nunca nos desampara. Ele sempre cuida de todos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E enquanto a ajudava a se erguer, prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não desanime. Por mais difícil que seja nossa situação, vamos confiar no Mestre.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um pouco mais confortada, a mulher assentiu com a cabeça e enxugou as lágrimas misturadas à água do mar. Explicou a razão de sua angústia:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não temo por mim, apóstolo João, e sim por meus filhos, que ficaram em Efeso. E por eles que me angustio. Estou pronta a dar a vida pelo Senhor, se ele assim o desejar, mas e meus filhos?</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Como é difícil para uma mãe ver os filhos ameaçados...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu posso imaginar, Cefas, posso mesmo. No entanto, Jesus está no comando de nossas vidas, não está?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Cefas o olhava calada e, ao chegarem finalmente à praia, exaustos, ele aconselhou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agora descanse. Precisamos recuperar as forças.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Aqueles eram mais alguns dos muitos Cristãos exilados por ordem do imperador romano Domiciano. Os componentes do pequeno grupo estenderam-se na areia quente e fina, enquanto tentavam recompor as forças e os corações, abalados pela longa e difícil jornada.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Não obstante a solicitude com que atendia e se preocupava com todos, João parecia cansado. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Olhou ao redor, notando a beleza do cenário: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Patmos era uma ilha esplendorosa, localizada no leste do mar Egeu. Acostumado aos encantadores cenários já vistos quando saía para a pesca, e depois pelas viagens que empreendera para difundir o Evangelho de Jesus, ele estava embevecido diante da pequena ilha grega. Já ouvira muitos falarem daquele lindo lugar, porém nunca estivera ali antes. Acomodou-se ao lado dos demais e ficou a contemplar a bela paisagem. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">A brisa perfumada soprava suavemente. O sol se punha devagar, deixando no horizonte um rastro de tons avermelhados e intensos. A vegetação da ilha parecia acalentar o entardecer e recebê-lo com todo o prazer, pois o aroma exalado pelas plantas era doce e agradável.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Não demoraria a anoitecer. Ebenezer tocou o ombro de João e sugeriu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não seria melhor procurarmos abrigo para passarmos a noite? Será que conseguiremos encontrar ainda hoje outros cristãos, também presos na ilha?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não tenho a menor idéia de onde possam estar...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A ilha é pequena, João, e não creio que estejam muito longe da praia. Seria melhor que nos colocássemos logo a caminho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao observar o olhar de João, que focalizava o grupo, Ebenezer aconselhou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Embora estejamos todos cansados, não podemos passar a noite aqui. Temos de procurar abrigo.<br />João sorriu ao admitir:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seu bom senso é inegável.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E dirigindo-se ao grupo, pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, irmãos, precisamos de um abrigo. Sei que estão todos esgotados, mas não podemos demorar mais.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Também parece cansado, apóstolo. João abriu sincero sorriso e respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E estou mesmo! A idade chegou de vez para mim, minha irmã...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Entregando-se a enorme esforço, puseram-se a caminho, em busca de outros que já estivessem na ilha. Caminharam cerca de meia hora e avistaram algumas casinhas improvisadas, feitas de madeira e cobertas com vegetação. Antes que alcançassem o minúsculo vilarejo, alguns moradores correram ao encontro do grupo. Um dos homens perguntou, ainda a distância:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- São cristãos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Foi João quem respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Somos, viemos de Éfeso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um dos que vinham mais atrás gritou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- João! Apóstolo João? É você mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Quando reconheceu o companheiro de longos anos, com quem fizera muitas viagens tendo por objetivo disseminar o Evangelho, João exultou:<br />- Ananias, é você?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao se encontrarem, trocaram apertado e carinhoso abraço. Emocionado, o mais jovem disse, enxugando as lágrimas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não pouparam nem a você, João!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ora essa, e por que poupariam? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Já está com idade avançada! Eles deveriam levar isso em conta. Além do mais, você só faz o bem a todos...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />João sorriu e fitou o outro nos olhos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você esquece que não pouparam o melhor de nós todos, Ananias? Aquele que só fez o bem em toda a sua vida? Quem pode exigir ser tolerado ou aceito depois do tratamento que teve o Mestre dos Mestres? Não, não podemos nos iludir jamais. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Nossa luta é difícil. Jesus já nos ensinou que o caminho para aqueles que desejam segui-lo é estreito.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fez-se longo silêncio, e Ananias convidou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos à minha casa. Mesmo pequena e improvisada, todos nos arranjaremos por lá.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de conversarem muito e trocarem informações sobre o dia-a-dia na ilha e o que acontecia no continente, com notícias de amigos e parentes de muitos daqueles que ali estavam há mais tempo, Raquel, a irmã de Ananias, aproximou-se e sugeriu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Devem estar com fome. Vou servir o jantar. Embora bastante frugal, vai alimentar a todos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois da leve refeição, sentaram-se à volta de João e alguns pediram:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- João, conte-nos uma história sobre Jesus. Temos ouvido muitas, mas sei que você deve saber de outras que ainda não conhecemos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O rosto de João iluminou-se, refletindo suave luminosidade que imediatamente envolveu a todos. O cansaço que sentia desapareceu, ele ajeitou-se no assento que ocupava e disse sorrindo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E sempre uma grande alegria poder relembrar as experiências preciosas que tivemos ao lado de Jesus de Nazaré.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E pôs-se a narrar episódios que vivenciara como discípulo de Jesus. Ficaram acordados até muito tarde, relembrando as doces experiências.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />No plano espiritual, em torno do pequeno agrupamento, brilhava intensa luz. Se os olhos materiais o permitissem, eles se surpreenderiam ao observar a numerosa companhia espiritual com que contavam naquela noite. Um grupo bem maior de espíritos envolvia aqueles que se reuniam na Terra, e com eles apreciava as histórias sobre o enviado de Deus. Entre seus integrantes estava Ernesto, outrora exilado de Capela. Só muito mais tarde, João disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Bem, agora gostaria de descansar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ananias concordou com a cabeça e o ajudou a se levantar, enquanto dizia:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ficaria aqui a noite toda ouvindo você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao colocar-se de pé, João bateu levemente nos ombros do mais novo e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Teremos muitas ocasiões para conversar, não é mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acha que ainda ficaremos muito por aqui? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Quem sabe? De toda forma, vamos aproveitar bem nosso tempo. Tenho uma porção de histórias sobre Jesus para compartilhar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de acomodar a todos, distribuindo-os pelos espaços disponíveis nas pequenas casas, Ananias voltou, sentou-se e, sorvendo um copo de água fresca, em um suspiro desabafou com Raquel:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei se fico triste ou feliz com a chegada de João. A irmã afirmou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quanto a mim, estou aliviada por tê-lo conosco. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Já estava começando a perder as esperanças...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />No dia seguinte, mal os primeiros raios de sol surgiram no horizonte, João já se levantara e, silencioso, saíra da pequena cabana que os abrigava. Caminhou devagar em direção ao mar e em algum tempo avistou a praia. Admirou a beleza do alvorecer, com os raios cada vez mais fortes do astro-rei rasgando o céu até dominar o espaço. O dia amanhecia belo e cheio de energia. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">João olhou ao redor e notou uma pedra bem desenhada que poderia servir de banco. Sentou-se, ainda contemplando o mar e o céu. Depois, indagou em pensamento:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deus, meu Pai, Mestre Jesus, o que desejam de mim? Estou aqui, isolado de tudo e de todos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Como prosseguir com a tarefa de levar o Evangelho ao povo, de difundir seus ensinamentos, se permitiram que para cá eu viesse? É chegado o momento da minha passagem para o mundo espiritual?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ernesto, espírito que fora seu pai em existência longínqua, em Capela, afagou-lhe os cabelos e sussurrou-lhe ao ouvido: "Não, querido Henrique, não é o momento da sua transição. Serene seu coração e espere tranqüilo. Ainda tem muito trabalho a fazer. Contamos com você, com sua força física e sua fé em Jesus".</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Registrando no coração aquelas palavras, João sorriu e falou baixinho:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Estou aqui, Senhor, pronto para fazer tudo o que de mim desejar. Sou seu servo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele se calou. Mais uma vez Ernesto afagou-lhe os cabelos e beijou-lhe a fronte envelhecida. Aquela altura João já somava 85 anos de vida, e ainda mantinha vigor físico que impressionava a todos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O apóstolo continuou a meditar e orar por mais algum tempo. Foi interrompido pela voz amiga de Ananias:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sabia que o encontraria aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />João sorriu para o companheiro, que logo se acomodou ao seu lado e comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É lindo ver o nascer do sol deste local. Muitas vezes tenho vindo para apreciar a beleza e orar... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- É um lugar ideal para a prece. O silêncio ainda domina a paisagem e tudo vai despertando aos poucos, à medida que oramos. E como se nos integrássemos a toda a natureza, louvando a Deus pelo dom da vida.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ananias ficou calado. Lágrimas brotaram em seus olhos e lhe desceram pela face. Limpou o rosto, porém elas teimavam em cair. João tocou-lhe o ombro fraternalmente e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que foi, Ananias? O que o entristece tanto, meu irmão?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu não entendo bem o que acontece, João. Por que estamos aqui, separados de nossos parentes e amigos? Estamos tentando fazer o bem, conforme Jesus nos ensinou, e somente isso. Não infringimos nenhuma lei, e tantos Cristãos já foram sacrificados, tantos... Por que isso está ocorrendo, João? Você compreende?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meu caro Ananias, não se deixe abater. A tristeza pode vir, é normal, mas não permitamos que ela tome conta de nós. Lutemos contra a tentação do abatimento e do sentimento negativo de derrota. Lembre-se de que somos mais do que vencedores por aquele que nos amou até a morte.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de breve silêncio, Ananias continuou, enxugando as lágrimas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu sei, João, e por isso me entristeço. Não consigo ter fé igual à que vejo em você e em tantos outros cristãos. Apesar de amar o Mestre e confiar nele, às vezes fico realmente cansado de lutar tanto. Por que tudo isso acontece?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- As resistências e oposições que levaram Jesus ao madeiro são as mesmas que nos perseguem e querem nos calar. Assim como acham que emudeceram Jesus, matando-o, pretendem matar a todos nós, para silenciar a própria consciência que lhes desperta sutilmente na alma. Não querem enxergar, pois isso os obrigaria a mudar, a abrir mão de seus interesses, de seu orgulho, das ilusões sobre si mesmos e sobre o mundo que acalentam no íntimo. Jesus os incomodou, Ananias, e nós, igualmente, muito os incomodamos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ananias ficou novamente pensativo. João prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Apesar de tudo, veja que eles não conseguem calar os cristãos. Alguns realmente foram sacrificados, mas muitos outros estão abraçando a causa do Evangelho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E dá para crer que logo seremos aceitos e finalmente poderemos viver nossas vidas, tentando aplicar e ensinar o que Jesus nos deixou? Isso só fará bem às pessoas... Como é possível que não percebam?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Dessa vez foi João que nada disse. Ananias suspirou fundo, em curto intervalo, e confessou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou cansado, João. Foi muito doloroso para mim perder entes queridos da minha família. Você sabe, meu pai e meus irmãos foram mortos por ordem de Domiciano. Minha mulher e meus filhos estão em Efeso, escondidos na casa de amigos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não consigo perdoar totalmente, conforme Jesus nos ensinou. Sinto muita dor no coração, muita saudade...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ananias, você sabe que seu pai e seus irmãos não morreram! Estão vivos e a serviço de Jesus, em outra dimensão da vida. Eles estão bem, muito bem!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Subitamente, João parou de falar, fechou os olhos por um instante e em seguida os abriu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E estão aqui agora - disse. Ananias arregalou os olhos e perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Aqui, conosco? Eles estão aqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim. Seu pai pede que você se tranquilize, pois Ester e as crianças passam bem. Estão seguras e bem protegidas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ananias, tocado pela energia de amor que emanava do pai e dos irmãos desencarnados, vertia copioso pranto. João prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seu pai o envolve em terno abraço, Ananias, e lhe diz que eles partiram porque a hora havia chegado; já tinham cumprido a tarefa que lhes cabia na encarnação. Agora precisam dar seqüência ao trabalho, no plano espiritual, e contam com sua ajuda para realizá-lo. Eles têm permanecido muitas vezes ao seu lado, intuindo-o e orientando-o quanto à forma de colaborar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Limpando as lágrimas, ele disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Gostaria de poder abraçá-los também. Eu os amo tanto...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles sabem, sentem o seu carinho. Todavia, você os ajudará muito mais confiando na Providência e sabendo que continuam por perto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ananias calou-se, tomado pela emoção. Aos poucos se acalmou e, depois de prolongado silêncio, afirmou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou melhor, e só posso agradecer-lhe por me proporcionar tamanha alegria.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem dizer nada, João abraçou carinhosamente o amigo. Então, Ananias convidou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não seria melhor irmos? Você precisa se alimentar. Comeu algo antes de sair?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não. Gosto de orar pela manhã, antes de me alimentar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Só que agora deve comer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vá indo, Ananias. Eu sigo logo atrás.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, João.Vamos, terá tempo de sobra para voltar aqui quantas vezes quiser; está na hora de cuidar bem de seu corpo, ainda vai precisar muito dele...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />João ergueu-se e concordou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem razão; Ananias; vamos indo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Enquanto caminhavam em silêncio pela trilha que levava da praia até a cabana, João imaginava quantos cristãos deveriam estar sentindo angústia idêntica à que vira em Ananias. Por certo havia os que compreendiam o sentido do sofrimento que lhes era imposto, ao passo que muitos provavelmente se questionavam sobre os motivos de tanta resistência, de tamanha oposição enfrentada. À medida que pensava, uma idéia lhe surgia, clara e nítida, no fundo da mente: escrever aos Cristãos, esclarecendo e comentando a vitória do Cristianismo no mundo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Em pensamento indagou: "Quando começaremos?". E a resposta lhe soou na mente: "Em breve".</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Quase um ano se passou. Outros grupos de cristãos chegaram à ilha, contando os horrores que muitos estavam enfrentando por causa dos governadores romanos. Por toda a parte era árdua a luta dos cristãos. Certa noite, depois de ouvir alguns deles narrarem o que se passava em diversos pontos da Palestina e de outras regiões, João se recolheu com o coração dolorido. Sabia que o combate seria duro, mas sempre que constatava a aridez do coração humano, e quanto de mal um homem era capaz de fazer ao seu semelhante, ficava triste. Ao acomodar-se na cama, naquela noite, ele não conseguia dormir. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Virava-se de um lado para o outro, na tentativa inútil de conciliar o sono. Sentou-se, e escutou mentalmente, com nitidez uma voz: "Durma, João, aquiete-se e durma. Hoje começará a receber as informações que deverá escrever". Ainda sentado, ia questionar, quando a voz pediu com suavidade: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">"Deite-se. Logo você dormirá e então verá, diante de seus olhos, o que deverá escrever".</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Acostumado a obedecer às orientações espirituais que recebia, João deitou-se outra vez, procurando pensar apenas no rosto amigo e meigo de Jesus, que trazia na memória com todos os detalhes. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Pouco a pouco a lembrança o acalmou e ele adormeceu. Seu corpo espiritual foi então desprendido do corpo físico e Ernesto, que o aguardava, perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então, Henrique, está pronto para traduzir o que ainda há por vir para os cristãos, as lutas e também as vitórias?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abraçando o querido amigo, João respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou pronto para tentar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, está tudo preparado. Você verá o desenrolar dos fatos futuros lá na colônia, e, ao regressar, começará a traduzir para nossos irmãos encarnados aquilo a que tiver assistido.<br />João calou-se, pensativo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que foi, está preocupado? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Ernesto indagou.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Nunca fui muito bom para escrever, você sabe, não é? Tenho lá minhas dificuldades.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se preocupe. Você terá muita ajuda. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Preparavam-se para partir quando João perguntou, com um sorriso:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem visto Elvira? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Não, desde que ela regressou para Capela, mas sei que está sempre pensando em nós. Sinto seus pensamentos envolvendo minha mente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E como está você, Ernesto?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fortalecendo-me com o seu exemplo. João sorriu e abraçou-o.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Podemos ir agora - falou.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Partiram, Logo alcançaram a colônia, próxima ao orbe da Terra, e lá João pôde visualizar, numa tela imensa, muitos fatos que ao longo do tempo se sucederiam no planeta. Mais tarde, ao retornar, ele pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, Ernesto, precisarei de ajuda para o que devo realizar. Não sei como colocar na linguagem dos meus contemporâneos aquilo que vi hoje.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Voltaremos muitas vezes à colônia. Você poderá rever o que para você for motivo de dúvida e conversaremos sobre cada detalhe. Ajudaremos em tudo que estiver ao nosso alcance. Vai dar certo, não se preocupe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Na manhã seguinte, o sol já ia alto quando João despertou. A cabana estava vazia e ele se sentia atordoado. Sentou-se e meditou um pouco, buscando compreender tudo o que sentia. Então saiu em busca de Ananias e logo encontrou Raquel, que informou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ananias foi pescar. Pediu que ninguém o acordasse e todos tentamos deixar a cabana sem fazer barulho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E conseguiram. Agora, preciso de pergaminhos, pena e tinta. Tenho de escrever.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Imediatamente Raquel correu para a cabana e logo surgiu à porta, avisando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está tudo na mesa. Sobre o que o senhor vai escrever? É alguma orientação para nós?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Para nós e todos os cristãos, Raquel.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Puxa, que notícia boa! Sorrindo, João explicou:<br />- Vou tratar de escrever, antes que o que vi em sonho esmaeça em minha mente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Assim, durante os anos que passou na ilha de Patmos, João ocupou-se em registrar, da melhor forma possível, tudo o que observava no plano espiritual, com relação ao futuro da Terra e dos homens. Embora desejasse ardentemente transmitir mensagens de otimismo e esperança, constatava, dia a dia, que o porvir da humanidade seria marcado por uma longa trajetória de dor, lutas e muito sofrimento, até que o raiar de nova era libertasse, finalmente, a consciência humana.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Naquele cenário de rara beleza, João escreveu as páginas que seriam conhecidas pelas futuras gerações como o Livro do Apocalipse, retratando uma das fases de transformação da Terra, em seu processo evolutivo. </span><br />
<br />
<span style="font-size: small;">1 João foi um dos doze apóstolos de Jesus. </span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-64012215384891032562017-09-18T15:50:00.003-07:002017-09-18T15:50:44.829-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 1 - Roma</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<span style="font-size: x-large;"><br /></span>
<span style="font-size: x-large;">Roma, ano 324 da era Cristã. No salão de audiências ouviam-se os gritos do poderoso general:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Saia já da minha frente, verme inútil!</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Desapareça, suma, ou não sei o que faço com você!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio<span style="font-size: small;">2</span>, agressivo, empurrou o mensageiro que se mantinha curvado diante dele, fazendo-o cair nos degraus da escadaria próxima. O jovem logo se ergueu e, aterrorizado, saiu rapidamente da sala. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Sabia do que aquele velho general era capaz.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância entrou a tempo de presenciar a cena e, verificando a enorme irritação do marido, indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que maltrata tanto o pobre rapaz? Ele trouxe más notícias? O experiente general do império endereçou olhar furioso à esposa e limitou-se a dizer:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E seu irmão outra vez.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Aproximando-se do marido e buscando aparentar calma, Constância insistiu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E o que foi agora?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei muito bem o que ele planeja, suas intenções...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que houve?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Medindo a mulher de alto a baixo, o general disse, enquanto saía apressado do amplo salão:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não vai vencer, escreva o que digo... Por Zeus! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ele não vai vencer!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância fez Licínio estacar na porta ao argumentar:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Constantino é determinado e ardiloso. Consegue tudo aquilo que deseja.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele virou-se para ela e esbravejou, ainda mais contrariado, deixando perceber todo o seu furor contra o opositor:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem conseguido ampliar o território sob seu poder à custa de muito ouro e muitas vidas romanas. Sabe seduzir os generais com seus argumentos e pontos de vista, mas não é perfeito.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Pelos deuses! Quem ele pensa que é? Quer dominar todo o império. Quer tornar-se o único César, poderoso e absoluto!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância afirmou, hesitante:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Provavelmente sim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois ele não conseguirá! Vou impedi-lo, custe o que custar! A mulher segurou o braço do marido e advertiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seja cauteloso. Com Constantino, todo o cuidado é pouco. Por favor, veja lá o que planeja. Além do mais, é meu irmão, e não quero que nada lhe aconteça. - Não se iluda, Constância. Ele jamais teria qualquer piedade de você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A esposa argumentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está enganado. Constantino é um homem determinado, ambicioso e astuto, mas é justo. Não faria nada que me prejudicasse, a menos que eu o prejudicasse primeiro. Portanto, pense muito bem antes de agir contra ele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem responder, o velho general desapareceu pelo corredor, deixando a esposa a meditar. Respeitava o marido e admirava o irmão; queria bem aos dois, mas temia pelas atitudes sempre intempestivas de Licínio. Sentou-se e, observando pela janela a movimentação dos soldados sob as ordens do marido, ficou a se perguntar o que exatamente estaria acontecendo. Licínio se irritava muito com as atitudes de Constantino; embora antes fossem muito próximos (até mesmo o seu casamento havia sido negociado com o irmão, para estreitar os laços entre eles), agora estavam a ponto de um confronto direto. Depois de muitas lutas e combates, mentiras e traições, assassinatos e disputas cruéis, que não poupavam ninguém e nem mesmo laços familiares dos mais próximos, Constantino havia conquistado toda a região ocidental do império, tornando-se o imperador do Ocidente, e Licínio era então o Augusto do Oriente. Ambos dividiam o poder do imenso território sob a égide da águia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O olhar de Constância, que parecia perdido, encheu-se de temor. Ela continuava a refletir que haviam sobrado apenas os dois e que seu irmão não dividiria o poder. Pressentia que eles iriam entrar em confronto direto, e não demoraria muito. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tirando de sob as roupas, junto ao peito, uma pequena cruz de madeira que trazia pendurada em uma corda fina feita de couro, apertou-a com uma das mãos e pediu, baixinho:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ajude-me, Jesus, por favor. Proteja Constantino e também Licínio. Não deixe que minha família seja dizimada por essas disputas estúpidas de poder! Por favor, Nazareno, olhe por mim...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ainda segurava firme a pequena cruz quando sua serva pessoal entrou, ofegante:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha senhora, precisa vir depressa!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Calma, Ana. O que foi?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Venha, senhora, rápido! Uma desgraça está prestes a acontecer! A senhora precisa impedir!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância acompanhou Ana pelos corredores do palácio até chegar à porta do gabinete do marido que, aberta, permitia que o escutasse a gritar pela sacada do amplo salão, diretamente aos soldados. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Enfurecido e enlouquecido, ele gritava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meus leais servidores, moradores da bela e poderosa Bizâncio, obedeçam às minhas ordens. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quero que todos os funcionários cristãos deixem seus postos e partam imediatamente. Que não fique um só em meu reino. Todos fora! São traidores, perigosos, eu os quero longe daqui. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Todos servem a Constantino!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância aproximou-se do marido e, segurando-o pelo braço, implorou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acalme-se, por favor! O que está fazendo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele arremessou-a para longe com toda a violência, fazendo-a cair sobre um banco e depois sobre uma mesa mais adiante. A serva ia entrar para socorrer sua senhora, que continuava no chão, ferida, quando Licínio, olhando-a com fúria, gritou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não ouse entrar em meu gabinete, cristã imunda! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Suma daqui! A ordem é para você também! Suma da minha frente ou acabo com você com minhas próprias mãos! Já! Desapareça!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Em seguida ele voltou para a sacada, e continuou a gritar aos subordinados:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Até o final do dia quero todos os cristãos bem longe daqui. Todos eles, sejam romanos ou não! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não quero um remanescente! Aqueles que não concordarem com minhas ordens, podem partir também. Quero limpar meu reino dessa praga e vai ser hoje mesmo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância permanecia no chão, desacordada e ferida na cabeça. Total-mente cego pelo ódio que sentia por Constantino e por seus freqüentes avanços militares, Licínio escrevia uma ordem expressa para que, em todas as cidades de seu reino, os cristãos fossem banidos imediatamente de qualquer cargo ou função que tivessem em qualquer área relevante. Que se tornassem todos es-cravos! Assim que terminou, saiu da sala com o pergaminho nas mãos e sumiu no corredor, diretamente para o grêmio onde ficavam os seus soldados mais graduados. Levava pessoalmente a ordem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ana, que se afastara aturdida, buscou ajuda de outra serva de confiança de Constância, que mantinha em segredo sua opção pelo Cristianismo, e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Helena, precisa ajudar a senhora! Ela está ferida.<br />- O que houve?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já escutou a ordem do imperador Licínio?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, já correu por todo o palácio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A nossa senhora tentou intervir e ele a empurrou...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ana começou a chorar angustiada. Helena trouxe-lhe um pouco de água e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fale, o que houve?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu acho que a matou...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não é possível! Ele não seria capaz... - Acho que foi sem querer. Ele estava com muita raiva, jogou-a com força e ela caiu e bateu a cabeça na mesa... Vi que sangrava... Se não está morta, acho que está morrendo...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Pálida, Helena ergueu-se dizendo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Precisamos ajudá-la!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu não posso. O imperador me impediu de entrar em seu gabinete e me quer fora do palácio. Se me encontrar de novo por aí, é capaz de me matar...</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Precisava ver como ele estava... Parecia fora de si, enlouquecido... Você precisa ajudá-la... Eu não posso fazer nada!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Helena pensou por um instante e, virando-se para Ana, pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vá então, Ana, vá antes que ele a encontre. Mas primeiro peça a Juliano para vir até aqui; diga que a mãe está ferida, não fale de suas suspeitas mais graves.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Olhando para o céu, disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho esperança de que ela esteja apenas ferida.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Agora vá. Procure por Juliano e diga que me encontre no gabinete de Licínio. Vamos socorrer Constância.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes de sair, ao alcançar a porta, Ana se voltou e disse, em lágrimas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tome cuidado, Helena. Ele está fora de si...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ana saiu depressa e Helena correu pelos corredores, encontrando amigos e parentes que, com alguns pertences nas mãos, fugiam assustados. Ela seguiu até atingir a parte mais alta do edifício, onde ficava o amplo salão de Licínio. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Observou que estava vazio e correu até Constância. Havia sangue espalhado sob sua cabeça e Helena constatou que o ferimento era grave. Debruçou-se sobre o peito da outra e escutou-lhe o coração. Ainda batia. Logo, Juliano entrou, à procura das duas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele estava lívido, com as mãos trêmulas e suando frio. Olhou para a mãe e depois para Helena e perguntou, assustado: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">-Ela... está...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ela está viva, mas precisamos tirá-la logo daqui e tratá-la. Se perder mais sangue, não sei o que poderá acontecer...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É claro! Mas o que foi que deu no meu pai dessa vez?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei, Juliano. Acho melhor você se preocupar com isso depois. Agora precisamos socorrer sua mãe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Claro...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Helena rasgou parte de suas vestes e cobriu o ferimento, procurando estancar o sangramento. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Assim que o curativo improvisado ficou pronto, Juliano carregou a mãe para seu quarto e colocou-a na cama.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E agora, o que faremos? Helena não titubeou: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Vou procurar ajuda. Fique aqui com ela e não deixe ninguém se aproximar antes que eu chegue, está bem?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O rapaz balançou a cabeça afirmativamente.</span><br />
<br />
2 Valério Liciniano Licínio, coimperador romano no período de 308 a 324 d.C.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-597786105278914752017-09-18T15:37:00.002-07:002017-09-18T15:37:29.419-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 2 - Juliano Sentou-se</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Juliano sentou-se à beira da cama e afagou com ternura o rosto da mãe. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Seu coração batia descompassado; suas mãos suavam frio e de seus olhos desciam pesadas lágrimas que corriam pela face alva, alcançando, vez por outra, as mãos de Constância. Esta, imóvel, empalidecia mais e mais, e agora já tinha os lábios arroxeados. O rapaz olhava para a porta a todo instante, ansioso para que alguém aparecesse em socorro da mãe. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ele a beijou na face e sussurrou, angustiado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, mamãe, agüente! Helena foi buscar ajuda. Não morra, por favor...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Escutou a voz forte e irritada do pai:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que está fazendo aqui? Onde está sua mãe? Juliano ergueu-se indignado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não está vendo que ela está aqui, prestes a morrer por sua causa?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sustentando o olhar arrogante, Licínio, incrédulo, acercou-se da ampla cama que acomodava a esposa. Fitando-a, exclamou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não tive a intenção de machucá-la, mas ela insistia em interferir em minhas ordens!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sente nada por ela, mesmo, não é?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E quem você pensa que é para questionar meus sentimentos, rapaz? Ainda não sabe nada da vida, das dificuldades e desafios que o mundo nos impõe. Não tem o direito de julgar-me ou discutir meus atos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você machucou a minha mãe, tratou-a com violência, e é só isso que me diz? Vem ainda me censurar...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Juliano interrompeu-se, em pranto. Licínio aproximou-se mais da mulher, auscultou-lhe o coração, ergueu-lhe a cabeça e observou o curativo e o ferimento. Depois, recolocando-a com cuidado na cama, ergueu-se e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A mim você não puxou, definitivamente. Parece uma mulherzinha choramingando. Vou buscar alguém que a possa ajudar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem esperar pela resposta do rapaz, Licínio saiu decidido. Antes de deixar o cômodo, no entanto, virando-se para o rapaz, disse: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Mandarei um dos sacerdotes vir vê-la. Depois partirei com meus melhores homens para terminar o que comecei. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quero expulsar definitivamente todos os funcionários cristãos que trabalham em áreas administrativas do meu reino.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que tanto ódio, meu pai?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você pensa que sabe alguma coisa sobre esses cristãos, mas não sabe. Eles são como uma praga que se espalha por toda parte e se infiltra em todas as áreas do império. Um sem-número de aristocratas da mais alta casta romana está se juntando a esses seguidores de um mestre nazareno que faz milagres e promete vida eterna... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Vida eterna... Promete o paraíso...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu realmente não o compreendo, meu pai. Não foram você e meu tio que fizeram promulgar o Édito de Milão, em que determinam que haja tolerância religiosa no império? Você apoiou tio Constantino e fez valer essa lei. Por que fez isso, se não aprecia os Cristãos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio, de cenho fechado e olhar distante, considerou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eram outros tempos, muito diferentes de agora. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Constantino ainda tinha algum respeito pelos seus colegas militares, e talvez até mesmo pelos desgra-çados Cristãos. Agora, todos não passam de instrumentos de seus interesses, de bonecos em suas mãos... De coisas, entendeu? Coisas que ele usa conforme seus desejos e caprichos. A cada um ele usa e descarta, como fez comigo. Ou você acha que seu tio vai descansar enquanto não me enfrentar?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio parou por um momento, depois bradou, ainda mais enfurecido:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E vou derrotá-lo! Ele não me vencerá!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Juliano baixou a cabeça, limpando as lágrimas, e fitou a mãe com terna tristeza. Licínio sumiu esbravejando pelo corredor. Podia-se escutar sua voz ecoando pelo palácio e desaparecendo aos poucos. Logo que Licínio afastou-se, Helena entrou depressa, trazendo consigo um médico romano, que havia pouco se tornara cristão. Já conhecendo a gravidade do problema de Constân-cia, ele não demorou a fazer-lhe novo e cuidadoso curativo, e em seguida fê-la beber um preparado que ele fizera com muitas ervas, para restituir-lhe a força e ajudar seu próprio corpo na restauração do ferimento. Helena o ajudava, observando-o em silêncio. Juliano se afastara um pouco, pois não suportava ver a mãe naquelas condições. Otávio não havia ainda terminado os seus cuidados, quando Gripínio, o sacerdote mais graduado e responsável pelos serviços aos deuses romanos, entrou no quarto em busca da mulher de Licínio. Juliano adiantou-se e informou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Otávio já cuidou dela.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seu pai ordenou que eu a visse. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Pois ele não está aqui agora. Eu, sim, e digo que ela já recebeu os cuidados de que necessitava. Deixe-nos. Meu pai não sabia que eu já mandara vir ajuda, por isso foi procurá-lo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Engano seu. Ele foi à minha procura porque confia em mim e sabe que farei o que é o melhor para salvar sua mãe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ela já foi socorrida. Agradeço, mas não necessitamos mais de sua ajuda.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois bem, se algo acontecer a ela, será sua responsabilidade!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha?! Ora essa! Meu pai foi quem quase a matou e você vem me dizer que a responsabilidade será minha?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então me deixe vê-la!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Otávio, que terminara o atendimento, interveio:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Consinta que ele a veja, Juliano. Que mal pode haver? O estado dela é muito grave e toda a ajuda é bem-vinda.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O rapaz afastou-se da cama para que Gripínio se aproximasse. Ele a examinou minuciosamente; depois se ajoelhou e fez alguns gestos, pedindo socorro aos deuses. Em seguida, fitou Otávio, que aguardava em silêncio, e disse a Juliano:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ela recebeu cuidados adequados. Agora está nas mãos dos deuses. Vou até o templo preparar um sacrifício especial pela vida dela. Eles haverão de me escutar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Juliano balançou a cabeça sem dizer nada e Gripínio saiu do quarto. Otávio aproximou-se do rapaz e, tocando-lhe o ombro, disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como disse antes, o estado dela é bem delicado. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">O que podemos fazer agora é pedir a Deus por ela.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Será que está sentindo muita dor?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Dessa vez foi Helena quem se aproximou e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Uma das ervas que Otávio lhe deu tem efeito de atenuar a dor. Dirigindo-se ao médico, ela indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não há mais nada que possamos fazer?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Continue dando o chá de hora em hora. Isso vai ajudá-la. Se seu estado piorar, veremos o que podemos fazer. Por enquanto, temos de aguardar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Helena se prontificou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Se você me permitir, Juliano, vou ficar aqui cuidando dela, dia e noite.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Otávio também se ofereceu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho algumas tarefas para terminar, mas depois posso ficar aqui também.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Apertando as mãos de Helena e depois de Otávio, ele concordou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Aceito, por certo. O estado de Constância alternou fases de ligeira melhora e de piora acen-tuada nos dias que se seguiram. Ela permanecia inconsciente. Às vezes sussurrava palavras desconexas, quase incompreensíveis, em outras calava completamente. Juliano, dedicado e amoroso, não saía do lado da mãe. Otávio e Hele-na também se revezavam em cuidados e atenção e a jovem, vez por outra, ajoelhada à beira da cama, orava ao Mestre que há pouco conhecera, rogando pela vida daquela mulher aparentemente frágil, mas cheia de força interior. Muitas vezes, ao terminar suas orações, ia devagar até a cabeceira da cama e sussurrava no ouvido de Constância:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não nos abandone. Por favor, lute!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Algumas semanas depois, a notícia do ocorrido com a irmã chegou aos ouvidos de Constantino<span style="font-size: small;">3</span>. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ele permanecia sentado, ocupando o lugar de maior destaque no centro de seus conselheiros, e ouvia a narrativa sobre as últimas ações de Licínio sem esboçar nenhuma reação. Constantino era um general respeitado pelos seus homens e pelos seus súditos. Conquistara cada pedaço do território romano que ora estava sob seu controle com muita astúcia e arguta estratégia, o que o tornara um conquistador querido e respeitado.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com rosto de forte ossatura, transparecia em seu corpo e sua postura a determinação e a coragem de, destemida e sabiamente, lutar pelas suas aspirações. Constantino parecia incansável e inabalável. Nada tirava dele a calma e a determinação na tomada de decisões e nas ações. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ele raramente reagia e, sim, utilizava toda e qualquer informação ou situação em seu favor. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quando o mensageiro terminou de narrar o que se passava no império do Oriente, ele parecia distante, mas logo perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E como está minha irmã agora?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sabemos exatamente, parece que seu estado é muito grave.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está recebendo os cuidados devidos, ou Licínio a abandonou à própria sorte?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Juliano, seu sobrinho, é quem está tomando conta dela. Constantino calou-se, pensativo. O silêncio era absoluto no salão, quando um soldado surgiu à porta e interrompeu a reunião:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Senhor, um mensageiro da fronteira chegou apressado e deseja falar-lhe. Diz que é extremamente urgente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino não respondeu, apenas inclinou a cabeça afirmativamente. O soldado reproduziu o sinal positivo e saiu apressado. Logo retornou com o mensageiro, que aparentava abatimento e cansaço extremo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Senhor, trago notícias da fronteira. Más notícias, senhor. Constantino disse, atento: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- O que houve?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Os sármatas se preparam para invadir o reino do Ocidente. Já arregimentaram grande número de homens, que não param de chegar. O exército deles está crescendo a cada dia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O imperador guardou silêncio. Seus generais mais leais e seus conselheiros já o conheciam bem e sabiam que seu silêncio era a maior ameaça contra seus inimigos. Todos esperavam pelo que diria Constantino, sem se manifestarem. Ele se levantou, caminhou até um mapa de seu reino e de suas fronteiras, examinou o desenho com atenção, depois virou para o soldado e perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mostre-me onde exatamente se concentram.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O jovem foi até o desenho colocado sobre uma mesa enorme, observou o mapa com atenção, depois apontou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estão aqui, entre as montanhas...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino observou o lugar exato que o jovem apontara, depois sorriu levemente e sugeriu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Descanse e coma um pouco. Parece exausto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agradeço, senhor, mas estou a seu serviço, aguardando suas ordens. Só descansarei depois que o atender, meu senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Tocando-lhe o ombro, Constantino insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Descanse, pois tenho planos para seu regresso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O jovem escutava o imperador com atenção, assim como os demais ouvintes. Constantino aproximou-se do mapa, analisando ainda melhor cada detalhe, depois se virou para o rapaz e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Amanhã quero que parta bem cedo e vá direto ao meu amigo, Augusto do Oriente, Licínio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem compreender, todos aguardavam o esclarecimento de seu líder, que prosseguiu depois de longa e premeditada pausa:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero que Licínio nos permita atravessar seu território para exterminar-mos os sármatas. Quero que ele me autorize a atravessar suas cidades mais lucrativas, para surpreender os sármatas, pelos flancos, certamente por onde não esperam que ataquemos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um de seus generais apenas balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas esse é o caminho mais longo... Constantino comentou, com sorriso irônico:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pode até ser mais longo, mas iremos conquistando tudo o que estiver em nosso caminho. Ao nos defrontarmos com os sármatas, não somente nosso exército será maior, como meu império estará consolidado. Confie em mim, Galenius, sei o que estou fazendo. Erguendo todo o seu corpo e esticando o braço em sinal de profundo respeito, Galenius saudou o seu imperador:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não tenho a menor dúvida disso! Ave César! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Todos em uníssono repetiram:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Ave!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino manteve-se sério e em silêncio. No entanto, um observador atento registraria em seu olhar a enorme satisfação que sentia pela destacada posição que ocupava, pela admiração que recebia de seus subordinados e súditos, bem como pela perspectiva cada vez mais próxima de tornar-se o único imperador de Roma.</span><br />
<br />
3 Constantino I, Constantino Magno ou Constantino, o Grande.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-32071428119735058572017-09-18T15:29:00.001-07:002017-09-18T15:29:21.185-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 3 - A Medida</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">A medida que os generais e conselheiros deixavam a sala em alvoroçada conversa, Constantino acomodou-se em sua cadeira suntuosa, seu trono. Sentou-se e observou seus homens se afastando; apenas os mais próximos ainda permaneceram com ele. Mentalmente, felicitou-se por estar mais uma vez aproveitando tão bem as circunstâncias em seu favor. Claro que não ficara feliz com a notícia de que a irmã estava doente, mas a agressão de Licínio contra ela era desculpa mais do que suficiente para que seus homens o seguissem em sua condição de Augusto ferido no orgulho familiar. Licínio mais uma vez passava por um brutamontes, e deveria ser contido a todo o custo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele acompanhou a movimentação com o olhar, depois fitou Marco e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está comigo no que pretendo fazer?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, sem restrições, senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino levantou-se, tocou-lhe o ombro e comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meu bom Marco, eu sei que posso contar com você. O outro respondeu sem pensar:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E como poderia ser diferente? Licínio quase lhe mata a irmã!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino aproveitou e, ainda que demonstrasse fixar apenas Marcos, estudava de canto de olho as mínimas reações de Helenus e Domenico; consciente da admiração e do respeito que ambos dedicavam aos cristãos, arrematou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele está piorando a cada dia. E esse problema com os cristãos, agora?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Os outros dois permaneciam calados. Marco, Helenus e Domenico eram os três homens de confiança absoluta de Constantino, o que no império romano daquela época era algo quase impossível. Temia-se até a própria sombra. Os três generais que ocupavam a mais alta graduação do exército pretoriano haviam sido transformados em guarda pessoal do imperador do Ocidente e agora acompanhavam-no em tudo, participando de todas as suas decisões. Experientes e astutos, apoiavam Constantino, não sem questionar-lhe, muitas vezes, as ações.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino calou-se, usando o silêncio como tão bem sabia fazer. Voltou a sentar-se e fixou o olhar para fora da janela, distante. Pensava ativamente nas estratégias que usaria para vencer Licínio. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Esperava pelo apoio de seus homens de confiança, pois sabia do tremendo desafio que vencer o imperador do Oriente representaria. Seria uma batalha das mais difíceis, pois o próprio Licínio era igualmente um general experiente e dominador, possuindo um exército muito maior do que o de Constantino, em número de homens.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Finalmente, Helenus e Domenico aproximaram-se de Constantino e, reverenciando-o, afirmaram:<br />- Também estamos com você em sua decisão. Licínio precisa ser detido.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ótimo. Logo mais nos reuniremos para traçar um plano de ataque detalhado. Já tenho algumas idéias e poderemos definir nossa estratégia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Helenus e Domenico se retiraram, enquanto Marco permaneceu ao lado de seu imperador, a quem tanto admirava. Daria a própria vida por ele, tamanha sua admiração. Constantino, confortavelmente instalado em seu trono, pensava em suas estratégias, e, apesar de estar convicto de sua decisão, sentia um desconforto ao imaginar-se confrontando Licínio. Era a sua consciência que buscava espaço para alertá-lo do perigo de suas intenções.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao perceber-lhe o titubear sutil, duas entidades espirituais, trajando pesado manto negro, aproximaram-se dele e sussurraram-lhe aos ouvidos da mente: "Licínio precisa ser detido. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não há nada de errado nisso. Você, e somente você, deve ser o único e absoluto César de Roma. Será muito melhor para o império. Um reino dividido não pode subsistir. Roma precisa de você.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Você, Constantino I, será um imperador que marcará a história de sua época e jamais será esquecido. Um reino dividido não pode subsistir... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Um reino dividido não pode subsistir...".</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Registrando as palavras do espírito ao seu lado, Constantino tomou-as como seus próprios pensamentos e sentiu-se aliviado. Sem dúvida, estava fazendo o correto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Distante dali, Juliano acabara de pousar sobre a mesa uma cumbuca com água fresca que dera à mãe. Olhando pela janela, suspirou profundamente. Com olhar distante, pensava no pai, no tio e em toda a situação do império. Ele desprezava a atitude de Licínio, sua ganância e seu desejo de poder o enojavam - especialmente porque detectava na corte, e naqueles que circundavam seu pai e acompanhavam seus passos de perto, os interesses acima de tudo.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Percebia o ambiente hostil em que passara toda a sua vida, com medo de todos, sempre protegido pela mãe. Aquilo não era a vida que ele imaginava.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não apreciava aquela disputa pelo poder a qualquer preço. Quando acompanhava o pai em alguma viagem perigosa, a mãe sempre o cercava de uma guarda pessoal reforçada, temendo pela sua vida. Ela temia até que o próprio pai lhe fi-zesse mal, e ele também. Definitivamente não confiava no pai. Também não confiava no tio. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">A única pessoa em quem de fato confiava era sua mãe. E naquele momento ela estava naquele estado, praticamente entre a vida e a morte.<br />Estava distraído quando escutou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meu filho...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem acreditar, correu até a mãe. Ajoelhando-se, beijou-lhe a face e em lágrimas balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mãe... graças aos céus...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Onde está seu pai?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu não sei. Ele viajou, acho. Fique calada, mãe, você não pode fazer nenhum esforço. Foi ferida gravemente e precisa ficar tranqüila para se curar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seu tio...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Constantino?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim... Precisamos falar com ele...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por quê?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei que algo ruim vai acontecer...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, mãe, você precisa se acalmar. Tudo ficará bem, mas precisa ficar calma. Como se sente?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou com fome. Juliano exclamou sorrindo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso é um ótimo sinal! Você está melhorando! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Que maravilha, mal posso crer...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pensou que iria livrar-se de mim tão fácil?...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não diga isso, mãe. Não sabe o quanto sofri esse tempo todo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Faz tempo que estou aqui, nesta cama?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Umas duas semanas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fazendo menção de erguer-se, foi impedida pelo rapaz:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, mãe, o que está fazendo? Não pode levantar-se ainda. Deixe que Otávio a examine primeiro. Você ficou muito mal...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância, impedida pelo filho, voltou a deitar-se enquanto falou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sinto-me bem. Apenas um pouco tonta e fraca, mas estou bem. Não tenho nenhuma dor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas seu corte foi fundo e você perdeu muito sangue. Agora vai precisar de uma dieta especial por algum tempo para poder recuperar-se por completo. Portanto, fique aí quietinha. Logo Helena virá e então pedirei que chame Otávio. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Somente ele poderá autorizá-la a se levantar. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Estou aflita por seu pai. Onde ele está?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já disse que viajou, mãe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Para onde? Quando volta?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele saiu daqui enfurecido. Sabe que tio Constantino o irrita profundamente.<br />- Eu sei.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E receio, mãe, que não haja mais nada que possamos fazer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles se enfrentarão em breve.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que me diz? Ele lhe falou que iria atacar Constantino?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não. Constantino marchará contra seu pai.<br />- Como sabe?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu simplesmente sei e temo por ele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como pode ainda querer-lhe bem, depois de tudo? E não somente o que lhe fez agora, mas a forma como a tratou a vida inteira?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fui e sou fiel aos meus deveres. E você também deve ser. O caráter de um homem se mede pelo respeito que ele tem por si mesmo e pelos seus semelhantes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acontece que meu pai não tem respeito por ninguém.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E como aprenderá, se o tratarmos de igual modo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Juliano sorriu afetuoso e comentou, depois de longo período de silêncio:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Simplesmente não sei como consegue, mãe. Constância insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sabe onde ele está?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, mãe, ele não me disse nada e realmente não me interessei em saber. Em breve estará de volta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Apreensiva, ela balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não tenho tanta certeza...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Helena entrou e ao deparar com os dois conversando, correu ao encontro deles, chorando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha senhora, graças a Deus acordou! Está melhorando...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A madura senhora respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seria melhor estar no mundo espiritual agora, mas ainda tenho tarefas a cumprir por aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Limpando as lágrimas Helena disse, segurando as mãos de sua senhora:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fico feliz, a senhora nos faria muita falta. </span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-44560355801918937372017-09-18T15:22:00.003-07:002017-09-18T15:22:45.208-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 4 - Duas Testemunhas</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Duas testemunhas espirituais assistiam àquela cena repleta de alegria, suavidade e amor. Com vestes diáfanas e luminescentes, Angélica acompanhava o despertar de Constância, de quem havia cuidado carinhosamente. Sorrindo, ao constatar finalmente a recuperação de sua protegida, comentou com Maurício:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pode voltar agora à colônia. Ela ficará bem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O belo rapaz, que mais lembrava a figura de um anjo, tão insistentemente retratado por artistas de todos os tempos, fitou Angélica com ternura e perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem certeza?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, ela conseguiu responder muito bem ao nosso tratamento. Seu corpo está em recuperação e o quadro é promissor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fazendo pequena pausa, ela prosseguiu, com suave entonação na voz:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você ajudou muito, agradeço mais uma vez.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não me agradeça. Devemos tudo a Jesus.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, eu sei. Agora é importante que você retorne à colônia, levando a Ernesto as boas notícias. Pelo empenho com que tem acompanhado o processo de expansão do Evangelho de Jesus sobre a Terra e pelo seu envolvimento em todos os detalhes, ele gostará de saber que conseguimos impedir a partida de Constância antes do previsto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou agora mesmo. Você me parece cansada. Vai demorar-se muito ainda aqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ficarei até que a situação se acalme.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas parece agravar-se cada vez mais.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você sabe o porquê.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ambos emudeceram por longo tempo. Maurício, por fim, comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É... Não podemos desanimar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- De modo algum; vamos perseverar. O Cristianismo haverá de triunfar sobre a Terra. Por mais que haja resistência de todos os lados, a verdade que Jesus veio trazer à humanidade prevalecerá!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por quanto tempo ainda negaremos e deturparemos seus ensinamentos? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Por que o homem não compreende o que o Mestre veio ensinar?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Porque somos ainda crianças, espiritualmente falando. Temos muito a aprender, e enxergamos tudo com nossa limitada compreensão da realidade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E por que alguns conseguem e outros não? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- É por causa da humildade e da fé. Alguns já conseguem ser humildes o suficiente para intuir que são limitados demais, e não podem confiar nas próprias interpretações; precisam buscar a verdade. E mais do que isso: estão dispostos a fazer o esforço necessário para trilhar o caminho da iluminação espiritual, da regeneração de si mesmos. Estão dispostos a abrir mão dos prazeres e ilusões passageiros, para dedicar seus esforços àquilo que é essencial e perene.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por quanto tempo ainda os cristãos sofrerão tamanha perseguição? Não deveria ser assim, não é mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quem somos nós para tirar esse tipo de conclusão? No entanto, meu mais profundo desejo é que os homens despertem do sono da ignorância em que ainda estão imersos. Mas agora é melhor que você vá. Leve notícias e peça novas orientações. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Preciso saber em que poderei ajudar, no caso de as suspeitas de Constância estarem certas. As circunstâncias se precipitam cada vez mais e estou receosa pelas decisões que Constantino tem tomado; ele vem colaborando com os nossos objetivos, como se propôs, mas sinto que pouco a pouco distancia-se, na essência, daquilo que deveria fazer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas ainda age em nosso favor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Aparentemente. Entretanto, sinto que suas motivações estão se desvirtuando.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Se estiver certa, ele poderá perder-se a qualquer momento.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Esse é o meu receio. Preciso da ajuda de nossos orientadores do Mais Alto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem demora, ambos se despediram e Mauricio partiu em direção a uma colônia espiritual situada sobre a região da Europa central. Não teve dificuldade de ultrapassar a grande diferença de vibrações entre os planos material e espiritual, e logo cruzava enorme portão que se abria para uma região espiritual de serena suavidade e intensa atividade do bem. A atmosfera se fez mais leve, doce fragrância de flores as mais diversas invadia o ar; pássaros e borboletas coloridas cruzavam o céu. Maurício deteve-se diante da beleza da colônia e respirou fundo, haurindo com satisfação as energias sutis que vibravam no ambiente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Entrou. Logo estava em companhia de Ernesto, que o aguardava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Maurício, é bom vê-lo. Que notícias nos traz dos irmãos encarnados?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Acomodando-se ao lado do orientador, Maurício suspirou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A situação continua difícil.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho percebido grande adensamento energético sobre o planeta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, como se nuvens negras e pesadas se acumulassem sobre a Crosta. Apesar disso, trago-lhe boas notícias. Conseguimos contribuir efetivamente para a melhora de Constância. Ela acaba de despertar e se recupera muito bem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Excelente trabalho, Maurício. Ela é nossa grande aliada no sentido de manter Constantino nos trilhos de sua programação. Ela é fundamental. O rapaz prosseguiu, interessado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Angélica continua dedicada à sua recuperação.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ela tem conseguido maior influência sobre Constantino?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem trabalhado muito, mas também está receosa de que ele se desvie de sua tarefa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Honestamente, Maurício, eu também estou, e muito.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O jovem fitou Ernesto sem dizer palavra. Também estava apreensivo. Depois de breve pausa, indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Achei que talvez Angélica exagerasse... Então ele realmente está se desviando da tarefa?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pouco a pouco, quase imperceptivelmente, vem se distanciando de nossa programação.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E o que podemos fazer?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Faremos tudo o que estiver ao nosso alcance, mas a decisão é dele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sério, Maurício indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Conhece-o há muito tempo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, desde Capela. Surpreso, Maurício comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É... faz tempo mesmo. Também vieram de lá?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E chegamos antes de você, um pouco antes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A grande maioria já retornou....</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Contudo, há ainda muitos por aqui. Estamos tentando, não é mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sinto saudade de meu verdadeiro lar. Desejo retornar assim que for possível; mas como fazer isso, deixando para trás tantas pessoas queridas? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não posso, por enquanto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei bem o que sente. É o caso de Ferdinando, ora vivendo na Terra como Constantino.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele já tem preparo suficiente para realizar a tarefa que se propôs.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Certamente. Entretanto, não importa quão preparados estejamos, sempre poderemos falhar; basta uma distração, um enveredar pelo caminho do orgulho e nos deixar dominar por ele, e pronto. O retorno fica muito difícil.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Calaram-se novamente. Ernesto ergueu-se, caminhou até uma grande janela que dava para florido jardim e comentou, por fim:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Continuemos orando e confiando. Deus jamais permite que se coloque sobre qualquer de seus filhos peso maior do que está preparado para suportar. Confiemos que Constantino será capaz de reencontrar-se e ser vitorioso, afinal. </span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-45734707735597196962017-09-18T15:16:00.000-07:002017-09-18T15:16:26.489-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 5 - Era Madrugada </span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Era madrugada quando o mensageiro de Constantino alcançou os portões de Bizâncio. Constância, que se recuperara quase completamente do triste incidente com o marido, deu um pulo na cama e sentou-se, tremendo, assustada. Ofegante, tirou o pequeno crucifixo que trazia junto ao peito e suplicou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mestre Jesus, socorra-me e à minha família. Meu coração está opresso e me diz que algo sombrio está por acontecer. Ajude-nos, por favor...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem compreender por que a dor no peito a oprimia tanto, não pôde conter as lágrimas que lhe desciam pela face alva. Pedindo repetidamente o socorro de Jesus e de seus enviados, ela finalmente conseguiu acalmar-se e voltou a se deitar. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Entretanto, por mais que tentasse, não conseguia conciliar o sono e revirou-se na cama até o sol brilhar intenso no céu do Mediterrâneo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Assim que adentrou os portões da fortificada cidade, o mensageiro do Augusto do Ocidente deu de comer ao seu cavalo e descansou brevemente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tinha ordens de seu general para retornar com a resposta de Licínio tão logo a obtivesse. Quando o dia amanheceu, dois soldados da guarda pessoal do imperador vieram buscá-lo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O imperador Licínio irá recebê-lo agora. Acompanhe-nos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Prontamente o mensageiro os seguiu até o imperador. Ajoelhado diante do grande general que dividia o poder do império romano com Constantino, o jovem permaneceu calado, aguardando as instruções do soberano, que depois de longo silêncio indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que quer Constantino?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Os sármatas ameaçam nossa fronteira, senhor, e Constantino pede autorização para cruzar seu território, a fim de surpreender o inimigo, antes que este avance sobre Roma.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O quê? Que estratégia ridícula é essa de seu imperador? O que ele pretende? Vamos, responda!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem erguer os olhos, o rapaz apenas disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu não sei, senhor. A única orientação que recebi foi para pedir-lhe a autorização e retornar imediatamente com sua resposta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio sorriu, cínico, e insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sabe? Tem certeza? Vociferou então, com o rapaz:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, diga o que Constantino planeja! Você não é um soldado? Deve saber, então.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Trêmulo, o rapaz redarguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu não sei, senhor, apenas cumpro ordens. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- E por que Constantino planeja atacar os sármatas por minhas terras? É certamente o caminho mais longo. Decerto ele planeja algo contra mim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio levantou-se e caminhou até a janela da ampla sala. Ficou longo tempo em silêncio, olhando pela janela. Depois, aproximou-se do rapaz e, encostando a cabeça na dele, segurou-lhe a face com uma das mãos e gritou com violência:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei muito bem o que ele planeja. Vou esperá-lo muito bem preparado. E quanto a você, meu rapaz, se quiser fixar residência aqui, a partir de agora, será poupado de longa e dolorosa viagem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O jovem soldado fitou o general, que naquele momento lhe parecia ainda mais alto e mais forte, antes de responder com estranheza:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso, senhor... Meu general me aguarda. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Com ar prepotente e arrogante, Licínio ordenou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois bem, que assim seja. Quero dar uma resposta contundente ao seu senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E chamando um de seus homens, ordenou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Levem-no ao poste. Cem chibatadas, depois deixem-no partir.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O rapaz fitou o imperador com os olhos arregalados, mal acreditando no que escutava. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Sabia que Licínio era um general duro e muito experiente, mas jamais esperaria tal atitude de um outro soldado. Sem dizer palavra, foi arrastado pelos guardas e chicoteado impiedosamente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois, colocaram-no sobre o cavalo e mandaram-no partir. Embora muito machucado, ele conseguiu conduzir seu cavalo até a divisa dos domínios do Oriente com os do Ocidente. Foi socorrido pelos colegas e logo acomodado em um leito, para receber tratamento. Antes de ficar inconsciente, disse com enorme esforço:<br />- Ele não permitirá...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O general, que pessoalmente o auxiliava, acalmou o rapaz:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Nós já sabemos. Agora, descanse.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Logo o soldado ficou inconsciente. E depois de duas noites naquele estado, não resistiu aos ferimentos que, associados à longa jornada, ceifaram-lhe a jovem vida. Alguns dias depois, Constantino chegou ao acampamento, com seu exército já arregimentado e ordenando que todos os seus melhores homens, espalhados pelo império, se juntassem a ele para a batalha iminente. Policarpo, o general responsável pelo acampamento próximo à divisa, detalhou o estado em que o jovem chegara. Cheio de ódio, Constantino fê-lo repetir a narrativa a todo o acampamento e, ao final, mostrando-se indignado, proferiu suas ordens da maneira mais eloqüente:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E por essas decisões arbitrárias que temos de tomar o reino do Oriente das mãos de Licínio. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Invadiremos Bizâncio e subjugaremos o imperador do Oriente e seus homens mais fiéis. Chega de agressões descabidas. Primeiro os cristãos, depois minha própria irmã quase morreu nas mãos desse monstro, e agora esse jovem inocente, que simplesmente cumpria ordens, deixando sua família, por estupidez absoluta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fez longa e calculada pausa, e depois concluiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não toleraremos mais isso! Sigam-me e seremos vitoriosos! Vou liderá-los pessoalmente nesta batalha e, ouçam bem o que digo, nós venceremos!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Envolvidos pela emoção que as palavras inflamadas de Constantino lhes causavam, eles gritaram, liderados pelos homens de confiança do imperador:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ave César, único imperador de Roma!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino fitou os seus homens a ovacioná-lo e emocionou-se. Eram mais de 100 mil homens a gritar diante dele. Sentia com todas as forças que venceria Licínio e se tornaria o único imperador. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Era esse, agora, seu propósito. Toda a sua força estava voltada para esse fim. Retirou-se com seus generais, para organizar o ataque que fariam em breve à capital do Oriente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Durante vários dias o exército de Constantino avançou mais e mais, rumo a Bizâncio, cidade que pretendiam dominar e ocupar. De fato, Constantino desejava fazer dela a sede de seu império. Famosa pela posição estratégica que ocupava, desde muito havia despertado o interesse do grande general. Quanto mais avançavam, mais crescia o número de soldados. Acampavam à noite, e mal o dia amanhecia todos se punham a caminho. Superaram o frio e regiões de difícil acesso, mas foi às margens do rio Ebro, pouco distante de Bizâncio, que foram obrigados a parar, dada a violenta correnteza que dificultava a tra-vessia dos 120 mil soldados, entre homens de infantaria e cavalaria.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino determinou que acampassem:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E inútil avançarmos agora. Precisamos entender bem a situação de nosso oponente. Passaremos esta noite aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco observou, preocupado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acho bom mesmo descansarmos. Os homens estão exaustos .</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois ficaremos aqui por ora. Marco, quero que envie uma pequena tropa de seus melhores homens - pequena mesmo, dois ou três - para que verifiquem a situação logo após o rio. Precisamos saber exatamente a situação de Licínio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Atendendo de pronto à ordem de seu imperador, Marco retornou algum tempo depois, informando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estão a caminho. Enviei três de meus melhores soldados.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ótimo. Aguardaremos o retorno deles. Quero que montem vários turnos de descanso, e que metade dos homens esteja sempre desperta e em alerta. Licínio pode atacar a qualquer momento.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco indagou, surpreso: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Acredita mesmo que ele planeja atacá-lo, senhor?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acredito que um homem desesperado seja capaz de qualquer ação.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao final da tarde seguinte, os três experientes soldados retornaram trazendo informações precisas e preciosas, que foram logo levadas a Constantino.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- As tropas de Licínio ocupam as planícies de Adrianópolis. Estão espalhadas por terrenos elevados, o que definitivamente lhes garante vantagem, pelas condições do terreno.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quantos homens?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E grande demais o seu exército. Meus homens ficaram muito impressionados. Relataram que o campo está como coberto por formigas. São muitos homens. Garantem que excede em número nosso exército.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino ficou longo tempo pensando e depois ordenou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Iniciaremos a construção de uma ponte ainda de madrugada. Quero muitos envolvidos nessa construção. Metade dos homens deve se dedicar à empreitada.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Os generais de Constantino o ouviam atentos. Jamais questionavam suas ordens ou suas estratégias, que muitas vezes não compreendiam, mas sabiam que elas já haviam concedido àquele exército mais de dezessete vitórias; portanto, confiavam em seu general. E o seguiriam lealmente até a morte.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Vários dias se passaram, e a ponte se erguia pouco a pouco sobre o rio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Naquela noite, ao despedir-se de seus homens, Constantino sabia que a hora de atacar havia chegado. Sabia que o oponente acompanhava suas manobras, e chegara a hora de surpreendê-lo. No meio da madrugada, mandou chamar seus três principais generais e ordenou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero um regimento com cinco mil arqueiros. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Vamos atravessar o rio e nos embrenhar pela floresta densa; surpreenderemos os homens de Licínio pela retaguarda. Eles não nos esperam. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Meu objetivo é atacar o acampamento de Licínio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Os generais se entreolharam, surpresos pela ordem inesperada; no entanto, não ousaram sequer fazer qualquer comentário. Obedeceram de pronto. Sabiam que o elemento surpresa seria fundamental na ousada estratégia de Constantino.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Antes de saírem, Marco virou-se para Constantino e perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Permita-me saber se poderei estar entre os líderes desse ataque.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você e os demais, meus homens de confiança. E eu, pessoalmente, vou liderar o ataque.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fazendo posição de sentido e olhando com profunda admiração para aque-le jovem general que estava diante dele, Marco se retirou. Ao sair da tenda de Constantino, cruzou com Crispus, filho mais velho do imperador, que entrou ansioso, indagando: - Vai sair à batalha, meu pai?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Assim que os homens estiverem prontos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero acompanhá-lo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seja paciente, Crispus, tenho planos para você.<br />- Que planos, senhor?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Dada a sua habilidade náutica, quero poupá-lo para o possível confronto que teremos com a armada de Licínio, que ocupa o estreito de Helesponto. Temos de derrotá-los no mar para poder aniquilá-los de fato. Não podemos correr o risco de desembarcarem e nos atacarem no momento em que estivermos para invadir Bizâncio. O que sabe sobre a armada?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei que é poderosa, com mais de 350 navios grandes e bem equipados ocupando todo o Helesponto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fitando o rapaz como a desafiá-lo, o mais velho inquiriu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E o que você pensa sobre isso? O que acha? </span><br />
<span style="font-size: x-large;">Pode vencê-los? Crispus pensou um pouco, depois continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Nossa frota é bem menor, é verdade, mas nossos homens são leais e corajosos. Aguardam suas ordens, prontos a obedecer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Tocando com a mão direita o ombro do filho, Constantino autorizou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito bem, meu filho, aguarde minhas ordens. Permaneça no acampamento. Sua luta será no mar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Diligente, o rapaz assentiu com a cabeça e respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Atenderei prontamente às suas ordens.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Voltarei em breve com a vitória para prosseguirmos rumo à conquista definitiva de Bizâncio e à derrota final de Licínio. Quero que destrua completamente sua força náutica; transforme-os em fumaça...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Crispus tão-somente respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois assim será!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Logo em seguida Marco entrou e comunicou:<br />- Estamos prontos, senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino vestiu a armadura, empunhou a pesada espada que o acompanhara em tantas outras batalhas e, fitando-a como a conversar com ela, conclamou em alta voz:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- À vitória!</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-44080902461744220932017-09-18T15:06:00.003-07:002017-09-18T15:06:47.526-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 6 - Enquanto Caminha</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Enquanto caminhava pela colônia, em um dos grandes jardins floridos, Angélica cumprimentava os amigos e colegas com quem compartilhara trabalho e aprendizado. Ela também viera de Capela e alcançara, através de esforço e dedicação em diversas encarnações penosas, significativo progresso. Estava pronta para retornar à constelação do Cocheiro, mas embora sua alma suspirasse por voltar ao lar, seu coração se enchera de compaixão pelos habitantes da Terra e seu difícil caminho de evolução. Queria ajudar e, como Ernesto, resolvera permanecer para isso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Finalmente chegou a uma grande construção, onde Ernesto a aguardava. Assim que a viu, encheu-se de alegria. E abraçando-a exultou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É bom vê-la outra vez, Angélica.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Retribuindo-lhe o carinho, ela o abraçou ternamente e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Também estava com saudade, mas achei melhor permanecer junto a Constância.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Deixando visível sua preocupação, Ernesto comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A situação está piorando muito, não é?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito. Constância já não consegue acesso ao irmão. Constantino distanciou-se emocionalmente de toda a família. Inclusive dos próprios filhos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tem se enclausurado em si mesmo cada vez mais, e perigosamente acredita naquilo que falam sobre ele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Entristecido, Ernesto lamentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O poder o está cegando totalmente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu temo que sim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O poder que ele deveria utilizar para fortalecer o bem e a verdade, para fazer expandir-se sobre a Terra a luz do Evangelho, está usando para satisfazer as próprias paixões.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E isso mesmo. Infelizmente, creio que ele não conseguirá! Ernesto calou-se e meditou por longo tempo. Depois, perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E como está Constância?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Apesar de fisicamente recuperada, sua alma sofre muito, pois sabe que ambos, Licínio e Constantino, se desviaram de suas tarefas, e estão prestes a se confrontar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E eram dois imperadores justamente para se ajudarem mutuamente em tarefa de tamanha responsabilidade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não resistiram aos apelos da personalidade, do ego. Ao egocentrismo e ao endeusamento de si mesmos. Suspirando fundo, Angélica emendou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Nossa irmã sofre profundamente, pois intui a dor e o sofrimento que os aguarda após deixarem a Terra.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A jovem fez uma pausa, depois continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que poderemos fazer, Ernesto? Uma programação reencarnatória tão preparada, longamente planejada, agora prestes a se perder...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E... O livre-arbítrio. Não podemos impedir que Constantino faça suas escolhas. Ele tem esse direito. E aqueles que o seguem também. O que podemos fazer, agora, é rogar ao Pai Celeste nos socorra e nos oriente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles estão prestes a se enfrentar. Talvez o façam agora, enquanto nos falamos. Constantino alcançou as planícies de Adrianópolis com mais de 120 mil homens; Licínio está acampado com seus homens nas planícies, já mais para o lado de Bizâncio. A guerra é inevitável e...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Angélica não pôde continuar. A dor tomou conta de seu coração e pesadas lágrimas desciam pela sua face. Ernesto buscou consolá-la e disse, tocando suas mãos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei que é difícil...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quantas vidas perdidas... Quanto sofrimento inútil... Quanta dor se projetando para o futuro dessas almas...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, minha irmã, infelizmente. Limpando as lágrimas, ela indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por quê? Por que ainda é tão difícil para os homens compreender...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Porque a verdade incomoda os homens, Angélica.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por quê?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ernesto pensou por alguns momentos, depois, envolto em safírica luz, disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Os homens tentam de todas as maneiras fugir de sua difícil, angustiosa situação espiritual.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que não procuram sair da situação, para serem mais felizes? A verdade nos liberta, nos faz donos de nossos destinos, nos aproxima de Deus e nos torna seres mais felizes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sem antes nos obrigar e enxergar nossa real condição espiritual. Jesus trouxe para os homens a consciência de nossa real condição espiritual, ar-rancando-nos das ilusões em que nos apoiávamos, acreditando-nos possuidores de uma superioridade que não existe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fez curta pausa. Angélica o escutava atenta. Ele continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Conscientes de nossa real situação, temos de tomar uma decisão, e arcar com as conseqüências advindas dela. Podemos optar pela iluminação espiritual, conscientes de que ela é árdua, difícil e demorada, mas o único caminho para nossa real felicidade. Ou então, abafar a consciência e escolher a fantasia, a mentira, pois ela nos dá maior prazer, maior satisfação e não nos obriga a empreender os esforços de resignação, humildade e desapego às ilusões, principalmente sobre nós mesmos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Angélica balançou a cabeça em sinal afirmativo e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem razão, meu sábio amigo. A verdade nos liberta, mas depende de nosso esforço e coragem para nos vermos como realmente somos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Exatamente. Por isso matamos Jesus impiedosamente. Calando o Messias, tentamos fazer silenciar a própria consciência que gritava dentro de nós.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Angélica ia fazer uma pergunta, quando Ernesto sugeriu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Oremos a Deus. Ele haverá de nos orientar. E acima de tudo, tenhamos paciência, sabendo que nós mesmos viemos de longa data fugindo destas verdades...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Angélica sorriu ao repetir:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Paciência...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E Ernesto finalizou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E muita perseverança. O bem triunfará, isso é inevitável. A verdade será vitoriosa.</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-46348623693186899812017-09-18T15:01:00.001-07:002017-09-18T15:01:06.502-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 7 - Constantino Liderou </span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Constantino liderou cerca de 5 mil homens que atravessaram o rio Ebro nadando e logo que cruzaram as águas, tal qual Constantino havia planejado, embrenharam-se por densa floresta para atacar o acampamento de Licínio pela retaguarda. Contavam com a surpresa do oponente para enfraquecê-lo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Pouco antes do alvorecer, quando se ouviam os primeiros pássaros aqui e acolá, fez-se grande rumor por todo o acampamento e a confusão se instalou. Licínio ergueu-se de um salto e em poucos segundos estava armado, já sobre seu cavalo. Viam-se as flechas voando pelos céus do acampamento, e homens tombavam por todos os lados. Licínio gritou enquanto tentava controlar o cavalo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- De onde vem o ataque?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um de seus generais aproximou-se, informando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estão nos atacando pela floresta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A reação do exército de Licínio foi rápida, mas perdiam muitos homens, rapidamente. Tombavam às dezenas por todos os lados. Os poucos minutos que levaram para conseguir se organizar, foram suficientes para conceder grande vantagem a Constantino, que se aproximava velozmente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Um dos generais de Licínio enviou alguns de seus melhores homens à frente, para tentarem saber quão perto estava o inimigo. Dos cinco enviados apenas um retornou, e ferido, informando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles se aproximam muito depressa. Melhor proteger o general... não posso... não...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Não suportando os ferimentos, desfaleceu. Logo um grupo de generais se reuniu, em meio à confusão, para pedir ao imperador que se retirasse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deve retornar imediatamente à segurança da cidade, senhor. O acampamento já não é seguro.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio nem tentou argumentar. Arregimentou rapidamente um grande número de homens e partiu em retirada, caminhando na direção das muralhas que fortificavam e protegiam a importante cidade de Bizâncio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino, por sua vez, avançava mais e mais. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Os homens de Licínio, ainda que em número muito maior, eram forçados a deixar sua vantajosa posição em terreno íngreme e descer para uma grande área plana em terras de Adrianópolis, concedendo assim mais vantagens aos atacantes.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quando conseguiu alcançar o coração do acampamento, onde alguns minutos antes estava Licínio, Constantino ordenou que os arqueiros atirassem flechas flamejantes, com tochas nas pontas, para o alto, avisando a seu exército que deveria atacar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Cruzando bravamente o rio, o exército de Constantino avançou intrépido ao encontro de seu general. Este, de espada em punho, atacava tudo e todos que encontrava pelo caminho. Desejava o confronto com Licínio, mas já pressentia que ele tivesse recuado. Seguiu-se, então, violenta batalha que dizimou mais de 34 mil homens.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Pelo meio da tarde, Constantino vencera o exército do opositor e imediatamente se dirigiu para as muralhas de Bizâncio, com o objetivo de invadi-la.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Conclamando mais uma vez seus homens, gritava com vibrante entonação:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não esmoreçam agora!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de breve pausa, gritou ainda mais alto:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A vitória está próxima! Breve Bizâncio será nossa!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco, tentando protegê-lo mas conhecendo seu imperador, indagou hesitante:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não seria melhor descansarmos um pouco, meu senhor? Precisa cuidar desse ferimento. Está sangrando muito.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Descendo de seu cavalo, Constantino improvisou ataduras e amarrou-as fortemente à coxa, acima do profundo corte que sofrerá. Depois, subiu no animal e agradeceu: - Compreendo seus cuidados, Marco, mas nada me deterá agora. Estamos a um passo da conquista completa do império. Não quero me demorar. Temos de invadir a cidade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Chamando outro de seus generais, ordenou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Encontrem os homens de Licínio que debandaram para a floresta. Não quero surpresas...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Prontamente, o outro aquiesceu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, imediatamente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois, intrépido, Constantino ergueu uma vez mais a espada já sem brilho e gritou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Logo estaremos dentro da cidade. Sigam-me e seremos donos de todo o império!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Envolvidos pelo forte magnetismo daquele homem, os soldados o seguiram sem titubear. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Confiavam cegamente em seu vitorioso imperador.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao se aproximarem das altas muralhas de Bizâncio, Constantino ordenou que montassem um forte cerco e começassem a construir engenhosas torres de terra.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de montar sua tenda e acomodar-se no local, chamou um de seus melhores mensageiros e ordenou pessoalmente:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Diga a Crispus que ele deve atacar imediatamente a frota de Licínio ancorada no Helesponto. Que force a passagem e destrua os seus navios. Precisamos que os alimentos nos cheguem por terra, e somente abrindo a estreita passagem que eles controlam poderemos receber os suprimentos de que necessitamos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O mensageiro partiu no mesmo instante. Ao final daquele dia as torres começaram a ficar prontas e pouco a pouco, com muito esforço e utilizando grandes alavancas de madeira, foram posicionados sobre elas catapultas que começaram a arremessar pesadas pedras e gigantescas tochas sobre as fortes muralhas da cidade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Em seu palácio, Licínio caminhava de um lado a outro, aflito, escutando o barulho do impacto que as pedras enormes causavam nas muralhas. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quando um de seus generais entrou na sala, ele logo indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que estão fazendo agora? Será que terão alguma chance de transpor esta fortaleza?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Preocupado, o general respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estão atacando as muralhas. Inseguro, Licínio retrucou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Elas são muito resistentes, suportarão os ataques. O outro prosseguiu, com forte tensão na voz: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Estão atacando no centro da muralha, justamente no ponto onde são mais frágeis.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como isso foi possível? Elas são muito altas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não conseguimos ver, mas de alguma forma colocaram as atiradoras num ponto mais alto, atingindo o centro de nossos paredões.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Cansado pelo recuo rápido que fora obrigado a realizar, e profundamente contrariado pelos avanços e manobras inteligentes do rival, Licínio gritava descontrolado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles não podem entrar, está entendendo? Tem de impedi-los. Derramem óleo fervendo sobre eles, agora!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É o que estamos tentando, mas fomos pegos de surpresa. Não temos nada preparado de pronto, para responder a esse ataque à altura. Se conseguirem entrar...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Agarrando o subordinado pelo pescoço ele bradava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles não podem entrar, está me entendendo? Vá, faça seu trabalho, seu incompetente! Estou cercado por incapazes, homens fracos!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O general saiu logo e Licínio continuou gritando impropérios. O cerco se estendeu por toda a noite e pelo dia seguinte, sem interrupções. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Constantino, acampado em local estratégico de onde acompanhava toda a movimentação de seus homens, estava totalmente convencido da vitória. Já podia ver-se ocupando o trono de Licínio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Amanhecia quando o mensageiro entrou depressa pelo acampamento próximo às margens do rio Ebro, onde Crispus aguardava as ordens do pai. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tão logo o mensageiro o procurou e transmitiu as ordens para o ataque, o jovem organizou seus homens e imediatamente lançou-se ao mar, ocupando a maior e mais bem equipada embarcação de que dispunham. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Enquanto esperava, planejara detida e minuciosamente o ataque que encetaria. Estava empolgado e via naquele ataque a grande oportunidade para ocupar um lugar de destaque e honra ao lado do pai. Queria muito que o grande Constantino reconhecesse seu talento e seu empenho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Não demorou muito a alcançar as embarcações do inimigo. Travou-se grande batalha. Embora a esquadra de Licínio fosse maior e melhor equipada, a determinação e a destreza de Crispus logo fizeram sua armada sobressair. Vários navios se queimavam sob o fogo da força marítima do filho mais velho de Constantino. A batalha durou todo o dia. Na manhã seguinte, muito embora seus homens demonstrassem sinais visíveis de cansaço, Crispus seguiu atacando. Perdeu várias embarcações importantes, e pelo meio do dia julgou que não poderia sair vencedor daquela batalha. Entretanto, de súbito, forte ventania soprou sobre o estreito do Helesponto, levando os navios de Crispus para bem perto dos do opositor.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">O jovem não teve dúvida: ordenou ataque maciço e incendiaram a frota adversária. Vários navios partiram em retirada e 130 foram destruídos. O seu próprio navio estava em chamas quando proclamou, erguendo a espada, à semelhança do que fazia o pai:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A vitória é nossa!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao grito uníssono da tripulação, Crispus escutou o cumprimento de seu subordinado imediato, que lhe tocava o ombro:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Brava vitória, Crispus! Excepcional! Seu pai se orgulhará de você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sorrindo satisfeito, o belo rapaz observou, com ligeiro sinal de cabeça:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Espero que ele seja comunicado da batalha em seus pormenores.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Compreendendo imediatamente o que o rapaz desejava, o outro respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele saberá, Crispus, todos os detalhes dessa brava e corajosa vitória.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Logo depois, alimentos e água chegavam ao acampamento de Constantino. Não demorou e a primeira muralha começou a ruir. Desesperado, Licínio aguardava informações. Um de seus generais entrou, ofegante:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Precisamos partir, senhor. Um de nossos muros externos acaba de ruir. Não vai demorar para que consigam enfraquecer outros e, assim, não tardarão a entrar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio ergueu-se, e logo organizou uma grande comitiva e partiu em retirada, levando consigo muitos baús contendo suas riquezas e tesouros. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Deixou para trás sua família e seu povo. Em região não muito distante, conseguiu reunir novo exército, com cerca de 60 mil homens.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino avançava em sua ofensiva e, pouco a pouco, outras muralhas foram derrubadas. O grande general estava prestes a invadir Bizâncio, quando foi informado por Marco:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Licínio escapou e formou um novo exército em Bitínia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quantos homens conseguiu arregimentar?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Certamente mais de 50 mil.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito bem. Quantos homens ainda temos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quase 100 mil, senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mande 80 mil para Bósforo, em pequenas embarcações. O restante, quero que ocupe a cidade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E tocando no ombro de Marco, pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você deverá ficar aqui e comandar a ocupação. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Marco fez menção de retrucar, mas ele prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Preciso de você aqui, Marco; é em você que mais confio. Eu irei com os outros.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Quero enfrentar Licínio pessoalmente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tenho de ter certeza que ele não vai escapar desta vez.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Desistindo de argumentar, Marco conformou-se:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Cuidarei de tudo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito bem, seja cuidadoso com as mulheres e as crianças. Não quero mortes desnecessárias. E cuide de minha irmã...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, meu senhor, cuidarei de tudo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito bem, vamos. Não quero dar nenhuma vantagem a Licínio.</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-45224275226427918952017-09-18T14:53:00.000-07:002017-09-18T14:53:06.617-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 8 - Não Tardou</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não tardou e dezenas de pequenas embarcações atracaram. O de-sembarque foi rápido e ágil. Assim que a maioria de seus homens alcançou terra firme, Constantino subiu depressa em seu cavalo e tomou a dianteira dos soldados. Andou um pouco e logo avistou o exército de Licínio. Intensa bata-lha se seguiu. Embora quase 25 mil homens tenham sido dizimados naquela tarde, Constantino não se sentia satisfeito. Caminhou, sem sucesso, entre os corpos estendidos à procura do rival. Depois se aproximou dos homens derrotados e perguntou irritado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Onde está seu vencido imperador? Por que não o encontro em parte alguma? Fugiu novamente, aquele covarde?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Os soldados de Licínio mantinham-se de cabeça baixa, temerosos. Constantino insistia, erguendo mais e mais a voz:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Todos ficarão a noite inteira sem água ou comida, e amanhã também, e assim sucessivamente, até que me digam onde está o covarde!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um dos soldados ergueu levemente o rosto e, sem olhar diretamente para Constantino, balbuciou quase num murmúrio:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele fugiu para a Nicomédia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino virou-se e olhou para a direção de onde vinha a voz, quase em enxergar o homem.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Aproximou-se, agachou-se e, segurando-lhe o queixo, ordenou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fale sem medo, homem! Não lhe farei mal. Não um mal maior do que o seu general lhes fez! Não tenha piedade de alguém que não se preocupa com seus próprios soldados!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ainda temeroso, o homem prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele fugiu assim que viu seus barcos se aproximarem; antes mesmo que seu exército tocasse o solo, fugiu para a Nicomédia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Erguendo-se satisfeito, Constantino ordenou: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Água e comida a todos os prisioneiros. Cuidem dos feridos e coloquem-nos nos barcos. Vamos voltar imediatamente a Bizâncio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E silenciando por alguns instantes, balbuciou por fim, como se pensasse alto:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deixem esse covarde comigo...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Quando adentrou os pesados portões de Bizâncio, o imperador encontrou seus cidadãos a esperá-lo. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não pareciam um povo vencido, mas sim um povo que aguardava ansiosamente por seu imperador. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Aquele povo estava cansado dos desmandos e agressões de Licínio e esperavam que ò novo imperador fosse mais condescendente com eles, pois a fama do heroísmo e grandeza de Constantino a todos encantava.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Em seu quarto, andando de um lado a outro, Constância aguardava angustiada pelo irmão. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Desejava notícias do marido e temia pela sua vida. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Pressentia que Licínio estivesse vivo, mas sabia que mesmo que isso fosse verdade, não era garantia alguma para o futuro de sua família. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Estava profundamente abatida. O filho pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, mãe, sente-se. Você parece exausta. Assim não terá forças para falar com tio Constantino, quando ele chegar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância sentou-se ao lado de Juliano e de Helena, e segurando as mãos do rapaz, desabafou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem razão, meu filho. Estou sendo tola. É que sinto que falhei de algum modo. Não deveria ser assim...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O rapaz obtemperou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ora, mãe, o que está dizendo? Não conheço ninguém que tenha tido tanta paciência e perseverança com outra pessoa, como você com meu pai. Mesmo sendo ele um homem tão rude, você jamais desistiu ou mudou sua conduta com ele. Como pode ainda sentir-se em falta, seja da forma que for?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Olhando o filho nos olhos, ela respondeu como se olhasse para o infinito:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei explicar, meu filho... Mas sinto que falhei... Meu dever era ajudar seu pai a ser, junto de seu tio, o forte pulso do império...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Estranhando muito, o rapaz comentou admirado:<br />- Mãe, estou surpreso. Você, envolvida em questões políticas...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se trata disso...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes que ela pudesse concluir, Marco entrou no quarto e comunicou, gentil:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seu irmão a aguarda, senhora.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com o coração batendo descompassado, ela balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E Licínio...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abrindo a porta para que ela passasse, Marco limitou-se a dizer:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele está vivo. Constância dirigiu por sobre os ombros olhar quase aliviado para o filho e para a amiga, depois seguiu Marco em silêncio. Assim que Constantino a viu, abriu largo e sincero sorriso, estendendo-lhe os braços:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha irmã, como está? Fiquei deveras preocupado com você. Tocando de leve a cicatriz na cabeça da irmã, ele continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que foi que aquele monstro lhe fez?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela sorriu com ternura, evitando fitar o irmão, e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não fale assim de Licínio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E ainda tem coragem de defendê-lo, Constância?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele fez isso numa hora de desespero extremado...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele vive em desespero extremado. Não consegue conviver com sua própria estupidez. E pare de defendê-lo, minha irmã. Já chega! Tem de parar com isso. Precisa desistir de vez desse homem que só lhe fez mal.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ajoelhando-se aos pés do irmão, ela implorou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não lhe faça mal, por favor, meu irmão...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Erguendo-a com ternura, Constantino comentou enquanto lhe afagava os cabelos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como você se parece com nossa mãe, é impressionante. Seus gestos, seu carinho, sua dedicação... Vocês se parecem muito. Sente-se aqui, venha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E acomodando a irmã ao seu lado, pediu que lhe servissem comida e bebida. Convidou seus homens de confiança para que se sentassem também.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos celebrar a fragorosa derrota de Licínio. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Constância calou-se por longo tempo. Bem mais tarde, quando terminaram o demorado jantar, quando estavam praticamente a sós, Constância pediu de novo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meu irmão, pelo amor que você tem por mim, eu lhe imploro pela vida de Licínio. Deixe que ele viva...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E, envolvida pelas energias de Angélica, que lhe influenciava o pensamento, disse sem que pudesse dar conta de suas palavras:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não destrua sua oportunidade de reconstrução... Constantino sentiu forte arrepio a percorrer-lhe o corpo. Olhou sério para a irmã e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Do que está falando?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem esperar resposta, continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não importa. Vou descansar agora e você deve fazer o mesmo. Falaremos sobre isso em outro dia, outra hora.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância ia insistir, mas deteve-se percebendo que naquele momento o melhor era silenciar. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Constantino, por outro lado, pensou muito por quase toda a noite. Tinha ímpetos de enviar soldados para eliminar o seu rival, mas ao mesmo tempo pensava no impacto que causaria sobre o povo. Já era quase dia claro quando finalmente decidiu o que fazer. Ao encontrar-se com a irmã para o desjejum, informou-lhe, solícito:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho notícias que lhe agradarão muito. Decidi conceder perdão a Licínio. Vou mandar chamá-lo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com lágrimas nos olhos, Constância quase não conseguia conter a emoção. Abraçou efusiva o irmão e agradeceu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deus seja louvado! Graças a Deus! Você é mesmo um homem bom e dig-no, Constantino. A verdadeira dignidade de um chefe de estado, a meu ver, está em sua capacidade de clemência. Eu lhe agradeço, meu irmão.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abraçando-a também, ele comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não poderia agir diferente com você, não é mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela sorriu e, limpando as lágrimas de alegria que lhe desciam pela face, perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E como vai informá-lo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ainda não sei.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Posso ir ao encontro dele pessoalmente, assim ele confiará em você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não gostaria de fazê-la expor-se a uma viagem, ainda que curta, depois de tudo pelo que passou...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não me será pesado. Vou levar Juliano e Helena comigo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem certeza?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, eu quero ir.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois muito bem. Vou designar um grupo de alta confiança para acompanhá-los.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E depois de breve pausa, perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acha que consegue trazê-lo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E claro, ele confiará em mim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então, boa sorte.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abraçando o irmão mais uma vez, ela confirmou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Partiremos após o desjejum. Não quero esperar mais.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem nada acrescentar, Constantino tomou seu lugar à mesa e se acomodando, em local cuidadosamente escolhido, de onde conseguia ver pela janela as construções da cobiçada cidade que acabara de conquistar. </span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-64620573377159183872017-09-18T14:07:00.002-07:002017-09-18T14:07:16.452-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 9 - Constância</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<span style="font-size: x-large;"><br /></span>
<span style="font-size: x-large;">Constância, o filho, Helena e pequena comitiva saíram logo pela manhã. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Seguiam rumo a Nicomédia, onde Licínio se refugiara, buscando algum tempo para que pudesse negociar algo em seu favor, junto ao seu opositor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Assim que o pequeno grupo alcançou o seu destino, Licínio foi avisado da chegada da família.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ao avistá-lo, o coração de Constância disparou. O marido estava pálido e abatido, visivelmente doente. Ela correu-lhe ao encontro, angustiada:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como está, querido? Fiquei tão preocupada... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Erguendo um pouco a cabeça, ele respondeu, agressivo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como acha que posso estar? Seu irmão me tirou tudo... Abraçando-o com ternura, ela pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Querido, é hora de abrir mão dessa disputa. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Acabou. Constantino ocupou Bizâncio, mas lhe concedeu o perdão e o direito de ficarmos todos juntos. Poderemos viver nossa vida...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que vida? O que me resta além da vergonha, da humilhação da derrota? Uma vida medíocre, em um buraco qualquer, fugindo e temendo as atitudes de Constantino?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Aproximando-se, Juliano tocou o ombro do pai, que permanecia sentado, cabisbaixo, e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Anime-se, pai. Com sua experiência, pode ainda realizar muitas coisas...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Erguendo a cabeça o imperador abatido fitou o filho e comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você não tem mesmo brios, não é? Estou derrotado. Minha família está envergonhada, vencida... Meu reino foi tirado, eu perdi tudo... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Estou derrotado... Já nada mais me interessa...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Constantino permitirá que vivamos com tudo aquilo de que necessitamos - aduziu Constância. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Você poderá fazer as coisas de que gosta, ou pelo menos gostava quando nos conhecemos...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Olhando para a esposa, ele permaneceu em silêncio. Depois indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E para onde vai nos enviar? Decerto para algum fim de mundo, abandonado por todos...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei bem, mas acho que nos enviará para Tessalônica. Erguendo-se, Licínio indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tessalônica?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acho que sim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E por quê? -Quando me disse que concordava em perdoá-lo, ouvi uma conversa breve entre ele e Marco, e parece que falaram algo sobre Tessalônica. Gostaria de ir para lá, Licínio?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas é claro! É um lugar de onde posso fazer muitos contatos e, quem sabe, reorganizar um exército...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Colocando o dedo indicador sobre os lábios do marido, ela pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não fale nada, por favor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Olhou na direção dos soldados que os haviam acompanhado e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agora temos de ir. Constantino nos aguarda.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ainda sem ânimo, Licínio juntou-se ao grupo e retornaram para Bizâncio. Ao entrarem na localidade fortificada, Licínio não conseguia conter o ódio que sentia por ter perdido aquela poderosa cidade. Via o desprezo no olhar daque-les que haviam sido seus súditos. Seu ódio crescia a cada passo que dava. Ao aproximar-se da ampla sala que havia sido seu lugar preferido para governar, sua cólera aumentou ainda mais. Seu coração batia descompassado, suas mãos estavam geladas e trêmulas, mas Licínio sabia, como ninguém, controlar e dissimular as emoções. Ao divisar seu trono ocupado pelo rival, sentiu como se todo o sangue do corpo lhe subisse à cabeça. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Seu coração parecia que explodiria dentro do peito. Ao vê-lo, Constantino ergueu-se e aproximou-se. Licínio, ciente de sua posição, ajoelhou-se diante do inimigo e permaneceu de cabeça quase no chão. Constantino observou-o atentamente e depois de alguns segundos disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Levante-se, Licínio. Você está perdoado. Poderá passar o resto de seus dias com todo o conforto e toda a sua riqueza. Seu exílio será em Tessalônica. Partem pela manhã.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem dizer nada, Licínio balançou a cabeça e ajoelhou-se outra vez em reverência diante do opositor. Constantino pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agora vamos, como forma de encerrarmos de vez essa disputa. E hora de agirmos como cidadãos romanos da alta estirpe que somos. Venha sentar-se comigo á mesa. Cearemos e encerraremos essa discórdia de vez. Fomos amigos, afinal. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Consideremos que a posição que ocupávamos nos obrigou aos atos que tivemos. Mas entre nós, Licínio, nada existe que nos faça reais inimigos...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Concordando mais uma vez com a cabeça, em silêncio, Licínio acompanhou a comitiva que seguia Constantino até uma enorme sala onde grande mesa estava montada. Acomodaram-se. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Constância, que ocupava o lugar ao lado do marido, buscava distraí-lo e animá-lo o quanto podia. Mas sabia que aquele era um momento tremendamente difícil para ele. O ato de perdão e concórdia de Constantino tornava-o ainda mais forte diante dos cidadãos de Bizancio e de seus próprios comandados. Aquele parecia um homem perfeito, quase um deus...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Na manhã seguinte, número considerável de homens seguiu para Tessalônica com Licínio e sua família. O imperador vencido seguiu calado a maior parte do caminho. Por mais que Constância tentasse conversar, permaneceu mudo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de acomodado em ampla mansão, com todo o conforto e trazendo consigo as riquezas pessoais, conforme Constantino havia prometido, Licínio descansou pelo resto do dia. À noite, pouco antes do jantar, avisou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não me esperem para o jantar. Surpresa, a esposa perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Aonde vai?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Preciso encontrar alguns velhos amigos. Espero que eles possam ajudar-me.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Pressentindo com clareza as intenções do marido, Constância pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Querido, acabamos de chegar e você precisa se recuperar. Ainda está cansado...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem esperar que terminasse ele falou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Cale-se, Constância. Sua voz me irrita! Com lágrimas nos olhos ela respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu só quero o seu bem...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então deixe-me em paz!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E saiu imediatamente, sem dizer mais nada.<br />Distante dali, Constantino jantava exultante com seus homens de confiança e com a família. </span><br />
<span style="font-size: x-large;">Crispus estava sentado à sua direita e Fausta ocupava o outro lado da mesa. A bela e sensual esposa do imperador tinha traços delicados. Sua beleza era suave e discreta, carregada de feminilidade e sutilezas. Ela sabia da atração que causava no sexo oposto e utilizava esse poder conscientemente. Era altiva, e sua posição a envaidecia e alimentava fortemente seu orgulho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino conversava animado sobre seus planos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou transformar Bizâncio na capital do império. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Aqui será o centro do mundo!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco sorriu e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E quanto a Roma?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Roma está decadente. Quero algo especial, que marque minha passagem sobre este império para sempre.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fausta acompanhava a conversa em silêncio. Depois de longa pausa do pai, Crispus indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Confia em Licínio? Vai deixá-lo mesmo livre? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Acho que ele será perigoso... Deveríamos tê-lo aqui conosco, como seu prisioneiro...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino fitou o filho e comentou: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Ora, Crispus, por que sempre questiona minhas ordens? Não consegue confiar em minhas decisões, não é?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O rapaz ficou imediatamente lívido. Não conseguia aproximar-se mais de seu pai e isso o incomodava muito. Respirou fundo antes de responder:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não é isso, pai... Mas ele é um homem perigoso, você sabe... Constantino bateu com toda a força sobre a mesa e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acha que porque venceu uma batalhazinha no mar pode questionar minhas ordens, minhas decisões?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fez uma pausa, depois concluiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei muito bem o que estou fazendo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Rubro de raiva, Crispus baixou a cabeça e continuou comendo. Constantino comentou com Marco, sentado à sua direita:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Insolente, esse meu filho...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Na verdade, Marco também não compreendia a reação do imperador. Quando recebera a notícia da corajosa e brava vitória que o rapaz havia alcançado no estreito do Helesponto, ele demonstrara quase desdém. O homem de maior confiança de Constantino não conseguia compreender-lhe a reação.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fausta, que tudo observava em silêncio, comentou com sua serva pouco depois, em seu quarto, enquanto aquela lhe penteava os longos cabelos castanhos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei bem por que Constantino não reconhece a fragorosa vitória do filho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E por que, minha senhora?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ficou com ciúme, isso sim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A senhora acha?!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho certeza. Ele tem medo até da própria sombra. Não tardará e esse ciúme vai controlá-lo.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Até porque Crispus está ficando cansado de fazer tudo pelo pai e não ser reconhecido.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sorrindo maliciosamente, ela completou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos dar uma ajudazinha à natureza, é claro...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem compreender, a serva terminou o que fazia e então ajudou sua senhora a trocar de roupa, acomodou-a na cama e saiu do quarto apagando uma das velas.</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-75375549096426393002017-09-18T14:00:00.004-07:002017-09-18T14:00:31.691-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 10 - Alguns Meses Se Passaram</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Alguns meses se passaram. Vez por outra chegavam aos ouvidos de Constantino rumores de que Licínio se encontrava com antigos amigos de combate. E ele calmamente comentava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não conseguirá fazer mais nada. Simplesmente, está acabado.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Enquanto dormia, Constantino recebia visitas espirituais que desejavam controlá-lo para satisfazer seus interesses. A respeito dessas companhias, Angélica comentava com Ernesto:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está cada vez mais difícil transmitirmos nossos pensamentos a Ferdinando, ora encarnado como Constantino. Ele parece não nos ouvir mais. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Continua cercado, e cada vez mais, pelos nossos irmãos que caminham distante da luz de Jesus, opondo-se sistematicamente à expansão do Cristianismo sobre a Terra. A escuridão, pouco a pouco, toma conta da mente e do coração de Ferdinando. Agora, mais do que nunca, pode-se observar claramente em torno de seu corpo espiritual a formação de densas energias enegrecidas e de baixo teor vibratório.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Suspirando fundo, Ernesto comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles insistem em combater qualquer esforço para a expansão dos ensinos de Jesus e, principalmente, para que eles sejam devidamente compreendido pelas pessoas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É muito triste a situação desses nossos irmãos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não percebem que os ensinos de Jesus lhes trarão libertação e auxílio? Não vêem quanta esperança espalham sobre a humanidade?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles sabem disso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- No entanto, mesmo assim se opõem sistematicamente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Desejam deturpar os preciosos ensinos de Jesus.<br />- E o que ganham com isso?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Persistem na ilusão que os alimentava na Terra, e ainda os alimenta no plano espiritual imediatamente ligado ao orbe terreno.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ambos ficaram pensativos por alguns instantes, depois Angélica afirmou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Do modo como Ferdinando está agora, acho que não conseguirá mais nos ajudar.<br />Ernesto comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E acho até que poderá prejudicar, e muito, o processo de crescimento do Cristianismo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Percebendo a preocupação de Ernesto, Angélica indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Será que ele apagou por completo da memória os compromissos assumidos antes de reencarnar? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Por certo que não. Ele sabe, tem consciência deles, mas de seu subconsciente emergem forças que o atraem para o que ainda é no íntimo. Os defeitos morais que tenta combater exercem profunda atração sobre sua personalidade atual. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Somente com muito esforço, humildade e dedicação ao bem ele poderia vencer-se e superar-se.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E a nossa grande luta interior...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abraçando Angélica fraternalmente, Ernesto reforçou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E é por esse motivo que nossos irmãos sobre a Terra necessitam tanto de nossa ajuda. Somente na troca entre os dois planos conseguiremos nos ajudar mutuamente e sair vitoriosos desta luta, que é de toda a humanidade, pela iluminação interior de cada ser humano e a conseqüente ascensão da Terra para um mundo de regeneração.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Muito interessada, Angélica indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E você sabe quanto tempo ainda levará para que isso aconteça, Ernesto?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acho que, de fato, só Deus o sabe. Dependerá de como a humanidade conduzirá seu destino rumo ao Criador.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Angélica ergueu-se e disse, cheia de entusiasmo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então temos muito trabalho a fazer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Temos muito trabalho, minha amiga.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E o que vamos fazer de agora em diante com Ferdinando?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por enquanto, continuaremos a cercá-lo com toda a ajuda que pudermos, no sentido de lembrá-lo de seus compromissos. Consultaremos nossos orientadores, mas se possível for, traremos Ferdinando até aqui, durante o sono, para conversar com ele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então, volto agora mesmo para junto de nosso amigo. Estarei de prontidão para o que for necessário.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ore muito, Angélica, pois sua vibração de amor atinge sempre o coração de nossos irmãos encarnados.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abraçando mais uma vez o amigo e companheiro de trabalho, Angélica abriu largo e sincero sorriso e despediu-se de Ernesto, retornando para junto de Ferdinando. Logo que adentrou o quarto onde ele dormia, encontrou três entidades espirituais de pesado teor vibratório que permaneciam em torno dele. Conversavam, sem registrar a presença de Angélica:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele está cedendo às nossas sugestões...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E será completamente dominado por nós. O outro concordou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Com algumas interferências aqui e ali, acabaremos com a encarnação dele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um deles perguntou, confuso:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele vai morrer logo? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Claro que não, estúpido! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Se conseguirmos desvirtuá-lo do caminho que tinha tomado inicialmente, será de muita utilidade para nossos superiores...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então ele continuará vivo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"></span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vivo e conquistando tudo pela frente. Quanto mais sucesso tiver, no ponto em que está, mais ficará em nossas mãos. A sua gana de poder nos é muito útil.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um deles comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- De fato, é uma das ferramentas que nos facilita a aproximação. Uma das entidades aproximou-se do corpo físico de Constantino, sugando-lhe as ener-gias vitais e sussurrando-lhe ao ouvido:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acabe com Licínio. Ele ainda lhe trará problemas. Coloque seu plano em ação. Por que esperar mais?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Por vezes, Constantino se revirava na cama agitado. Seu corpo espiritual, em profundo torpor, permanecia em repouso ligeiramente acima de seu corpo físico. Angélica suspirou fundo e, avistando outro companheiro espiritual da luz, aproximou-se dele e comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Olá, Germano, como está?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito preocupado com a situação de nosso irmão.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ernesto deverá vir buscá-lo, na tentativa de relembrá-lo de seus deveres.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Os dois avaliaram a situação espiritual danosa em que se encontrava o grande imperador e depois se entreolharam. Com os olhos marejados, Angélica convidou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Oremos, Germano, pedindo aos céus que auxiliem nosso irmão.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fechou os olhos e proferiu sentida oração, rogando o amparo divino para Constantino. Em alguns instantes o quarto encheu-se de safírica luz, e as entidades espirituais das trevas experimentaram imediato desconforto. Uma delas falou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estão aqui, mas não vamos sair. Um deles gritou, irritado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero ir embora! Estou me sentindo mal aqui dentro.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois agüente firme. Precisamos ficar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Aqueles que sugavam as energias de Constantino não conseguiram continuar e tiveram de afastar-se ligeiramente. Diante das emanações de amor e paz que envolveram o ambiente, suas próprias energias se enfraqueceram, concedendo momentânea trégua ao imperador, que pareceu dormir mais serenamente. Germano comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Bem, conseguimos uma trégua, não é mesmo? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Preocupada, Angélica aquiesceu e disse: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Mas por quanto tempo, meu amigo? As atitudes de Constantino não ajudam; pelo contrário, fortalecem mais e mais a ação desses irmãos equivocados e doentes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de longa pausa, ela suspirou fundo e falou:<br />- Confiemos em Deus. Ele é dono de tudo e de todos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Na manhã seguinte, Constantino acordou ainda entorpecido, mas decidido. Três dias depois, em Tessalônica, Licínio despertou cedo naquela manhã. Marcara um encontro com alguns de seus amigos e estava saindo, quando Constância foi ao seu encontro:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Licínio, aonde vai?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes que ele respondesse, segurou-lhe os braços, pedindo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não saia hoje, por favor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E por que não? Hesitante, ela explicou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tive um sonho estranho e confuso esta noite.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;"> Estou angustiada, triste. Não sei explicar, mas gostaria que você ficasse aqui hoje, por favor.<br />Afastando-se da esposa, ele falou, desdenhoso:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ora, Constância, se eu for dar ouvidos a esses seus sonhos, não faço nada... Você vive tendo sonhos a toda hora.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela tentou argumentar:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É que esse foi tão real...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Silenciou por um instante e, em lágrimas, continuou: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">-Tão triste...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não quero saber desses seus sonhos. Tenho compromisso e não venho para o almoço.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Saiu. Ao aproximar-se do estábulo, um de seus servos aproximou-se e lhe entregou pequeno pergaminho com curta mensagem:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />"Estamos aguardando você nas colinas. E necessário termos muito cuidado e sigilo absoluto. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Constantino espreita nossos passos."</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio montou seu cavalo e dispensou o serviço de seus soldados:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não precisam me acompanhar. Vou sozinho hoje.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E desapareceu depressa na direção do ponto onde era esperado.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Assim que alcançou o alto da colina, de onde podia avistar a cidade, apeou e prendia o animal quando viu um homem encapuzado aproximar-se. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Antes que pudesse fazer qualquer coisa, o homem sacou uma espada e feriu-o no coração. Apesar de ser um homem de vigorosa compleição física, Licínio sentiu o forte golpe e agarrou-se à túnica do agressor, desnudando-lhe a cabeça. De joelhos, já quase sem vida, olhou para o homem que o agredira e balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Marco... Foram suas últimas palavras, antes que seu corpo tombasse ao chão sem vida. Marco certificou-se de que cumprira devidamente suas ordens e foi depressa para trás de alguns arbustos, onde escondera seu cavalo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Assim que o corpo físico de Licínio tombou, inerte, seu corpo espiritual se desprendeu. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Indignado, ele gritava, sem ter total consciência de seu novo estado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu acabo com você, seu covarde. E bem próprio de seu senhor! Eu acabo com ambos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E rapidamente, sem que Marco pudesse notar qualquer diferença, agarrou-se a ele, em espírito, e seguiram a galope para Bizâncio. Marco levava consigo o inimigo de Constantino, agora desencarnado.</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-30130316197777650382017-09-18T13:52:00.001-07:002017-09-18T13:52:03.289-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 11 - A Viagem De Volta</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">A viagem de volta a Bizâncio foi marcada por dificuldades inesperadas, ladrões e animais perigosos. Marco estava perturbado e agitado. Executou as ordens de seu imperador, mas, ao contrário das outras vezes, em que nos campos de batalha era obrigado a executar seus inimigos, aquela situação o deixara visivelmente vulnerável.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Demorou-se mais do que o previsto e, quando adentrou os portões da bela cidade oriental do império romano, suspirou aliviado, murmurando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Finalmente estou em casa!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Apresentou-se imediatamente ao imperador, que o aguardava aflito. Ajoelhando-se diante de Constantino, ouviu dele:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Levante-se, Marco. Estava a ponto de enviar alguém atrás de você. O que aconteceu afinal? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Desincumbiu-se da tarefa que lhe confiei às mãos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Certamente, meu senhor. Sua ordem está cumprida, com todos ou cuidados necessários. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Meu atraso deve-se a problemas que tive no caminho de volta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que problemas? Foi seguido? Alguém presenciou?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, meu imperador, não fui visto por ninguém. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Enfrentei alguns percalços inesperados: animais selvagens me atacaram sem que pudesse pressentir-lhes a aproximação e também dois bandos de ladrões me cercaram. Consegui fugir de um deles, mas com o outro tive de deixar todos os meus bens, até mesmo meu cavalo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso acreditar. Isso aconteceu aqui, no oriente?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, foi ainda no ocidente. Sentando-se outra vez em seu portentoso trono, o imperador segurou firme nos braços da suntuosa cadeira e comentou, triunfante, quase sem escutar o que seu fiel servidor lhe narrava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então, sou finalmente o imperador absoluto. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Fazendo sinal de reverência, Marco confirmou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, o senhor agora é o único imperador de Roma. Constantino sorriu entre aliviado e satisfeito. Depois, levantou-se e tocou com firmeza o ombro do amigo, pedindo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vá descansar, Marco, você merece e me parece muito cansado. Realmente sua viagem não deve ter sido fácil.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco agradeceu e se retirou sem conseguir parar de pensar que nada havia sido fácil naquela tarefa que cumprira para o seu senhor. Por diversas ve-zes, vinha à sua mente a imagem de Licínio em seus derradeiros instantes, e sentia-se atormentado por aquela lembrança.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Por sua vez, Licínio, cujo corpo espiritual ficara na sala do trono, em companhia de Constantino, sussurrou ao ouvido do imperador:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pensa que vai fazer bom uso de seu poder? Vou infernizar e destruir sua vida. Você não terá mais paz. Pensa que acabou comigo? Triste engano. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Agora posso destruí-lo sem que perceba, e vou fazê-lo devagar, pouco a pouco, comprazendo-me com cada gota de seu sofrimento.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino remexeu-se no trono, experimentando inexplicável desconforto e súbita sensação de perigo. Licínio achegou-se ainda mais, colocando as mãos em volta do pescoço do imperador. Sem conseguir tocá-lo, gritou mais impropérios e tentou socar-lhe o estômago, também sem obter nenhuma reação de Constantino.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Quando ia agredir o opositor outra vez, escutou uma voz grave e pesada que vinha do fundo da sala:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não acha que vai atingir seu objetivo dessa forma, não é mesmo, Licínio? Tem muito que aprender, ainda, sobre sua nova condição.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O recém-desencarnado reagiu assustado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quem está aí? Pode me ver?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Das sombras escuras da sala emergiu, devagar, um espírito envolto em uma capa negra, que lhe cobria também a cabeça. Acompanhado de outros dois semelhantes a ele, aproximou-se e se apresentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sou Núbio. Estes são meus ajudantes Plínio e Normando. Licínio sentiu violento tremor percorrer-lhe o corpo espiritual.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ainda assustado, gaguejou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O... que... fazem aqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estamos aqui para destruir os planos de Constantino. - Também são inimigos dele?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não propriamente dele, mas isso não vem ao caso agora. Podemos ajudar você a realizar seu desejo de vingança, de maneira inteligente e eficaz.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E se eu não quiser?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Olhando fixo nos olhos de Licínio, aquele espírito ameaçador respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Junte-se a nós e nos obedeça, e garanto que realizará seus desejos. Caso contrário, seremos obrigados a expulsá-lo daqui, pois poderia, eventualmente, atrapalhar nossos planos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Intimidado, Licínio indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quem são vocês, afinal?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sorrindo, o encapuzado respondeu apenas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Servidores das trevas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fitando Licínio e aguardando por sua resposta, Núbio obrigou-o, através da energia de seu pensamento, a ajoelhar-se diante dele. Ainda mais assustado, Licínio concordou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está bem, está certo. Faço o que quiserem, desde que me permitam vingar-me dele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Terá a sua vingança, saboreando-a lentamente. Agora venha conosco.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio deixou a sala junto com os outros. Foram direto para os aposentos de Fausta, a segunda esposa de Constantino e mãe de seus três filhos mais novos. Ela dormia sono profundo, mas estava inquieta. Seu corpo espiritual pairava sobre seu corpo físico. Licínio observou o fato e espantado indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que é isso? Como ela pode ser duas ao mesmo tempo? Foi Plínio quem respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Todos os homens encarnados são assim. Você também era. Agora, depois que morreu na Terra, tem somente seu corpo espiritual.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio se examinava ao mesmo tempo em que olhava Fausta dormindo. Depois, Núbio convidou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Observe bem esses pontos colados ao corpo espiritual dela. Consegue reconhecer alguma imagem?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio observou atentamente, e depois respondeu:<br />- São imagens?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muitos são imagens que refletem os pensamentos que povoam sua mente. E é aqui que reside sua tarefa, por ora. Encontre, na exteriorização dos pensamentos dela, alguma imagem que possamos utilizar para destruir Constantino.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio continuava observando, sem entender a que Núbio se referia. Estava curioso demais para registrar suas ordens. Núbio, então, falou irritado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Plínio vai lhe dizer o que são essas imagens e como tirar proveito delas. Eu tenho mais o que fazer. Antes que pudesse sair, Licínio o deteve, agastado, mas contido:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que não posso ir com você?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não seja estúpido. Você pode ser mais inteligente do que isso. Tem de aprender a lidar com sua nova situação e podemos ensiná-lo bem depressa. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Agora pare de me trazer problemas. Tenho muito a fazer e você não pode me ajudar com sua atual ignorância.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fez breve pausa, depois continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Se quer mesmo sua vingança, terá de agir do nosso modo. Está bem claro?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio balançou a cabeça em sinal afirmativo e Núbio desapareceu no corredor. O primeiro, então, notou que havia outras entidades que andavam para todos os lados do castelo; alguns pareciam verdadeiros zumbis, já outros se assemelhavam mais a eles. Sem dizer nada, Licínio acompanhou Plínio, fazendo tudo o que ele dizia. Sua tarefa principal era vigiar os pensamentos e atos de Fausta, para compreender-lhe bem as fraquezas e poder atuar sobre elas de acordo com seus interesses. Dia e noite espreitavam-lhe os passos, os atos e as palavras. A presença daquelas entidades de pesado teor vibratório foi aos poucos envolvendo Fausta em uma pesada energia, que a debilitava lenta e sutil-mente, tornando-a dia a dia mais desconfiada e insatisfeita.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Vários meses se passaram. Constantino se dedicava ao projeto de reconstrução de Bizâncio, e transformou-a na capital do império, ainda que contra a vontade dos senadores de Roma. Ele pouco viajava para a antiga capital, demorando-se cada vez mais na cidade que escolhera para sua residência.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Estava satisfeito. Tinha nas mãos o controle absoluto do império, como sempre desejara, e queria que assim continuasse. Estava debruçado sobre a janela a contemplar os homens que trabalhavam, restaurando e modernizando construções, quando Marco chegou e saudou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ave, César!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meu amigo, o que o traz logo pela manhã?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Notícias de sua irmã.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que tem ela?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está gravemente doente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que houve?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Desde a morte de Licínio ela tem estado adoentada. Não se refez de todo do choque da perda do marido.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino ficou calado algum tempo, depois disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que se pode fazer? São reflexos indesejados, mas que eventualmente acontecem em uma empreitada, ainda mais da envergadura na nossa, não é, Marco?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O outro concordou: - Sem dúvida. O que devo fazer?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Continue a cercá-la de tudo de que necessita.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ela tem comentado com freqüência sua preocupação com as dissensões entre os Cristãos.<br />Interessado, Constantino indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso continua? Pensei que, após todos os nossos esforços, os cristãos estivessem vivendo finalmente em paz...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Parece que isso ainda não aconteceu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino sentou-se, tomou um belo cacho de uvas e ofereceu-o a Marco, que recusou, agradecendo. Depois de saborear algumas uvas, o imperador perguntou interessado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas afinal, são sérias essas discordâncias?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Parece que sim. Elas estão crescendo e criando certa animosidade entre diversos grupos e igrejas. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Alguns bispos se atacam durante as pregações e até os seguidores mais distraídos estão começando a perceber o que se passa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso não é nada bom, Marco; ao contrário, essa notícia me preocupa muito. A última coisa de que preciso é de grupos antagônicos dentro do meu império. Sobretudo agora, que finalmente ocupo o trono absoluto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de breve pausa, ele indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você acha que essas discórdias tendem a aumentar?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Se nada for feito, acredito que sim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas afinal, o que está causando esse antagonismo, essas divergências?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei ao certo. Parece que são opiniões conflitantes, pontos de vista di-ferentes sobre determinados aspectos dos ensinos do Cristo e até mesmo sobre o próprio Cristo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Pensando alto, Constantino comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Os cristãos unidos me interessam muito. Eles crescem mais e mais a cada dia e precisam de uma força que os lidere, os conduza...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco escutava atentamente. Constantino prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero ouvir os líderes. Organize audiências com os principais líderes Cristãos. Quero saber tudo e ver como poderei ajudá-los neste momento.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou convocá-los imediatamente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Tocando no braço de Marco, o imperador reiterou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Faça isso depressa. Meu reinado precisa ser marcado pela união e pela concórdia. Como sempre, agradeço suas úteis informações.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco esboçou sincero sorriso e saiu. Constantino foi até a janela novamente e ficou a pensar. Depois balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou dar um jeito nisso, ah, se vou! </span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-57193300131381328552017-09-18T13:44:00.002-07:002017-09-18T13:44:25.235-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 12 - Constantino Se Preparava</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Constantino se preparava para o encontro que teria com os principais bispos cristãos. Apressado, estava com dois servos à sua volta quando Fausta entrou no quarto, dizendo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Bom dia, meu imperador. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ligeiramente contrariado, respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Bom dia. O que deseja, Fausta?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pedi permissão para vê-lo ontem, mas como não me respondeu vim ao seu encontro assim mesmo. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Há dias não nos vemos. Temos muito que conver-sar, meu senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Hoje não, Fausta. Tenho compromisso importante com seleto corpo de líderes cristãos. Amanhã, quem sabe? Façamos melhor: assim que tiver algum tempo livre, eu aviso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A mulher sentiu o sangue subir e queimar-lhe o rosto, à feição de um fogaréu que se acendesse próximo à pele; procurando manter o controle, disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já faz tempo que tendo tentado conversar a sós com você e nunca está disponível, exceto...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino apenas fitou-a nos olhos, sem responder. Ela ia prosseguir quando Marco entrou informando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Todos já chegaram e o aguardam no grande salão.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O imperador levantou-se de pronto saiu respondendo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ótimo. Vamos, então.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao passar por Fausta, limitou-se a dizer:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mando avisar assim que pudermos conversar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Quando ele deixou a sala, Fausta esmurrou a mesa de madeira e lançou um vaso à parede; não satisfeita, arremessou também uma cadeira, quebrando uma das pernas. Em seguida, saiu como a pensar em voz alta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele nunca tem tempo para mim. Estou cansada disso. Nem eu nem meus filhos temos recebido atenção. Nenhuma! Isso não está certo... Os filhos precisam ficar com o pai...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino entrou no grande salão e ocupou o trono. Durante horas escutou atentamente as argumentações dos bispos cristãos mais intransigentes e dos que seguiam as orientações de Ario<span style="font-size: small;">4</span>, provenientes de diversas regiões do império. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Esforçava-se por entender o ponto fundamental da grande divergência que se instalara no clero de todo o império havia quase seis anos; uma questão que se agravava mais e mais, promovendo uma cisão entre os bispos e seus seguidores, começando a despertar o interesse do povo. A questão ariana tornou-se uma disputa teológica que agitou o mundo romano da época: como conciliar a divindade de Jesus Cristo com o dogma da fé em um único Deus? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ao final, sem alcançar concordância alguma, muito menos compreender a fundo o porquê de tanta controvérsia, Constantino confidenciou à Ósio, um dos bispos em quem mais confiava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Caro Ósio, não consigo compreender por que tanta discordância...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ósio aproximou-se bem dele e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se preocupe, senhor imperador, podemos e devemos resolver isso de maneira definitiva. Os arianos5 estão equivocados... Deus e Jesus são uma única pessoa que escolhe seus representantes na Terra, como o fez com o santo papa, e também concede a autoridade aos governantes, para que conduzam o povo...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino fitou-o por um segundo. Depois, ergueu-se e pediu silêncio à grande assembléia, convocando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meus irmãos, estou aqui há horas a ouvi-los com muita atenção. Compreendo que tenham pontos divergentes, mas para que o Cristianismo cresça e se expanda com força precisam estar unidos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Essas sérias divergências que manifestaram hoje deixam-me profundamente preocupado. E urgente maior união de todos - e o Cristianismo merece isso - inclusive de minha parte, como representante máximo do poder da Terra. E não me furtarei a fazer o melhor pelo bem dos ensinos do Messias.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fez prolongada pausa, caminhando de um lado a outro, depois prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É imperativo que nos reunamos novamente, dessa vez em Nicéia - cidade de fácil acesso a todos - para realizar uma grande reunião de conciliação, de onde sairemos com uma linha única a ser seguida por toda a Igreja. Só que, dessa vez, convocaremos todos os bispos. O que dizem, senhores?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E olhando para o representante do papa Silvestre I, indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O santo padre viria a essa ampla reunião de conciliação?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sem dúvida, meu senhor. Suas intenções são das mais nobres, por que ele se negaria? Ao contrário, estou certo de que incentivará a participação de to-dos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Satisfeito, Constantino concluiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois muito bem, em breve nos encontraremos em Nicéia. Marco se encarregará de confirmar a todos a data exata de nosso encontro. Levantou-se, despediu-se de todos os bispos, um a um, e se retirou, deixando a assembléia em meio ao burburinho geral. Mais tarde, comentava com Marco:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles precisam de alguém com visão de liderança. Alguém que represente a palavra máxima e que defina o rumo a ser seguido por todos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de pensar um pouco, continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou impressionado com a organização que atingiram. Eles possuem uma estrutura hierárquica montada, um corpo eclesiástico bem formado e fun-cionando. A única coisa de que precisam é ...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco fitou o imperador e tentou completar a frase:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Um Deus na Terra? Constantino sorriu e corrigiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Um representante fidedigno de Deus, Marco.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O imperador calou-se, ficou pensativo, depois sorriu novamente ao dizer:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles precisam de um pouco mais de poder. Isso fortalecerá seus ideais e será um excelente motivador a fazê-los unirem-se diante de meus interesses...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Poder?!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso mesmo, Marco. Um pouco de poder os fará mais confiantes. Quero que o encontro não tarde a acontecer. Não posso perder tempo, abrindo possi-bilidades para que alguém use contra mim essa desunião dos cristãos...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Núbio estava colado ao ouvido de Constantino, repetindo-lhe diversas vezes o que queria que ele fizesse, e o primeiro quase lhe repetia as palavras:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Um poder que seja capaz de centralizar todos os interesses da Igreja e que a torne de fato universal: a Igreja Católica Apostólica Romana.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao ouvir a última frase, a entidade das trevas exultou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso mesmo, Constantino! Essa reunião será de suma importância para os nossos interesses. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Queremos todos lá... E aqueles que forem contrários às nossas determinações, destruiremos... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ninguém poderá opor-se à nossa vontade... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ninguém pode opor-se a você, Constantino, o grande imperador de Roma...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A entidade espiritual recalcitrante no mal soltou ruidosa gargalhada, que ecoou por todo o prédio, provocando nos mais sensíveis súbito temor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Nas semanas que se seguiram, Constantino teve diversos encontros com o bispo ortodoxo Ósio, que tentou esclarecer-lhe melhor a natureza teológica das disputas que ameaçavam a unidade da Igreja. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois dessas conversas, mesmo sem compreender a disputa teológica que envolvia a questão ariana, Constantino optou por defender a posição dos ortodoxos, aqueles que acreditavam que Jesus e Deus eram uma só pessoa. Jesus era Deus, e ele, na posição de imperador Romano, teria a autoridade máxima na Terra, concedida por Deus, especi-almente se também fosse um cristão confesso. A questão ariana representava um grande obstáculo à realização da sua idéia de um império universal, que deveria ser alcançado com a ajuda da uniformidade da adoração Divina...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Adentrando o grande salão onde Constantino dialogava com Marco sobre suas deliberações, Ernesto e Angélica, envoltos em luminosas emanações, caminhavam em direção ao trono. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">De imediato, Núbio registrou a mudança sutil ocorrida nas vibrações do ambiente e comentou com Normando e Plínio:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Devemos nos afastar. Há perigo próximo. Fitando o chefe, Normando indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que tipo de perigo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sinto uma vibração suave enchendo pouco a pouco o ambiente. Afastemo-nos agora, para não sermos afetados.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Normando insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como poderíamos ser afetados?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Puxando os dois servidores do mal pela mão, ele respondeu ríspido:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fique quieto, Normando... E sigam-me. Temos de nos afastar deste ambiente. Vocês não sabem que, se uma entidade de luz nos tocar de alguma forma os sentimentos, podemos sucumbir aos seus apelos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Dessa vez foi Plínio quem comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você deve estar exagerando... Não é possível...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Cale-se, idiota. Não tem noção do que está falando. Eu já vi isso acontecer várias vezes, até mesmo com entidades mais poderosas mentalmente do que eu. Presenciei tal situação e vi aquele forte espírito prostrado de joelhos, implorando perdão! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Foi uma cena patética e não admito a menor possibilidade de que um dia isso passe por perto de mim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Os dois visitantes luminosos tudo observavam.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Assim que as entidades das trevas se afastaram, Angélica comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quanto mal ainda causarão! Não podem compreender que o maior mal fazem a si próprios...</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;"> Sabe quem é esse Núbio?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu o conheço, vem há muito tempo lutando contra o Cristianismo. Presenciei muitos cristãos sinceros sofrendo profunda dor, impingida por Núbio e seus seguidores diretos. Ele, por sua vez, apesar de muito independente, responde também a uma entidade ainda mais desenvolvida intelectualmente do que ele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como ficaram assim?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Desenvolveram o conhecimento, mas nada colocaram em prática, e se perderam no orgulho e na vaidade. O amor, essa jóia do coração que tempera e controla nossos desvarios, anda distante de suas almas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ainda assim, em germe eles trazem o amor dentro de si, não é? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Sem dúvida alguma. Essa cena que Núbio descreveu já vi igualmente acontecer muitas vezes, e só é possível graças às sementes de sentimentos elevados que todos os homens trazem no íntimo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Angélica calou-se, pensativa. Ernesto acercou-se de Constantino, acompanhando sua conversa com Marco:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou decidido, Marco. Abafarei a questão ariana e darei poder ao clero. Controlarei a Igreja, você verá.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco não respondeu, ouvindo atentamente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ernesto manteve-se calado por mais algum tempo, depois suspirou fundo e falou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Infelizmente, Angélica, acho que não poderemos fazer mais nada. Constantino está firmemente decidido, totalmente influenciado por Núbio. Ele não só o deixou dominar sua mente, como sente a falta da entidade, quando ela se afasta. Estão permutando energias o tempo todo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E não podemos mesmo fazer nada? Ernesto meditou um pouco, depois respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Faremos uma última tentativa esta noite. Mas Constantino tem seu livre- arbítrio e está optando por deixar que os aspectos que ele tem de combater nesta encarnação, como condição para realizar sua tarefa sobre a Terra, dominem sua personalidade, tomem seu coração e conduzam suas decisões. Está totalmente sob o domínio de Núbio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E o que faremos? Ele tem um papel fundamental a cumprir, auxiliando a fortalecer o Cristianismo e sua expansão, contornando as dissensões e fortale-cendo seus princípios puros e simples! Os éditos de tolerância em relação aos cristãos que ele já publicou e outras ações que já implementou em favor do Evangelho confirmam que caminhava na direção certa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sem dúvida, Angélica. Ele iniciou sua trajetória, mas os riscos que corria eram grandes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não estava preparado o suficiente?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele tinha todas as condições para realizar sua tarefa. Mas, para isso, deveria renunciar a vícios mentais de outrora. Em especial abrir mão da vaidade, e ela fala muito alto ainda na alma de Ferdinando...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que poderemos fazer?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos aguardar para tentar falar com ele durante o sono.<br />- E se não conseguirmos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então, teremos de deixá-lo entregue às conseqüências das próprias decisões.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E quanto ao Cristianismo? Será prejudicado!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Constantino não decide sozinho. A organização eclesiástica que se desenvolveu no contato dos convertidos ao Cristianismo com as estruturas romanas vem, ao longo das décadas, contaminando de forma negativa a pureza da Boa Nova. Os homens, devido às suas escolhas equivocadas, afastam-se cada vez mais da fonte verdadeira dos ensinos de Jesus.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Como Angélica permanecia calada, ele prosseguiu:<br />- Nada podermos fazer para impedir as intenções de Constantino. Mas tenha certeza, de que outros virão para lutar por trazer o Cristianismo de volta à pureza original. E certamente as trevas poderão retardar, mas não irão impedir que o Cristianismo seja triunfante, afinal.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ouvindo Ernesto, e antevendo a situação dolorosa que se delineava, Angélica indagou, com os olhos rasos de lágrimas e o coração comovido pela situa-ção humana:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas quanta dor a humanidade ainda terá de viver? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tocando-lhe as mãos com amor de pai, Ernesto respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso eu não saberia dizer...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Naquela noite Ernesto tentou despertar o corpo espiritual de Constantino, adormecido sobre seu corpo físico. Mas ele não acordava. A certa altura da delicada operação, Angélica indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que ele não acorda?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vê os fios negros que o ligam às entidades das trevas?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles o estão entorpecendo para que não desperte.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Continuam agindo, ainda que a distância...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim. Eles jamais desistem, uma vez que Constantino lhes elegeu a companhia conscientemente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de muito tempo em prece, Ernesto finalizou suas atividades, convidando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, Angélica, precisamos ir. Não poderemos ajudar agora. Preparemo-nos para prosseguir com o socorro àqueles que se dispuserem a cooperar com Jesus. Ele busca tais servidores, jamais constrangendo alguém a segui-lo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com angústia na voz, Angélica lamentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E Núbio prosseguirá com suas intenções tenebrosas...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não permita que o triste quadro que presenciamos desvie seu coração da serenidade e da confiança em Deus. O Pai tem tudo sob o seu comando. Os dias de ação livre de Núbio estão acabando.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como assim?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele logo viverá nova experiência na Terra, encarnando de novo. Confiemos na Providência Divina. Agora temos de voltar...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E as duas entidades partiram, deixando atrás de si um intenso rastro de luz. </span><br />
<br />
4 Presbítero cristão de Alexandria fundador da doutrina cristã do arianismo.<br />
<br />
5 O arianismo foi a visão cristológica sustentada pelos seguidores de Ario nos primeiros tempos da Igreja primitiva, que negava a consubstancialidade entre Jesus e Deus, que os igualasse, e fazia do Cristo pré-existente uma criatura, embora a primeira e mais excelsa de todas, que encarnara em Jesus de Nazaré.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-29526904575362944252017-09-18T13:34:00.001-07:002017-09-18T13:34:12.180-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 13 - No Verão</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSGxqklH3atUdKXH6owGfTHdL7_WMrihAkKD9-0Bgln-Viqhm11hHoinZmZ7Ce8HVwGbNeOGNfVgme_5oQoSoWv1KboAQqab0k64rtfiEMIWwMSiwZ3D2T3G1NtPUuUEacJvEO6ufYnAQ/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">No verão de 325, em Nicéia, Constantino presidia a primeira conferência mundial dos bispos da igreja cristã . Estavam presentes cerca de 250 bispos de todo o império, além de padres acompanhantes e diáconos.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;"> Foram oferecidas aos bispos as comodidades do sistema de transporte imperial - livre transporte e alojamento de e para o local da conferência - para encorajar o maior número possível de audiência. E o objetivo foi atingido, pois todo o corpo eclesiástico da época compareceu em peso àquele que seria um dos marcos da fundação da Igreja Católica<span style="font-size: small;">6</span>.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O imperador abriu a reunião.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sejam bem-vindos. Como já devem saber, nosso único propósito é resolver disputas internas e fortalecer o Cristianismo, para que ele cresça ainda mais. Todos sabem que há muito venho me esforçando por contribuir com a expansão desta bela religião. Sou cristão e toda a minha família também o é. Desde que comecei a governar, tenho dado atenção especial às questões Cristãs. Muitas vezes temos deparado com opiniões divergentes e temos de saná-las, para o bem geral. Esse é nosso objetivo aqui, e para alcançá-lo vamos ouvir a todos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um dos bispos que seguia a visão ariana de que Jesus era um enviado de Deus, mas de natureza exclusivamente humana, falou baixinho ao colega a seu lado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Será que ele está de fato bem intencionado? Sinto algo suspeito...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O outro respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Será? Ele tem dado boas contribuições para o Cristianismo. Veja o Edito de Constantino. Com ele, o domingo ficou definido como o dia de adoração a Deus. Recorda-se de como estava difícil essa definição? A ala judaica queria o sábado, e os romanos preferiam o domingo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Lembro bem como estava ficando confuso. Mas igualmente não esqueci outros comentários que escutei sobre a escolha do domingo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que tipo de comentários?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Parece que foi escolhido também porque é o dia do sol, do culto do Sol Invictus, celebrado pelos romanos. Por isso desconfio das reais intenções de Constantino e não me sinto totalmente convencido.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O outro se calou, pensativo. Os discursos começaram. Os primeiros a argumentar foram os defensores da questão ariana. A princípio teve a palavra o próprio Ário, seguido de seus discípulos mais devotados, Eusébio da Nicomédia e Eusébio de Cesaréia. Depois de eloqüente e entusiasmada exposição dos arianos, foi a vez dos ortodoxos.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;"> Vários deles falaram, especialmente Atanásio, diácono novo e companheiro de Alexandre, de Alexandria, lutador vigoroso contra os arianos; depois Eustáquio de Antióquia e Macário, de Jerusalém. Não obstante, muito antes de terminarem as discussões, Constantino tinha tomado todas as decisões concernentes àquele encontro. Dali sairia a forte Igreja, comandada indiretamente por ele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Esgotados os debates, Constantino propôs uma votação. E todos foram a favor da posição ortodoxa, com exceção de Ário, Eusébio e Eusébio de Cesareia. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">A sentença para os perdedores foi dramática: os três foram exilados, as obras de Ário condenadas à fogueira e todos aqueles que porventura as possuíssem seriam mortos. O direito à liberdade intelectual foi vencido pela exigência de conformidade espiritual da parte dos membros da Igreja à extensa e crescente organização eclesiástica. O Estado romano concedeu às deliberações daquele corpo eclesiástico o poder imperial.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Por fim, afastada em definitivo a ameaçadora questão ariana, os participantes estabeleceram a profissão de fé: os vinte cânones que deveriam nortear a Igreja a partir daquela data. Nascia, assim, a Igreja Católica Apostólica Romana. Roma tomou posse do Cristianismo e subjugou-o para usá-lo a seu favor, com a anuência do corpo eclesiástico.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao final, o imperador decretou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Os que resistirem ao divino juízo deste sínodo podem preparar-se para um exílio imediato.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de seis anos de disputa, coube às decisões do Concilio de Nicéia manter e perpetuar a unidade da fé. Os éditos posteriores de Constantino visa-vam infundir em seus súditos a aversão pelos arianos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A reunião foi encerrada. Um a um os presentes foram deixando o grande salão, que ficou frio e vazio. Constantino, que permaneceu por longo tempo em seu trono, sentiu calafrios a lhe percorrerem o corpo. Obtivera o que desejava, mas por alguma razão que desconhecia não se sentia feliz. Algo o incomodava. Ao seu lado, Núbio gargalhava satisfeito. Ele, sim, sentia satisfação total pelos objetivos atingidos. Naquela noite tinha consigo uma legião, e ria afirmando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Venceremos o Nazareno! Vocês podem acreditar em mim. Vejam a nossa vitória! De hoje em diante, afundaremos o Cristianismo em dogmas e mais dogmas. Ele jamais se erguerá de novo!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E continuava gargalhando espalhafatoso, admirado pelos seus seguidores. </span><br />
<br />
6 Católico quer dizer, em sua acepção etimológica, universal.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-17204624848646328402017-09-18T13:28:00.002-07:002017-09-18T13:28:44.482-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 14 - Não Demorou</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhq8L1T3XZLFCg62kIgx76UhkPY_jdgHZ1lt_tWyssnICPcss2IaJtcyNnHcgRdnDULcbD9mihDw46xXDfsZNRlphlZeRKs-iNzlUFzboPYo-sFVbSPOHsySit3KfCV9zrB6vHKomK9w0E/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhq8L1T3XZLFCg62kIgx76UhkPY_jdgHZ1lt_tWyssnICPcss2IaJtcyNnHcgRdnDULcbD9mihDw46xXDfsZNRlphlZeRKs-iNzlUFzboPYo-sFVbSPOHsySit3KfCV9zrB6vHKomK9w0E/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não demorou para que a notícia chegasse aos ouvidos de Constância, que, acamada, recebeu-a com indizível sofrimento:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que me diz, Helena? Tem certeza de que isso é verdade?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Infelizmente sim, senhora.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não é possível! Meu irmão não está agindo corretamente... Ele deveria tentar compreender melhor o que se passa junto aos cristãos, e não simplesmente admitir que dogmas e regras estranhos aos ensinos do Mestre sejam inseridos com essa naturalidade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Calou-se momentaneamente. Observou o céu pela janela e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Abra um pouco a janela, Helena, que o ar está me faltando. Depois de atender sua senhora, Helena voltou e sentou-se outra vez ao seu lado. Constância suspirou profundamente e disse quase num gemido:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Ai, meu Deus...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Assustada, Helena indagou solícita:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se sente bem? Quer que eu chame alguém?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fez menção de erguer-se, mas Constância segurou-lhe o braço:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, minha filha, não precisa. Estou profundamente entristecida. Sei que meu irmão está equivocado e se entrega cada vez mais a um fundo abismo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Olhando-a com ternura, Helena admoestou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A senhora precisa reagir! Desde que Licínio partiu a tristeza instalou-se em seu olhar, em sua voz, em seu coração. É necessário que se reequilibre, minha senhora. Temos muito trabalho na seara de Jesus.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com os olhos rasos de lágrimas que logo lhe desciam pela face, ela esboçou ligeiro sorriso, dizendo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Querida Helena, tem toda a razão. Sei que nossas tarefas são extensas e que muitos dependem de nosso trabalho... Mas os golpes têm sido duros...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem responder, Helena segurou firme as mãos de Constância e apertou-as carinhosamente entre as suas. A segunda prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E agora, mais esse golpe que tanto me entristece... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Vejo com grande receio as mudanças que Constantino está impondo aos ensinos Cristãos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Temo pelo futuro daqueles que terão somente esses ensinos deturpados que começam a tomar consistência em nosso meio; e agora, ainda mais, sancionados pelo próprio imperador... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">E os bispos, os presbíteros, como podem aceitar tamanha invasão do poder romano?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acho que até estão contentes... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Mas por quê? Não entendo... Inspirada por Angélica, Helena respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muitos haverão de se levantar para lembrar aos cristãos as verdadeiras lições de Jesus. Não se preocupe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Reconhecendo o tom profético das palavras da serva e amiga, Constância indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que está querendo dizer?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que não podemos desanimar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas estão calando Ário e seus seguidores, estão calando a verdade...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não importa. Alguns poderão se calar, mas outros se levantarão e a verdade prevalecerá! Temos de confiar em Deus e fazer a nossa parte! A verdade nunca ficará sufocada, por mais que o tentem. Ela prevalecerá!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com o corpo enfraquecido pelos sucessivos golpes emocionais que sofrerá, Constância acomodou-se no travesseiro e suspirou, depois de breve pausa:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ah, minha querida Helena, estou cansada. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Sinto-me só; tenho apenas você e meu filho; dói-me a saudade de Licínio, assim como me magoam a dis-tância e a indiferença de Constantino; mais ainda, seus desmandos e suas decisões equivocadas com relação ao nosso Mestre. Ele age como se quisesse agradar aos cristãos, mas está traindo Jesus, e não sei por que faz isso...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Não conseguiu prosseguir. Envolvida pela dor, entregou-se a convulsivo pranto. Helena trouxe-lhe água e avisou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou preparar-lhe um chá para que se acalme, senhora. Não pode continuar a se martirizar assim.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Seu corpo está cada vez mais fraco e temo seriamente pela sua saúde... Agora tente descansar, eu já volto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sendo tarde da noite e preocupada com a situação de Constância, a serva logo providenciou a bebida calmante, e sugeriu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tente dormir agora. O chá deverá ajudar, procure descansar. Arrumando as cobertas sobre a cama, voltou-se para a dama da alta sociedade romana e perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quer que eu fique aqui fazendo-lhe companhia?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, querida, estou bem. Vá se deitar. Você tem se dedicado muito e também deve descansar. Não insista, por favor. Eu realmente preciso ficar so-zinha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Percebendo que seria inútil insistir, Helena foi para seu quarto, ao lado do de Constância, e ajoelhando-se ante o leito suplicou a Jesus ajuda e amparo, entristecida pelos rumos que Constantino imprimia ao movimento dos cristãos. Depois, sentindo-se suavemente confortada, deitou-se e adormeceu. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Logo seu corpo espiritual despertou e viu Angélica, que a convidou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Temos trabalho a fazer, venha. Constância precisa de toda a nossa ajuda. Ambas foram até o quarto da irmã de Constantino, ainda em dificuldade para repousar, com um sono leve e angustiado. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Estenderam as mãos sobre o seu corpo, e após uma transferência abundante de energia ela se acalmou e adormeceu pesadamente. Logo o corpo espiritual de Constância pairava, em repouso, sobre seu corpo físico. Carinhosamente Angélica a chamou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Constância, somos nós, seus amigos, que aqui estamos e precisamos falar-lhe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Aos poucos, Constância em espírito, ganhou lucidez:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não me sinto bem... Estou fraca. Amparando-a, Angélica aconselhou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tome este copo de água e espere um pouco. Deverá auxiliar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Minutos depois de sorver toda a água, Constância parecia um pouco mais fortalecida; fitando as amigas disse, entre lágrimas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É bom vê-las... Estou precisando de ajuda... Enlaçando-a com ternura de mãe, Angélica afirmou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por isso estamos aqui, para ajudá-la. Venha conosco.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Para onde vamos? Vão me levar embora? Está na hora de deixar o corpo físico?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, querida, ainda não. Tem muito trabalho a fazer e sua presença na Terra é por ora indispensável. Os cristãos precisam que lhes infunda fé e esperança para ajudá-los a não esquecer o belo e simples Evangelho de Jesus. Va-mos buscar auxílio para fortalecê-la na seqüência de sua tarefa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Segurando Constância pela mão, em alguns minutos estavam diante de um belíssimo vale, cheio de lindas flores, pássaros voando por toda parte e lindos animais correndo de um lado a outro em meio à vegetação. Seguiram por um caminho cercado de árvores frondosas. Mais adiante, surgia uma cidade luminosa, e melodiosa música soava pelo ar. À medida que ouvia a música e sentia as suaves e harmoniosas vibrações do ambiente, Constância sentia-se mais forte. Angélica indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sabe onde estamos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não me lembro. Sei que conheço este lugar, ele me é tão familiar... Contudo, não consigo lembrar.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;"> Só sei que me sinto muito bem aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Este é o seu lar, Constância.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A dama romana fitou-a, buscando na memória aquilo que Angélica lhe dizia, e por fim sorriu feliz como há muito não fazia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E claro! Meu lar... Como poderia esquecer tão abençoada morada espiritual?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Caminharam animadas. Constância, recordando-se cada vez mais de seu lugar de origem, recobrava mais e mais as energias. Chegaram em uma casa simpática, rodeada por lindos jardins. A construção era sóbria e ampla, com varandas circundando-a. Assim que se aproximaram, uma simpática senhora apareceu na porta e saudou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que alegria, Constância chegou!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Foram recebidas na bela residência, cujo interior também era adornado com objetos de arte de suave beleza. Constância reconhecia cada objeto, cada quadro, cada móvel, lembrando-se com clareza de sua antiga casa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sentaram-se, acolhidas por amigos devotados. A conversa corria animada quando Ernesto chegou, feliz, e abraçando a visitante falou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que bom que conseguiram trazê-la hoje. Há dias estamos tentando, mas seu estado físico não permitia; foi preciso fortalecê-la primeiro.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Enquanto conversavam, música sublime ecoava pelos ares. Aquele mundo elevado e belo era o lar de origem de Constância. A palestra continuou por longo tempo, e Ernesto ia relembrando a trabalhadora da Terra de seus compromissos e desejos antes de retomar o corpo físico que ora ocupava no planeta. Com a memória aclarada ela disse, ao final:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou envergonhada, Ernesto. Como pude deixar-me abater tanto?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se sinta envergonhada, Constância. O torpor do esquecimento que nos domina no orbe representa grande desafio e acentuado perigo. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Disso, todos sabemos. Mesmo com seu nível de elevação e consciência, estar mergulhada no corpo denso da Terra envolve riscos. Por isso, estamos aqui para ajudar. Reavivar suas lembranças fez-se imperioso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Levantando-se, ela disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agora que me recordo vivamente de tudo, estou pronta para retornar. Mais do que nunca, os compromissos que me levaram ao planeta chamam por mim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Comovida, ela disse, fitando seus mais doces afetos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agradeço-lhes por não me abandonarem nunca, mesmo nos meus momentos de fraqueza. Muito obrigada. Agora, preciso retornar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Helena e Angélica acercaram-se dela, e a segunda disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois então vamos, que o dia está prestes a raiar na Terra. Abraçando os amigos um a um, Constância se despediu e partiu com as companheiras. Assim que retornaram, ela acomodou-se sobre seu corpo físico. Olhando com carinho aquelas que eram suas irmãs de longas ca-minhadas sobre a Terra em outros tempos, comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O adensamento da matéria chega a ser doloroso, porém não vou mais fraquejar. Estou aqui para trabalhar e é isso o que vou fazer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Após abraçar as duas com carinho, ajustou-se melhor ao corpo físico. As outras impuseram-lhe novamente as mãos, envolvendo-a em intensa transfusão de energias. Logo o dia amanheceu e raios de sol entravam pelas venezianas da ampla janela.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância despertou, sentou-se na cama e relembrou aquela experiência maravilhosa que poderia ser tomada por um sonho. Então balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É claro que não foi um sonho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes que terminasse, Helena entrou no aposento e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como se sente, senhora?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constância levantou-se e abraçou Helena com ternura, sorrindo ao dizer:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ora, minha irmã, não me chame de senhora nunca mais... Sua humildade me comove.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Helena, que também mantinha total lembrança da vivência espiritual que ambas haviam partilhado, sorriu e disse, limpando as lágrimas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como Jesus é bom! Sempre nos envia ajuda...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A partir daí Constância entregou-se ao trabalho pelo Evangelho de maneira incansável. Esforçou-se por esquecer as próprias dores e inquietações e lan-çou-se ao serviço em favor dos necessitados. Sua primeira atitude foi procurar alguns amigos mais próximos e propor-lhes:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não me sinto bem na igreja de Tessalônica. Se isso já não acontecia antes, agora não consigo ficar lá dentro. Não reconheço os ensinos de Jesus nas palavras do bispo; elas me soam vazias.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sinto da mesma forma - concordou Helena.<br />- Então vamos começar nossa própria Igreja. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Olhando-a com estranheza, Juliano indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Será mesmo o melhor a fazer, mãe? Sem titubear, ela prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, meu filho. Além do mais, não posso aceitar o fato de que estarmos proibidos de receber as orientações dos nossos irmãos espirituais. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Isso é de grande importância para podermos saber que decisões tomar nos momentos mais difíceis, ou diante de um grande desafio. Mas estamos proibidos... É lamentável, e precisamos adotar uma atitude firme.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mãe, você sabe que, por ordem de Constantino, qualquer um que ensine de modo diferente dos dogmas definidos em Nicéia poderá pagar até com a morte!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos confiar em Deus e fazer nossa parte. Se isso tiver de ocorrer, é porque é necessário. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Olhando para Helena, perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que acha, amiga?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Temos como fazer. Muitos de nossos irmãos aguardam essa oportunidade, pois estão igualmente insatisfeitos com os rumos que a Igreja vem tomando.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois então, está decidido. Vou encontrar um bom lugar e aviso a todos. Não quero mais perder tempo. Em uma semana um pequeno grupo de doze pessoas chegava para a primeira reunião. Recebidos por Helena, foram se acomodando. Eliseu indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Onde está Constância? Ela não vem?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já deve estar chegando. E nos traz uma grata surpresa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que surpresa será essa? - Eliseu estava curioso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles logo estarão aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eles? Então se trata de uma pessoa?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes que Helena pudesse responder, Constância apareceu à porta; sorridente, falou enquanto entrava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que a paz de Jesus envolva a todos. Trouxe uma surpresa... Assim que ela entrou, viu-se no vão da porta a figura suave de Ário, que entrou em seguida e também cumprimentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que a paz de Jesus esteja conosco, irmãos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Doces emoções envolveram os presentes. Ário cumprimentou um por um, osculando-lhes as mãos com genuína humildade. Depois, sentou-se ao lado de Constância, na frente da sala, diante de todos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ela ergueu-se e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meus irmãos, boa noite. É com muita alegria que estamos aqui nesta noite para iniciar uma nova Casa de Jesus. Neste lar nos encontraremos para orar e estudar o Evangelho, bem como compartilhar os desafios da jornada terrena. Vamos também ouvir nossos irmãos espirituais, como temos feito desde que Jesus voltou ao seu lar luminoso nas dimensões mais elevadas. E é aqui que receberemos, ainda, todos aqueles que necessitem de socorro e amparo, sejam de caráter material ou espiritual. Para dar início às nossas modestas atividades, convidamos o bispo Ário para estar conosco. E ele, gentilmente, aceitou. A ele solicitamos, então, que faça a prece de abertura, dando por iniciada nossa reunião...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O bispo Ário, coberto por suaves luzes que desciam sobre ele e depois se expandiam para todo o grupo, pronunciou fervorosa oração, rogando as bênçãos do Mais Alto para aquela tarefa que se iniciava na seara de Jesus. A comoção tomou conta de todos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não tardou e a doce Angélica se materializou entre eles, diante dos olhos dos presentes. Dela emanava intensa luz cumprimentou a todos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meus irmãos amados, nós, do plano espiritual, estamos felizes pela iniciativa a que estão se dedicando. E para nós motivo de grande júbilo. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Manter acesa sobre a Terra a chama do amor ao próximo, da humildade, da sinceridade de propósitos e do esforço de auto aperfeiçoamento é o caminho para preservarmos a pureza dos ensinos do Evangelho do Mestre Jesus. Abracem este propósito com determinação, pois muitos serão os obstáculos que enfrentarão. Não desanimem, estaremos sempre com vocês. Várias outras entidades espirituais podiam ser vistas pelos presentes, emitindo muita luz, que agora banhava toda a pequena sala onde se abrigava o grupo. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Os trabalhadores do espaço, vindos em nome de Jesus, impunham as mãos sobre os encarnados e lhes infundiam energias físicas e perispirituais, enchendo-os de esperança e confiança. Depois, foram desaparecendo, um a um. Por fim, Angélica se despediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Permaneçam ligados aos ensinamentos de Jesus, não apenas conversando sobre eles, mas, como fiéis servidores do Mestre, seguindo seus exemplos na vida de cada dia. Fiquem em paz.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois que Angélica desmaterializou-se, Constância e Ário continuavam a vê-la, agora no plano espiritual. Ele fez sinal para que Constância assumisse novamente, mas ela, dominada pela emoção, pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso... Poderia conduzir a reunião de hoje, for favor? Ário levantou-se e falou, sob forte envolvimento espiritual, das belezas do mundo espiritual evoluído, e da maravilha que representava para todos os homens a possibilidade de estarem em constante contato com os espíritos, para serem por eles orientados e dirigidos. Lembrou, ainda, que outros tipos de espíritos rondam os homens e que estar com Jesus sempre é fundamental para a defesa contra sua influência. Concluiu a bela explanação lembrando as palavras de Jesus:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- "Quem não é por nós, é contra nós." Sigamos Jesus com todo o nosso coração. Estejamos dispostos a viver seus ensinos e a seguir-lhe os exemplos. Ele estará sempre conosco, conforme prometeu, "até a consumação dos séculos".</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de encerrada a reunião, permaneceram ainda longo tempo em elevada conversação, escutando de Ário as informações sobre os últimos acontecimentos de Nicéia e a iminente realidade de seu exílio. Ele os orientou sobre diversas atividades que passariam a executar na Casa e sugeriu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Façam desta mais uma Casa do Caminho e recebam todos os necessitados na luta terrena.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes de sair, entregou vários de seus textos a Constância, dizendo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eis aqui os pergaminhos que me solicitou. São diversos textos que grafei sobre o que tenho aprendido e refletido sobre o Evangelho, sobre Jesus e sobre a natureza do Mestre. Tenham cuidado, pois Constantino proibiu que sejam lidos.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tenho apenas esta cópia e mais uma, que está devidamente guardada. Façam bom uso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Segurando os textos com cuidado, Constância respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos cuidar muito bem, querido amigo. Muito obrigada pela sua presença entre nós nesta noite e pelos seus ensinamentos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Olhando-a com ternura, ele se dirigiu a todos: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Queridos irmãos, não se desviem da simplicidade do Evangelho. Meus dias na Terra terminarão em breve. Fortaleçam-se no estudo, na oração e no trabalho em favor do bem comum. Amem-se uns aos outros e ensinem o Evangelho com o exemplo de suas vidas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Despediram-se com um abraço, retornando todos aos seus lares. A pequena casa brilhava com grande intensidade, e embora não pudesse ser registrado pelos homens da Terra, seu brilho era visível do espaço. Da colônia espiritual em que se encontrava, Ernesto vibrou de alegria:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mais um ponto de luz sobre a Terra! Graças a Deus! Enquanto tantas luzes se apagam rapidamente, algumas se acendem e outras lutam por brilhar apesar dos desmandos eclesiásticos. Que Jesus nos abençoe e ajude!</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-67301394202586167002017-09-17T16:05:00.003-07:002017-09-17T16:05:35.626-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 15 - Com O Poder Imperial</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Com o poder Imperial recebido, o corpo eclesiástico dos bispos ortodoxos ganhou grande força. Aqueles que não aceitavam as novas orientações e insis-tiam em seguir as idéias de Ário eram perseguidos, humilhados, exilados. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Todas as obras escritas por ele que encontraram foram queimadas, inclusive as do próprio Ário. A única que restou foi a que estava em poder de Constância, que foi poupada pelo imperador. Ele fez vistas grossas às reuniões que a irmã liderava. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quando o bispo Ósio lhe cobrava uma atitude, argumentava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que se incomodam tanto? O que faz Constância de mal? Aquela pequena casa recebe doentes e pessoas famintas e tornou-se a razão de viver de minha irmã; não quero que a impeçam.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Deixem-na viver. Ela já sofreu demais; não quero que a aborreçam.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Osio se irritava com a atitude do imperador, e não obstante usasse todos os argumentos de que dispunha, não conseguiu mover em nada as disposições de Constantino que, ao contrário, de quando em quando visitava a Casa do Caminho que a irmã coordenava, deixando-a profundamente feliz.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Por outro lado, Fausta enchia-se cada vez mais de mágoa e ressentimento pelo marido, e envolvida por Licínio, que não a deixava um só minuto, alimentando-se das energias deletérias que o ódio dela gerava, sentia seu rancor aumentar a cada dia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Naquela manhã ela fazia o desjejum em companhia do marido, determinada a falar-lhe da necessidade de dar maior atenção aos filhos, quando Crispus entrou na sala, satisfeito, informando: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Pai, acabamos de fechar uma fantástica negociação com os persas e compramos uma frota de navios inteiramente nova. Vão entregá-la em cerca de um ano, e poderei acompanhar pessoalmente o acabamento das naus. Era isso que você queria?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Satisfeito, Constantino convidou-o:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, era isso mesmo. Agora venha, sente-se ao meu lado para um desjejum conosco.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu já tomei...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então não me prive da sua companhia. Venha, sente-se ao meu lado, meu filho. Estou orgulhoso! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Você me lembra a mim mesmo, na sua idade...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fausta tinha os olhos falseando de ódio, e naquele momento decidiu, incentivada por Licínio, que tomaria uma atitude firme contra o jovem, ou ele teria toda a atenção do imperador e seria seu sucessor natural. Ela não poderia deixar isso acontecer. Licínio lhe soprava ao ouvido:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Um de seus filhos deve ser o sucessor de Constantino, e não esse Crispus, arrogante como o pai.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Inconformada e profundamente irritada, ela não se conteve. Erguendo-se, olhou para o imperador e comunicou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Preciso sair agora, meu senhor. Ele, surpreso, comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas ainda não terminou de comer, e disse que queria falar-me.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O apetite me deixou, e igualmente o ânimo de conversar. Não me sinto bem, preciso retirar-me, com o seu consentimento, senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você o tem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E permaneceram os dois em longa conversação de teor militar. Já em seus aposentos Fausta desatou, colérica, a gritar impropérios contra o imperador; chegou mesmo a assustar sua serviçal, acostumada a suas crises de raiva constantes. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois de esbravejar, atirar objetos e se descabelar no acesso de raiva, sentou-se diante do espelho e observou-se exausta. Licínio, satisfeito pelos resultados que obtinha, insistia tenaz nas provocações. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Aproveitando o momento de aparente calmaria, aproximou-se e sussurrou-lhe:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você está ficando velha. Seus filhos estão crescendo e, se não tomar uma atitude agora, acabará por perder o marido e seus filhos ficarão sem o trono. Olhe para você. Acha que ele não vai trocá-la em breve por uma mulher mais jovem e bela, como fez ao deixar a primeira esposa por você? Preste atenção. Você precisa fazer alguma coisa, e logo. Acabe com Crispus! Tire-o de seu caminho o quanto antes. Não perca mais tempo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Totalmente envolvida pelas sugestões de Licínio, que tomava por suas, ergueu-se resoluta.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- É isso mesmo. Chega de gritos e choro. Vou tomar a atitude que já deveria ter tomado! Vou afastar Crispus de meu caminho, ah, se vou!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Parando por um instante, pensou em voz alta: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Mas como o farei? Outra vez Licínio sussurrou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se preocupe. Tenho um plano perfeito para você destruir o pai e o filho ao mesmo tempo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela acatou de imediato a sugestão.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Logo terei uma idéia brilhante para acabar com os dois... Licínio, sorrindo sarcasticamente, murmurou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como é estúpida e fraca...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Dias depois, Constantino embarcava com Crispus para acompanhar de perto a construção das naus. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Nutria profunda admiração e grande paixão pelo mar e por forças bélicas marítimas. Apreciava as armadas gigantescas, com seus aparatos bélicos e suas velas enormes, pesadas; tudo isso o fascinava.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O imperador caminhava animado pelo corredor do imenso palácio de Bizâncio, quando Fausta o chamou, desejando despedir-se do esposo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então está de partida, meu senhor?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já havia mandado lhe avisar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu sei. Estou aqui para despedir-me e desejar-lhe uma viagem segura.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu terei, obrigado.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Aproximando-se mais do esposo, ela sussurrou-lhe:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenha cuidado, meu senhor, muitos olhos o espreitam, intentando destruir-lhe a paz e a alegria. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">São seus inimigos mesmo aqueles que comem com o senhor!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Assustado, o imperador afastou-se um pouco e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que diz? Ela insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Peço-lhe tão-somente que tenha cuidado. Aqueles em quem confia poderão traí-lo, meu imperador...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Segurando-a pelo braço com firmeza, ele indagou novamente, perturbado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Explique o que está tentando dizer. Fale de uma vez! O que está insinuando? Sabe alguma coisa? O quê?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Muito suave e simulando preocupação, ela comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Os servos dizem muitas coisas por estes corredores, senhor. O vaivém de informações é incessante... Diz-se que Crispus alardeia aos ventos que deseja sucedê-lo no trono do império romano.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Fala-se mesmo que já está preparado para tal, quando a hora chegar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fitando-a incrédulo, ele comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E ele será, sem dúvida, meu sucessor. Que tem isso? - Nada, meu senhor, se ele não dissesse também que sabe mais que o imperador e fará melhor governo do que vossa majestade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Imediatamente o sangue sumiu do rosto de Constantino. Velhos medos, resquício das antigas disputas vividas, acenderam-se-lhe na alma e inexprimível angústia apossou-se dele. De imediato, Licínio percebeu-lhe a reação e viu que as palavras da consorte lhe haviam ateado fogo ao coração. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Então cochichou aos seus ouvidos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele quer tomar-lhe o trono, é isso o que deseja. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Vai fazer de tudo para usurpar-lhe o poder. É seu inimigo e está prestes a traí-lo. Prepara um grande complô para tirá-lo do trono.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Esforçando-se ao máximo para controlar seus impulsos, Constantino enfim respondeu a Fausta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Assim que regressarmos iremos todos a Roma para celebrar os vinte anos de meu reinado, de meu domínio, de meu poder.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, meu senhor, sei que se prepara em Roma uma grande festa a ser dada em sua honrosa homenagem.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Deseja que eu vá até lá para acompanhar os preparativos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não vejo necessidade, apenas esteja pronta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Posso ir, se desejar, meu senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois então vá, Fausta, e esteja certa de que tudo, absolutamente tudo, esteja perfeito. Ao retornar, logo irei para Roma.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Farei o melhor ao meu alcance... Afinal, são vinte anos de glória que precisam ser celebrados!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Despediram-se. Marco, que ouvira a conversa a meia-distância, aproximou-se do imperador e comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acha que ela falou a verdade?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Algo me diz que é possível. Vamos ficar atentos.<br />- Não creio que Crispus seja capaz de uma traição dessas, senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meu caro Marco, sua lealdade e sua pureza o impedem de enxergar com clareza a alma humana, não é mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco se manteve calado e Constantino prosseguiu, instigado pelas palavras de Licínio, que permanecia ao seu redor, repetindo-lhe impropérios sobre o filho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Todo homem é capaz de tudo pelo poder. Crispus já me tem chamado a atenção há muito tempo, tentando sempre se igualar a mim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas ele é seu filho; cresceu bem perto, assistindo à sua trajetória; é natural que nutra admiração pelo pai e que deseje imitá-lo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fitando o amigo, ele quase se deixou envolver por suas palavras, mas Licínio argumentou: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Marco é ingênuo demais e sua submissão o impede de enxergar com clareza; não é um bom juiz para esse assunto. Melhor nem discutir com ele, pois nada poderá auxiliar nesta questão.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino calou-se por longo tempo. Quando afinal estavam perto da embarcação que utilizariam para chegar ao porto, onde eram construídas as naus romanas, disse a Marco:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não comente nada com ninguém sobre o que conversamos no caminho. Fique de olhos e ouvidos bem abertos e, ao menor sinal, me avise. Farei o mesmo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, meu senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Entraram. Durante toda a viagem, Licínio buscou oportunidades de confundir as situações e, ligado à mente de Constantino, fazia-o enxergar distorcidos todos os fatos. Assim, qualquer gesto do filho ele interpretava por provocação; começou a instalar-se um sentimento de irritação recíproca entre Cons-tantino e Crispus, sem motivo aparente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">A irritação passou depressa à fúria, e antes de atracarem no porto de destino os dois tiveram exasperada discussão e Constantino decidiu retornar. Ofendido, Crispus não podia compreender o que se passava com o pai, que de uma hora para a outra passou a tratá-lo com desconfiança e azedume, como se ele o houvesse ofendido seriamente. Licínio vibrava.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Conseguira mais um sucesso contra o inimigo.</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-44940318409150757262017-09-17T15:53:00.003-07:002017-09-17T15:53:49.153-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 16 - Depois Da Discussão</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois da discussão, pai e filho não se falaram mais. Amargurado, Crispus estava decidido a não participar das festividades em Roma. No entanto, Marco, sabedor de sua intenção, procurou-o em segredo e argumentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acho um erro você não ir. Será um momento importante e marcante para seu pai. Mesmo que agora esteja magoado com ele, se for, encontrarão um meio de resolver o problema. Se não for, ele poderá interpretar de modo errado e a distância entre vocês se aprofundará ainda mais.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">O rapaz comentou, aborrecido:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei, Marco. Não posso compreender meu pai. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">O que aconteceu com ele?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco queria contar ao rapaz das suspeitas que o pai acalentava no coração; todavia, como prometera ao imperador que não o faria, limitou-se a de-fender Constantino. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">-Tente aceitar seu pai como é: um general que já realizou muito pelo império e que merece o respeito de todos nós. Se um dia você for o imperador, desejará o mesmo de seus servidores e até de seus filhos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Crispus não respondeu, mas as palavras de Marco calaram-lhe fundo. Marco despediu-se e saiu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pense bem no que eu lhe disse. Crispus balançou a cabeça e respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou pensar.<br /><br />A cidade estava enfeitada para receber o grande e único imperador Romano. Constantino era aclamado pelo povo, e especialmente os cristãos de Roma o aguardavam com verdadeiro sentimento de gratidão. Ele representava a libertação para eles:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"> libertação do medo, da insegurança e da dor. Era a figura que restituíra a tranqüilidade aos lares que tinham o Cristianismo como religião. Devolvera a dignidade e a paz aos seguidores de Cristo e ao clero em geral. Todos o aclamavam como o grande César.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Os festejos transcorriam conforme esperado. Muitas homenagens e apresentações artísticas aconteciam em diversos lugares. Quanto a Constantino, embora usufruísse com entusiasmo aquelas demonstrações de respeito e até de adoração, sentia profunda insatisfação íntima. Licínio não o abandonara e o perturbava dia e noite, insuflando-o contra o filho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Naquela noite o ar estava perfumado com o aroma dos pratos preparados em tributo ao imperador. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Comidas exóticas de regiões distantes e as iguarias prediletas do poderoso César também foram oferecidas. Belas mulheres enfeitavam a festa, usando suas mais lindas vestes. Constantino entrou no grande salão onde todos o aguardavam para o banquete mais importante que marcaria as comemorações. Sentou-se ao lado da esposa, que logo indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está tudo a seu contento, meu senhor?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, tudo perfeito.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela sorriu satisfeita e comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pena que Crispus insista em não o prestigiar. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Todas as autoridades romanas estão aqui, e inclusive os imperadores das regiões vizinhas nos enviaram seus representantes ou vieram pessoalmente. Todos reconhecem seu poderio, menos...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Cale-se, Fausta. Estou ficando cansado de suas provocações.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minhas provocações?!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já basta!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela ia responder, mas observou que Crispus acabava de entrar no grande salão e imediatamente foi notado pelo pai e por aqueles que já sabiam do desentendimento entre os dois. O rapaz se acomodou junto de mais alguns homens, e Fausta aproveitou para dizer:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu ficaria atenta, se fosse o senhor. Ele está com seus homens aqui e outros devem estar lá fora. De certo planeja alguma coisa...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Dessa fez foi Marco quem pediu que ela parasse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agora chega, senhora, deixe que o imperador aproveite a noite especial em sua homenagem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"></span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Interrompida sem esperar, ela se calou, evidentemente contrariada. Ver Crispus adentrar o salão a confundiu e incomodou. Não sabia o que fazer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Era tarde quando o imperador despediu-se de seus convidados e se retirou. Antes, porém, pediu a Marco:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero falar com Crispus. Avise-o que me encontre imediatamente para uma palestra a sós.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco argumentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É tarde, senhor; todos estão muito cansados. Não seria melhor promovermos esse encontro amanhã?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não. Agora.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A voz de Constantino não permitia nenhuma contra-argumentação e Marco obedeceu. Localizou Crispus e logo os dois estavam frente a frente. O rapaz disse, em tom sincero:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vim para homenageá-lo, meu pai. Apesar de nossas diferenças, e antes de tudo, você é meu imperador.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não seja cínico, rapaz. Sei que me deseja ver pelas costas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Do que está falando?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- De seu desejo de ocupar meu lugar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero ser seu sucessor, e isso nunca escondi, mas quando chegar a hora.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que deseja ver abreviada o mais possível, não é mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que está insinuando, meu pai?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que quer ver-me morto. Confesse!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso é uma calúnia das mais absurdas! Quem foi que lhe... Completamente dominado por Licínio, Constantino agarrou o filho pelo pescoço e insistia:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Confesse, confesse seu desejo de matar-me! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Assustado, o rapaz pedia:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pare, pai, por favor! O que está fazendo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E Constantino, sem medir a força que colocava nos braços, continuava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, confesse seu desejo descontrolado de usurpar-me o poder. Eu sei de tudo, Fausta abriu-me os olhos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Pai... Por favor...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A voz de Crispus já quase não lhe saía da garganta.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;"> - Ninguém me tirará o que conquistei, está entendendo? Este império é meu! Eu o conquistei pedaço por pedaço e ele me pertence! Só a mim...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem conseguir respirar, o rapaz desfalecia pouco a pouco e disse, num esforço derradeiro:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ela... o ... envenenou... contra... mim...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio, às gargalhadas, observava o pai consumar o ato homicida. Crispus desfaleceu e Constantino abandonou-o ao chão, ao mesmo tempo em que o olhava aterrado pelo que acabara de fazer. As últimas palavras do filho lhe suscitaram de imediato à lembrança a conversa que tivera com Fausta antes da viagem à Pérsia. Teria sido enganado por ela? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Observou o filho sem respirar e gritou, sentindo profunda dor no peito:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que foi que eu fiz?!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Marco entrou depressa na sala, constatando o que ocorrera.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Rapidamente tirou o imperador dali e levou-o para seus aposentos. Constantino estava alterado e Marco tentava acalmá-lo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não foi sua culpa, não é mesmo? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ele tentava agredi-lo, não foi assim?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Claro, foi isso. Foi assim que aconteceu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois então, acalme-se. O senhor é o imperador de Roma! Constantino sentou-se na cama, respirou fundo por três vezes, depois repetiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, eu sou o imperador de Roma. Eu sou o imperador. Eu sou...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Logo outros pediam notícia sobre o ocorrido e Marco limitou-se a dizer que o imperador se defendera da agressão do filho, que queria usurpar-lhe o trono.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Enquanto tentava acalmar-se, Constantino escutava com nitidez a derradeira afirmação do filho - "ela o envenenou contra mim..." -, que se repetia sem cessar. Sentia-se duplamente traído, pela esposa e por si mesmo, sem ter forças para reagir. Buscou algum consolo na bebida, mas antes que as festividades terminassem procurou por Fausta e uma serva lhe informou, desviando os olhos:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está nas termas, senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Constantino a encontrou cercada por suas serviçais e pediu que os deixassem a sós.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que prazer vê-lo, meu senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que você fez, Fausta?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como assim?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que me colocou contra meu filho?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ora, senhor, apenas quis proteger-lhe os interesses.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Os seus interesses, você quer dizer, não é mesmo?</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;"> Assustada com a expressão do olhar de Constantino, ela começou a gritar: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Claro que não, meu senhor, dos seus...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes que pudesse dizer mais alguma coisa ele a afundou na banheira, tirando-lhe a vida.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Licínio, que a tudo assistia, gargalhava satisfeito, quando Núbio apareceu, indagando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está satisfeito? Executou sua vingança?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ainda não. Este homem não sofreu o suficiente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tem de morrer também; vou acabar com ele...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não. Sua missão acabou.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como assim?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Constantino serve agora aos nossos interesses. O Cristianismo está conspurcado e se afasta mais e mais de suas raízes. Constantino vai continuar nos dando seu apoio. E útil demais para agirmos contra ele agora. Mas não se preocupe. Os dias dele na Terra findarão, mais cedo ou mais tarde, e você poderá ter sua vingança completa quando ele também estiver aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como saberei que não me enganam?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você é nosso servo, Licínio, e fará o que estou ordenando. Utilizando a força mental, Núbio provocou em Licínio fortes dores no peito, no lugar onde fora atacado por Marco. E ele, gritando, suplicou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, pare com isso!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vai obedecer, ou o que terei de fazer?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Obedecerei.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Então ande na linha comigo. Virá a hora de consumar sua vingança. Quando Constantino chegar a este lado, você estará esperando...</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-27898496068547310992017-09-17T14:48:00.004-07:002017-09-17T14:48:54.601-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 17 - República Da Boêmia</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">República da Boêmia<span style="font-size: small;">7</span>, 1404. Enquanto a mãe permanecia deitada, repetindo orações decoradas, a jovem (ainda não completara dezoito anos) sentada à sua cabeceira segurava-lhe as mãos com firmeza. Ao notar as mãos frias da filha, Geórgia balbuciou em voz fraca, quase inaudível:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vá comer alguma coisa... Você está gelada... A jovem fitou-a com ternura e redarguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, mãe, eu estou bem. Com esforço Geórgia insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vá, minha filha, vá comer alguma coisa... Suas mãos estão geladas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É que está muito frio. Está nevando... Num esboço de sorriso, a mãe balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É quase Natal...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Esforçando-se por sorrir, a jovem concordou:<br />- Sim, é quase Natal.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Precisamos rezar nossas novenas em homenagem ao menino Jesus.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Nós já vamos...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Geórgia começou a tossir sem parar, para angústia de Verônica, que a olhava sem saber o que fazer. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Aproximou-se e a ajudou a se sentar. Depois de alguns minutos, acalmou-se a tosse e Verônica observou a mãe, entristecida. Sabia que o estado de saúde de Geórgia era muito grave; há algumas semanas vinha se preparando para o pior. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Por isso mesmo procurava aproveitar cada segundo em companhia da mãe; afastava-se apenas pelo tempo absolutamente necessário. Quando se assegurou de que ela estava bem acomodada, foi buscar uma sopa que fumegava no caldeirão, mantido aceso com pouca lenha. A beira da cama, pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, mãe, tome um pouco de sopa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Só se você me acompanhar, filha. Sorrindo, Verônica concordou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está bem... A senhora não tem jeito, não é? A mãe esboçou um sorriso suave e comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A quem será que você puxou?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Decerto foi a você, minha mãe.<br />- Acha mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E como não? Com quem mais me pareço, se não com você? Além do mais, estamos juntas, só nós duas, há tanto tempo que é natural que nos asse-melhemos...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Calou-se de súbito. Recordava os últimos incidentes em que a mãe estivera envolvida com manifestações sobrenaturais. Geórgia, adivinhando-lhe os pen-samentos, disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha criança, não se preocupe. Venha, sente-se perto de mim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos tomar a sopa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Depois. Agora, precisamos conversar.<br />- Mas, mãe...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Venha, filha, precisamos falar. Não desperdicemos o tempo precioso que nos resta com algo que pouco ou nada nos auxiliará.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você deve se alimentar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já vou comer. Venha, sente-se bem perto de mim. Verônica aproximou-se da mãe, que a abraçou enternecida, aconchegando-a ao peito. Ficaram assim por longo tempo, a permutar profundo carinho. Depois, a mãe olhou a filha nos olhos, pedindo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seja forte, minha filha, e não confie a ninguém os fatos que nos acometem de quando em quando. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ninguém nos compreenderia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mãe, tento entender o que se passa com você, o que acontece quando fica daquela maneira... E não consigo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Também não posso explicar ao certo, mas sei que é algo bom.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você diz coisas estranhas, age de maneira esquisita... Dá receitas, fala coisas como se não fosse você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha filha, se não fosse uma heresia, diria que os céus se manifestam através de mim. E assim que eu penso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mãe, não diga isso nunca mais! Se alguém a escutar...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não temo por mim, que tenho os dias na Terra contados, e sim por você. Não quero que carregue o peso da ser filha de uma bruxa. Por isso me calei, você sabe, e não por aceitar o que me dizem. Sei o que sou e o que sinto. Não sou uma bruxa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E claro que não! Você é a pessoa mais querida...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica não pôde continuar, afogada pela emoção e pelo sentido pranto que lhe brotou da alma. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Amava profundamente a mãe e sabia que logo não a teria mais perto de si.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Geórgia abraçou-a apertado e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Rogarei a Nossa Senhora que me permita vê-la sempre. Se depender de mim, jamais ficarei longe de você. Verônica abraçou a mãe ainda mais forte e ambas choraram enlaçadas. Depois, Geórgia pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, filha, confiemos em Deus, que sabe todas as coisas. Tudo será para o melhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A jovem apenas aquiesceu com a cabeça, mantendo silêncio. Após alguns dias o estado de Geórgia agravou-se. Ela quase não conseguia falar, tendo su-cessivas crises de tosse. Verônica atendia ao seu mínimo sinal de necessidade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Naquela noite, porém, a jovem adormeceu pesadamente aos pés da cama da mãe. Estava exausta pelas consecutivas noites em claro e pelo desgaste emocional de ver-lhe a vida esvair-se pouco a pouco, sem que pudesse ajudá-la. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Buscava sustentar a fé em Deus, aprendida com a voluntariosa Geórgia, que a criara sozinha, afirmando ter o pai morrido quando a menina era muito pequena. A luta para cuidar dela foi grande e consumiu os poucos recursos que ele lhes deixara. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Verônica despertou assustada. A mãe a chamava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Verônica, chegue mais perto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Quase de um salto acercou-se da mãe. Geórgia, com grande esforço, tirou do pescoço um antigo escapulário e depositou-o nas mãos da filha, pedindo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Leve-o sempre consigo. Coloque, vamos. Verônica objetou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, mãe, é a sua proteção...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Coloque, vamos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem energia para seguir argumentando, a jovem obedeceu. Colocou a pequena peça no pescoço e amarrou atrás da cabeça a cordinha que sustentava a medalha com a imagem de Nossa Senhora desenhada.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pronto, mãe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ótimo.,. Quero que você... busque ajuda da irmandade...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, mãe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Prometa. Tem de prometer... que não vai ficar sozinha... à mercê dos horrores da inquisição. Se cismarem com você, filha, é morte certa... E morte na fogueira.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ainda assim, não posso trancar-me em um convento. Não é o que quero para minha vida.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas terá de procurar ajuda... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Seu primo de segundo grau é padre, você sabe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Boris...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso mesmo... Procure a ajuda dele... Você não pode ficar sozinha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas, mãe...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Geórgia teve outra crise de tosse e, quando se acalmou, foi mais assertiva:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Prometa-me!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mãe... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Por favor... - balbuciou quase sem forças. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Comovida, a jovem anuiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está bem, eu prometo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Geórgia suspirou profundamente e, devagar, soltou as mãos da filha. A jovem observou seu semblante sereno e murmurou, entre pesadas lágrimas que lhe desciam pela face:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Descanse, minha mãe. Um dia nos encontraremos... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois apertou com força o escapulário que trazia no peito e, ajoelhando-se diante da cama, chorou sentida e longamente.</span><br />
<br />
7 Boêmia é uma região histórica da Europa Central, ocupando os terços ocidental e médio da atual República Checa.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-91001205600052173582017-09-17T14:14:00.002-07:002017-09-17T14:14:20.121-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 18 - Na Manhã Seguinte</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Na manhã seguinte, assim que os primeiros raios do sol entraram no di-minuto aposento, Verônica se embrulhou nas cobertas de sua cama e saiu à procura dos vizinhos mais próximos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Queria ajuda para as providências necessárias às últimas homenagens a serem prestadas àquela que partia para a grande viagem. Todos, sem exceção, bateram-lhe a porta ao rosto com desculpas as mais descaradas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A jovem resolveu, então, procurar o padre do vilarejo em que viviam, ao norte do antigo reino da Boêmia. Ela e a mãe nutriam temores e prevenções com relação à Igreja Católica, entre outras questões pelos seus métodos de coação e controle do povo.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Desde o ano de 476, quando o império romano do Ocidente caíra após ser invadido por diversos povos bárbaros, a única instituição que não se desintegrara junto com o esfacelamento do império fora a Igreja Católica; pelo contrário, fortalecida, passara a exercer forte influência política e econômica sobre todos os povos da Europa. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Já nesse período iniciou-se intensa perseguição àqueles que se opusessem aos seus dogmas e interesses. Iniciou-se uma sucessão de abusos de toda sorte, com a execução de qualquer um que atrapalhasse os seus propósitos. E cresciam a força e o poder que detinha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica foi até o fundo da igreja e bateu à porta do alojamento do pároco. Ouviu de dentro:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quem me procura?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Verônica, padre.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que deseja?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Lembrando-se do rosto inerte da mãe, os olhos dela encheram-se de lágrimas e, com a voz embargada, continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Preciso do senhor... O padre Edmundo apareceu à porta e, demonstrando contrariedade, falou áspero:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que deseja?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha mãe está morta, padre. Preciso de sua ajuda para os serviços finais aos seus despojes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O eclesiástico a mediu de alto a baixo. Por mais que desejasse mandá-la embora, sua posição o obrigava a tomar alguma providência. Ainda buscando alternativa, perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não tem nenhum sacerdote em sua família que possa prestar-lhe os últimos atendimentos? Estou muito ocupado hoje.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Respirando fundo, a jovem implorou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, padre, os poucos familiares que me restam vivem em terras distantes. Não posso levar o corpo de minha mãe para uma viagem tão longa... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não seria correto...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela silenciou por alguns instantes, depois prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Além do mais, ainda há focos da peste em alguns lugares. Não posso arriscar atravessar as plantações com um corpo...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de longo silêncio que se estabeleceu entre os dois, padre Edmundo disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito bem, minhas obrigações sacerdotais me impõem a realização dos serviços. Leve-a até o rio depois do almoço e faremos o que é necessário.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com lágrimas nos olhos, Verônica - em busca de algum conforto para sua dor - ajoelhou-se diante do padre, osculandolhe as mãos macias. Ele as puxou logo e reforçou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Logo no início da tarde. Não se atrase, estarei à espera.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, padre, obrigada.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem dizer mais nada ele entrou e fechou a pesada porta. Só depois de longo tempo frente à porta cerrada e fitando o vazio foi que Verônica enxugou as lágrimas e buscou a saída, atravessando a igreja. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">No corredor viu algumas mulheres, suas vizinhas, e uma delas lhe perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Conseguiu o que queria?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O padre Edmundo vai me ajudar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Somente um santo como ele para ter compaixão de vocês. Olhando para a mulher que lhe falava em tom agressivo, ela indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que lhe fizemos para terem por mim e por minha mãe tamanho desprezo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A outra ignorou a pergunta e continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Do que foi que ela morreu?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Claro que sabe. Foi da peste, não foi? - Não, é claro que não!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho certeza que foi. É castigo de Deus àqueles que lhe desobedecem...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica assegurou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sempre procuramos obedecer aos ensinos de Jesus.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sua mãe era uma bruxa e certamente foi castigada, e você também o será. Se a peste não a atacar, a Inquisição haverá de pegá-la. Não conseguirá livrar-se, como o fez sua mãe. Aliás, livrou-se tão-só porque o outro padre, antes de dom Edmundo, era um fraco e a protegeu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Para não agredir a mulher, Verônica saiu correndo da igreja em prantos. Correu a trancar-se no seu casebre, onde se agarrou ao corpo inerte da mãe, protestando em voz alta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você não podia me deixar aqui, mãe. Este é um mundo muito cruel...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Grossas lágrimas corriam pela sua face, quando o quarto foi subitamente envolvido em intensa e safírica luz. Verônica pôde registrar, assustada, a imagem de um jovem que se aproximou e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenha coragem e fé, minha irmã. Você não está sozinha. Sua mãe repousa e se recupera da longa jornada terrena, e você deve continuar firme sua tarefa. Estarão juntas novamente no futuro, mas agora precisa confiar em Deus e seguir na vida com coragem, como sua mãe lhe ensinou.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica limpou as lágrimas e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quem é você? Um anjo ou um demônio? Por que vejo você e as outras pessoas não? Por que isso acontece comigo e acontecia com minha mãe? Por que nos castigam com essas visões, fazendo-nos alvo da implacável perseguição religiosa que avança sobre todos os que são diferentes?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sorrindo com doçura, o rapaz comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quantas perguntas, Verônica!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Pousando as mãos sobre a cabeça da jovem, o rapaz fixou os olhos no céu e orou em silêncio. Uma chuva de pequenas luzes caía profusamente sobre Verônica, que se sentiu envolvida em suave e re-confortante sentimento de paz. Cessou o medo e a mente da jovem aquietou-se. O enviado do mundo espiritual falou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou aqui para fortalecer-lhe o ânimo. Não sinta pena de si mesma. A capacidade que traz consigo de ver e ouvir o mundo espiritual é dádiva de Deus àqueles que necessitam aprender novas lições e aqui estão para o trabalho do bem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Do que está falando? Que trabalho posso fazer? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Muitos dos que tiveram essa capacidade já morreram nas fogueiras. Não quero ser a próxima.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tenho medo, muito medo. Não quero passar pelo que já vi e ouvi outros passarem. Por favor, você pode fazer isso acabar? Tocando-lhe os cabelos com amor fraterno, ele disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não compreende, ainda, o que me pede. Deve utilizar sua sensibilidade para ajudar as pessoas. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Esta é sua tarefa aqui na Terra: ajudar seus semelhantes, a despeito de todas as dificuldades. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Foi isso que sua mãe lhe ensinou, não foi?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica baixou a cabeça e balbuciou sem coragem:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, foi isso, mas não quero correr o risco de morrer queimada. Sério, Alexandre a fitou nos olhos e disse, enquanto sua imagem<br />se desvanecia diante dos olhos da moça:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Essa foi sua escolha, Verônica. Faça bom uso dela e sirva a Jesus.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Espere, por favor, espere. Como faço para chamar você? O que devo fazer agora? Para onde vou?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O rapaz desapareceu. Verônica fitou o rosto sereno da mãe, que parecia dormir em profunda paz, e questionou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que faço, minha mãe? Que triste futuro me aguarda?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ficou em silêncio por muito tempo. Depois, sem motivo aparente, tocou no escapulário que a mãe lhe dera e relembrou o seu pedido para que se refugias-se no mosteiro, em Praga. Verônica relutava. Não queria nada com conventos, padres e freiras. Sentia repugnância pela Igreja desde pequena; a muito custo sua mãe e levava à missa aos domingos. Para a menina, aquilo sempre repre-sentara um martírio. Não obstante, tinha genuíno carinho por tudo o que se relacionasse a Jesus; sentia atração pelo Mestre nazareno e dele sabia muitas informações, bem antes de completar sete anos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Geórgia se surpreendia e ao mesmo tempo se alegrava com a natureza da filha. Temia por ambas, naqueles tempos extremamente difíceis para as mulheres, especialmente aquelas que dependiam de si mesmas para viver. Por diversas vezes foram humilhadas pelos vizinhos; entretanto, a dignidade da mãe inspirava Verônica, que cresceu admirando a ela e aos valores que dela adquirira.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de longo tempo, apertou fortemente a pequena moeda do escapulário e pediu a Jesus que lhe desse forças. Levantou-se, então, e preparou a mãe para ser levada à beira do rio Elba. Mais tarde, contemplava em silêncio as labaredas a consumir os despojes de Geórgia, que seguiam carregados pelas águas do caudaloso rio, enquanto as lágrimas corriam pela sua face lívida. A emoção dominava-lhe o espírito, e quase desfalecia. O padre prosseguia repetindo frases em latim, que ela não entendia, e fazendo várias vezes o sinal da cruz. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois da curta cerimônia, ele virou-se para a jovem e afirmou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pronto, está feito. Que Deus a perdoe. Erguendo os olhos ela o fitou sem coragem de dizer nada. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Apenas agradeceu mecanicamente:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Obrigada, padre.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Este a observou detidamente e perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que vai fazer agora?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica respondeu, com voz embargada pela dor que sentia naquele momento:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ainda não sei.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois é bom que pense depressa no que vai fazer daqui por diante; seria bom se me deixasse ajudá-la.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Vou recomendá-la ao convento de nossa ordem, para que a recolham e a preparem para servir a Nosso Senhor Jesus Cristo e à Santa Madre Igreja.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica sentiu forte opressão no peito. Lembrou de novo da recomendação da mãe sobre os perigos que poderiam estar a espreitá-la e, prudentemente, respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É uma boa idéia, padre. Preciso de poucos dias para me preparar; logo virei procurá-lo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou esperar que retorne o mais breve possível.</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-73274213272833876822017-09-17T14:04:00.002-07:002017-09-17T14:04:16.886-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 19 - Verônica trancou A Porta</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Verônica trancou a porta e fechou a rota cortina que cobria a pequena janela. Antes, olhou para fora e viu que começava a nevar outra vez. Sentou-se na cama e chorou por longo tempo. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois, movida por um sentimento de urgência que não compreendia, abriu o baú da mãe e de novo examinou um a um os objetos que ela guardava ali: um livro do padre Jan Huss<span style="font-size: small;">8</span>, amigo de Geórgia que ela não conhecia e que as ajudava através de outro amigo comum. Falou baixinho:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como minha mãe podia gostar de um padre como esse?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abriu o livro e fixou as páginas manuscritas, porém não sabia ler o suficiente para poder compreender o sentido do que lia. A mãe lhe estava ensinando as letras, embora ela própria também tivesse muitas limitações. Somente os nobres ou os padres, que se internavam nos conventos, recebiam educação; os simples e humildes, o povo, não tinha acesso a ela.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Verônica tinha sorte de a mãe poder ler um pouco e lhe transmitir algo. Essa era outra das razões por que as demais mulheres da vila não aceitavam as duas. Definitivamente elas eram diferentes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica folheou um pouco mais o livro e depois remexeu nos demais pertences. Correndo os olhos pela casa, separou e enrolou numa trouxa de pano o pouco de pão e frutas secas que tinha. Então voltou a olhar pela janela. A neve tinha parado. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Separou todas as roupas que possuía, e também as da mãe, e embrulhou tudo em outra trouxa de pano que fez com um lençol; tomando o pequeno baú nas mãos, recolocou dentro dele tudo o que a mãe guardava ali e o fechou. Acomodando as duas trouxas nas costas e o baú sob um dos braços, disse, indo para a porta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Preciso partir agora, imediatamente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Apertando a jóia simples que trazia no peito, suspirou fundo e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que Nossa Senhora me proteja e me mostre o caminho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Foi direto para o mercado central e por ali ficou, o mais discreta possível, observando o movimento.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ouviu que uma carroça com alimentos ia partir logo para Praga. Aproximou-se do proprietário da carroça, que não conhecia, e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Senhor, ouvi que se dirige para Praga...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, vim trazer minha filha para ver a avó doente e vamos retornar agora com alguns alimentos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Indecisa, ela arriscou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Preciso muito ir para a capital.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E uma viagem e tanto, moça.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu sei.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pode pagar?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Baixando os olhos, ela balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, senhor, não tenho dinheiro.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Calou-se por um instante, depois tentou de novo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho um primo em Praga que vai me ajudar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sem dinheiro, sem viagem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, senhor, preciso muito ir. Posso ajudar nos serviços de sua casa, como pagamento...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O homem pensou por alguns segundos; lembrando-se da sujeira em seu pequeno armazém, assentiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois bem, tenho uma pequena mercearia que precisa de uma boa limpeza. Se fizer o trabalho, e bem, posso levá-la.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está combinado. Limpo tudo e pago a viagem com esse trabalho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então suba. Vamos partir assim que minha filha chegar, antes que recomece a nevar. Não demorou muito e Verônica viu surgir ao longe o rosto meigo de uma jovem que andava depressa, procurando a carroça do pai. Ao avistar Verônica, sorriu, simpática. O pai logo esclareceu a presença da estranha, e a garota disse apenas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que bom! Teremos companhia para a volta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A carroça partiu, sumindo pela estrada. A viagem durou quase três dias inteiros. Nevou e parou de nevar algumas vezes durante o trajeto. Verônica co-chilava e acordava, apreensiva com aquela experiência e na expectativa do que a aguardava em seu destino.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Tão logo amanheceu, o padre Edmundo, em companhia de mais dois homens do vilarejo, bateu à porta da casa da jovem, chamando várias vezes por ela:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Verônica, abra. Vamos minha filha, precisamos conversar. Abra.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um dos homens opinou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não adianta, ela não vai abrir. Vamos entrar e levá-la à força! O outro concordou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, padre, não podemos permitir que ela continue fazendo sabe lá Deus o quê! Arrombe a porta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O outro homem forçou a porta, que não resistiu. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Entraram. Vasculharam o pequeno cômodo e, nada encontrando, foram direto ao mercado central. O padre comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deveria tê-la levado à força quando tive chance<br />- Devia mesmo, padre, não podia ter deixado que ela escapasse! Agora, espalhará o mal por toda a parte.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Calma, vamos descobrir para onde foi.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Chegando ao mercado, logo descobriram que uma jovem viajara com um comerciante de Praga, que para lá retornava. Um dos homens ameaçou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou atrás dela e a trago de volta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O padre o deteve pelo braço, sugerindo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou enviar um mensageiro ao arcebispo de Praga e alertá-lo sobre a garota. Achei que não seria necessário preocupá-lo, mas o farei imediatamente. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não precisam se preocupar. O nosso líder a achará sem demora e tomaremos as medidas cabíveis. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Enviarei o mensageiro agora mesmo. Antes que ela chegue, o arcebispo terá as informações.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O outro falou enérgico:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que seja queimada na fogueira dos hereges! E virando-se para o padre, indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E o casebre, o que fará? Vai queimá-lo também? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">O padre respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já está confiscado, agora nos pertence. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Melhor assim. Aliás, nem sabemos como foi que ela obteve o imóvel. Aquela mulher era ardilosa. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quase nos envolveu a todos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O outro homem, invocando na memória a figura de Geórgia, comentou reticente:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, era uma mulher perigosa...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />De volta à igreja, o padre Edmundo escreveu ao arcebispo de Praga, informando-o sobre a jovem e pedindo que tomasse providências.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Enquanto isso, Verônica entrava na capital do antigo reino da Boêmia. O homem mostrou-lhe o estabelecimento que deveria limpar e ela quis iniciar o trabalho de imediato. Catarina, a filha de Vicente, argumentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fique conosco esta noite. Você deve estar exausta, depois de tudo pelo que passou e ainda mais essa viagem. Fique conosco hoje e faça amanhã o trabalho combinado.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agradeço, mas não posso pagar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois não terá de pagar... Não é, papai?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Meio a contragosto, o pai ia responder, quando Verônica, tomada novamente por estranho sentimento de urgência, afirmou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso mesmo ficar. Agradeço a sua hospitalidade, Catarina, mas quero pagar o combinado e seguir meu caminho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E para onde vai? Conhece mesmo alguém na cidade?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, meu primo Boris mora aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Boris? E o que ele faz?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />No intuito de desviar a conversa para outro rumo, a jovem perguntou, ao avistar uma pequena mercearia:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É ali, senhor?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, essa é minha loja.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou começar já.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Está certo. Se estiver tão animada assim...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao abrir a porta da pequena loja, Verônica soltou um grito abafado. O estabelecimento estava imundo e até viu ratos se esconderem entre sacos de alimentos, montes de tecidos e outros objetos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Respirou fundo e pôs-se a limpar o salão. Era quase de manhã quando terminou. Ao ver tudo limpo, sentou-se em um canto da sala e, não podendo controlar o sono, adormeceu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ainda dormia quando escutou fortes pancadas na porta. De um salto, correu para trás de uns tonéis de carvalho que guardavam vinho; ficou agachada enquanto escutava a movimentação do lado de fora. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Olhou pela janela e viu dois padres indo para a entrada da casa, que ficava nos fundos da mercearia. Pegou as suas coisas que estavam junto da porta e, ao se certificar de que não era vista, saiu correndo e embrenhou-se na mata que ficava perto da estrada. A intervalos de alguns minutos, virava-se para ter certeza de que não era seguida. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Conhecia a cidade e foi em direção ao convento franciscano. Apesar de ficar bem distante, ela correu para lá sem parar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Os dois padres vasculharam a mercearia e não acharam nenhum vestígio da jovem. Vicente indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que foi que ela fez?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É uma herege. Proteja sua família dessa moça.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Catarina assistia, incrédula, a toda a cena. Assim que os dois padres saíram, ela falou ao pai:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pai, sabe que Verônica não é isso de que a acusam.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei de nada. Nós sequer a conhecemos!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas deu para notar que é boa pessoa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você não sabe o que está dizendo. Não quero que converse mais com ela, ouviu bem? Se a acusam, podem acusar-nos também.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E erguendo a voz, ordenou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não quero que a ajude, está claro?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem responder, a garota balançou a cabeça em sinal afirmativo, e entrou em casa chorando.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica alcançou os portões do mosteiro, que em seu anexo abrigava o convento. Bateu na pesada porta, chamando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, preciso de ajuda! Ajudem-me, por favor! Depois de alguns minutos, um padre apareceu e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que deseja, filha?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meu primo Boris é padre nesta irmandade. Ele me conhece bem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deixamos nossos parentes para trás quando nos unimos a Jesus, menina. O que deseja?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha mãe morreu, padre, e me pediu que viesse até aqui. Ela disse que seria auxiliada, se viesse para cá.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Se não a conheço, como posso acolhê-la? Como saber se me diz a verdade?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, padre, pergunte ao meu primo. Ele poderá dar todas as informações a meu respeito.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso permitir que entre uma estranha sem nenhuma recomendação...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O padre começou a fechar a porta, quando uma das trouxas escorregou e caiu dos ombros de Verônica; quando a moça se abaixou para pegá-la, o esca-pulário de Nossa Senhora lhe caiu para fora do vestido. Ao vê-lo, o padre parou e perguntou: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- De onde veio isso? - Era de minha mãe. Ela me deu, pouco antes de morrer. O padre olhou em volta e então disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Entre, vamos. Depressa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ambos entraram e o padre conduziu a jovem pelo interior do mosteiro.</span><br />
<br />
8 Jan Huss foi pensador e reformador religioso, precursor do movimento protestante.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-5865551676316788942017-09-17T13:52:00.002-07:002017-09-17T13:52:33.106-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 20 - O Sacerdote</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">O Sacerdote andava na frente. Verônica o seguia e, a cada passo que dava no interior da portentosa construção, sentia o coração bater mais descom-passado. Suas mãos suavam frio e seu desejo era sumir dali. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">À medida que caminhava, olhava as paredes altas e escuras daquela edificação e violentos arrepios lhe percorriam o corpo. Suas pernas estavam trêmulas e temia não conseguir completar a caminhada. De repente, o padre parou, tirou uma chave de um dos bolsos e, abrindo uma porta de madeira maciça, virou-se para ela:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Espere aqui - disse. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Vou buscar água e algo para você comer. Ela entrou, e em seguida ele trancou a pesada porta. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Verônica bateu em desespero, suplicando em lágrimas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, padre, o que vai fazer comigo? Por que está me trancando aqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela gritava e batia com força. A porta se abriu e o padre apareceu, recriminando-a:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fique quieta! Vou trazer-lhe comida e já volto.<br />- Por que me tranca aqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E o que quer? Devo avisar meus superiores. E se você resolve sair andando por esses corredores, antes que eu informe aos responsáveis que está aqui?... Não vou arriscar. Fique aqui, e calada. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Queria ajuda, não queria? Pois bem, está a salvo, seja lá o que for que a esteja perturbando. Agora, acalme-se que vou avisar também seu primo de sua presença.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica o observou desconfiada, medindo-o de cima a baixo, e depois falou num suspiro, enquanto ele fechava a porta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que posso fazer? Tenho de esperar... Ela ouviu a voz do padre:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso mesmo. Aguarde em silêncio, é o melhor que tem a fazer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele se afastou e a jovem observou o pequeno quarto em que estava. Ali havia uma cama, uma mesa e duas cadeiras; sobre a cabeceira da cama um gran-de crucifixo e, acima, uma janela minúscula, por onde alguma claridade entrava. Apesar de ser dia lá fora, o cômodo permanecia na penumbra, deixando ver parcamente os objetos que continha. Verônica acomodou seus pertences em uma cadeira e se sentou na cama. Embrulhou-se nas roupas, tremendo. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Começava a nevar e fazia muito frio dentro do austero aposento. Ela refletiu por alguns instantes, tentando recuperar o controle e compreender o que se passava. Lembrou-se da expressão nos olhos do padre ao notar o escapulário que trazia ao pescoço. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tirou-o e apertou-o entre as mãos, balbuciando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que este escapulário tem de tão especial? Sei que foi abençoado para proteger minha mãe, por Nossa Senhora, mas... O que o padre viu nele que o levou a me acolher sem vacilar? Não compreendo...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Encafifada, ficou a relembrar que a mãe o usava constantemente; nunca o tirava. Depois de algum tempo, ouviu uma voz de mulher anunciar:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Trouxe comida.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A porta se abriu e uma jovem freira entrou, colocando pão e água sobre a mesa. Sem olhar para Verônica, a freira saiu, fechando novamente a porta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela se alimentou e voltou a sentar-se na cama. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Cansada, acabou por se aquecer e caiu, por fim, em sono profundo. Transcorrido algum tempo, acordou assustada, ouvindo vozes. Sentou-se rápido na cama, sem entender o que acontecia e mesmo sem atinar onde estava. Tentando se localizar, viu a porta se abrir e um jovem entrar, saudando-a:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Olá, Verônica.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Logo atrás vinha a freira que antes trouxera a refeição da garota. Verônica fitou o rapaz, buscando na memória identificar aquele rosto que lhe parecia tão familiar. Ao olhar seus olhos, forte e indefinida emoção dominou-a. Teve vontade de chorar e de atirar-se aos seus pés. Ao mesmo tempo, um medo enorme, pavor até, apossou-se dela. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Afastou-se, ficando à cabeceira da cama, mas o jovem aproximou-se e estendeu-lhe a mão, dizendo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não fique assustada. Sou eu, Boris, seu primo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica, perdida em suas emoções, parecia não escutar. Encolhia-se cada vez mais na cabeceira da cama. Boris parou e falou com voz calma:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que está tão apavorada? Sei que não nos vemos há muitos anos, mas ainda assim deve lembrar-se de mim. Que idade tem agora?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica respondeu mecanicamente:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quase dezoito.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você deve estar cansada, criança. Veio de longe... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Como conseguiu chegar até aqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ainda temerosa, ela não respondeu. Boris insistiu:<br />- Não tenha receio, Verônica. Aqui estará segura. Fique calma. Agora quero que me conte tudo o que aconteceu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Dominada pelo medo e pelo cansaço, ela desabou, entre lágrimas: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Minha mãe morreu. Não tenho mais ninguém nesta vida. Estou sozinha, abandonada. Estou com medo e não tenho a quem pedir ajuda. Minha mãe me disse que viesse procurá-lo, mas acho que não devia ter vindo... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">É que não tinha a quem recorrer...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O padre, homem esguio e de porte nobre, procurou tranquilizá-la:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você não está mais sozinha. Fez bem em nos procurar, estará amparada aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica sentia uma vontade quase incontrolável de abraçar o primo e, por outro lado, desejava correr para bem longe. Ficou imóvel enquanto ele a ob-servava, parecendo desconfiado. Depois, ao ouvir tocar o sino, ele ergueu-se e recomendou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agora descanse. Logo mais o bispo celebrará a missa das seis horas e você deve se juntar a nós.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Foi até a porta e, antes de fechá-la, disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A irmã Adriana virá buscá-la mais tarde.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Assim que a porta se fechou, Verônica deitou-se na cama e não pôde controlar as lágrimas. Sentia-se desprotegida e aflita. Aquele breve encontro com o primo não a fizera sentir-se melhor. Sem saber ao certo por que, Boris sempre a assustara, desde que eram pequenos. Nove anos mais velho do que ela, sempre a tratara de maneira rude e agressiva. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Experimentava em relação a ele emoções conflitantes: temor e carinho, medo e desejo de aproximar-se. Definitivamente, não o compreendia e o temia. Crescera distante do primo, que vira poucas vezes; no entanto, guardava em seu íntimo forte impressão dos poucos encontros que haviam tido.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Perdida em suas lembranças da infância e vencida pelo cansaço dos últimos dias, Verônica tornou a adormecer. Quando despertou, sentia-se ligeira-mente mais animada. Sentou-se na cama e observou com maior atenção os detalhes do pequenino ambiente que ocupava. A angústia assolar-lhe o coração. Qual seria o seu futuro? Ficaria para sempre presa naquele cubículo? Não era o tipo de vida a que aspirava. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Sonhava ter uma família, filhos - muitos filhos - , um lar e uma vida com fartura; queria viajar, vestir belas roupas... Sim, desejava ardentemente vestir belas roupas. Sempre que encontrava uma dama da nobreza, com seus trajes lindos e vistosos, ficava a desejar o mesmo para si. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">A jovem suspirou, lembrou-se da mãe e sussurrou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu não vou ficar aqui para sempre. Não vou mesmo!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Escutou alguém chegando. Depois de duas leves batidas, a porta se abriu e a freira que já estivera ali disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Boris enviou esta roupa e pediu que a vestisse.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao tomá-la nas mãos Verônica viu como era austera e indagou: - Que roupa é esta?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- São os trajes que toda noviça usa ao entrar para a ordem. Depois, ao se tornar freira, veste-se igual a mim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica ficou sem ação. A freira informou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vista-se. Aguardo lá fora. Assim que estiver pronta me avise, para que eu corte os seus cabelos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica sentiu o sangue sumir-lhe do rosto. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Adorava seus cabelos - eram lindos, louros, e tinha verdadeira paixão por eles. Porém, antes que pudesse esboçar qualquer objeção, a freira saiu e fechou a porta. A jovem sentou-se na cama sem saber o que fazer. Levantou-se e andou de um lado para outro. Olhou a roupa sobre a cama e colocou-a em frente ao corpo; depois, atirou-a longe, em prantos. Caminhou até onde estava a roupa, pegou-a e sentou-se com ela entre as mãos. Tocou os cabelos e ergueu-se, firme. Foi até a porta, abriu-a e chamou a freira:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Entre, por favor, preciso falar com você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que ainda não está pronta? Temos de chegar antes de começarem os serviços religiosos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Qual é o seu nome?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Irmã Adriana.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E seu nome de batismo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Esse é o meu nome de renascimento. Você precisa se vestir.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que quer cortar meus cabelos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Todas as noviças fazem isso quando entram para a ordem. E uma maneira de renunciarmos à vaidade e ao orgulho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas eu não quero ser noviça. Eu não quero ser freira.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então, o que veio fazer aqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica caminhou de um lado ao outro no quarto. Depois, sentando-se ao lado da freira, desabafou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu vim porque necessito de proteção. Estou sozinha no mundo e preciso que alguém me ampare.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois então, veio ao lugar certo. Nosso Senhor Jesus Cristo há de protegê-la. Em troca, entregue-lhe sua vida.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você não está entendendo. Eu não tenho nenhuma vontade de ser freira. Quero viver a minha vida, tenho sonhos, planos para o futuro. Não quero aca-bar aqui dentro, apodrecendo em um cubículo como este.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A freira ergueu-se e, com evidente contrariedade, disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você acha que todos que estão aqui vieram porque foram chamados por Deus? Não, moça. A grande maioria está aqui por outros motivos. Mas aqui estamos e só nos resta servir à Santa Madre Igreja da melhor maneira. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Muitos estão aqui obrigados, então?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não diria obrigados, e sim compelidos pelas circunstâncias, como no seu caso. Você foi trazida pela vida e o melhor que tem a fazer é conformar-se. Lutar contra o destino causará maior sofrimento ao seu coração. Não foi sua mãe que lhe pediu para vir?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica, sem ânimo para responder, inclinou a cabeça concordando.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois então, ela sabia o que é melhor para você.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;"> Agora vamos, vista-se.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica, resoluta, declarou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, eu não vou. Você não vai encostar um dedo em meus cabelos. Eu não quero ser freira. Não vou.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Irmã Adriana saiu sem dizer nada. Alguns minutos depois, a porta se abriu de novo e Boris entrou, sério.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vista-se e deixe que a irmã Adriana corte os seus cabelos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso, não quero ser freira.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O arcebispo de Praga está lá fora à sua procura. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ele quer conversar com você e averiguar determinados eventos referentes à sua mãe... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Pretende julgar se você é ou não uma herege, uma bruxa. Foi isso o que me disse.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A jovem empalideceu. Ele continuou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu lhe disse que você está sob a proteção da irmandade e que se tornará freira. Só assim obtive a concordância dele em deixá-la em paz. Prefere que eu o chame aqui agora, para levá-la?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Quase sem poder respirar, a jovem respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Claro que não.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois vista a roupa que lhe enviei e assuma o seu destino. Veio em busca da minha ajuda, e eu posso ajudá-la indicando-a à irmandade para que se torne urna servidora da Igreja; e assim, se seu comportamento for adequado, a Inquisição poderá deixá-la em paz.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele silenciou por alguns instantes, depois prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então, o que vai ser? Geórgia sabia o que estava fazendo. Ela quis protegê-la. Vamos, vista-se. Você não tem alternativa. Ou assume a nova vida, ou vai ficar sem nenhuma.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Aturdida e sem saber o que fazer, ela pegou a roupa das mãos do primo e ainda insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você não pode fazer alguma coisa? Eu não quero ser freira. Não pode me ajudar de outro modo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele esboçou ligeiro sorriso e respondeu, antes de fechar a porta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Até poderia, minha prima, mas sempre achei você e sua mãe muito estranhas. Acho que deve mesmo se tornar uma servidora da Igreja. Eu quero que seja freira, para sua própria proteção. Em seguida, fechou a porta atrás de si e saiu. Verônica sentia o corpo inteiro tremer. Queria sumir dali, o que era impossível. Estava claro que o primo, por alguma razão, a fizera prisioneira. Enquanto as lágrimas lhe corriam pela face, ela trocou de roupa e entreabriu a porta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já me vesti - informou. A freira entrou e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito bem. Sente-se, que vou cortar seus cabelos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com uma faca afiada ela começou a cortar as lindas mechas de Verônica. A cada novo corte, os fios caíam pelo chão e para a jovem era como se um punhal lhe fosse cravado no peito. Sentia que, junto com os cabelos, perdia parte de sua vida. Ao terminar, a freira convidou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pronto. Agora sim, está preparada para tornar-se uma noviça. Venha comigo, e não fale com ninguém. Você deverá fazer voto de silêncio até se tornar freira.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Limpando as lágrimas, a jovem indagou: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- E quanto tempo isso irá levar?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso Boris definirá com sua santidade o arcebispo.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Amargurada e sem saída para aquela situação, Verônica seguiu a freira pelo corredor, até alcançarem a grande capela. Um coral de freiras entoava cânticos sacros, enquanto ela era colocada ao lado de outras duas jovens, que também iniciavam o noviciado naquela noite.</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-54731706310835228762017-09-17T13:44:00.000-07:002017-09-17T13:44:00.777-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 21 - O Ato litúrgico</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBAbjFvI8w0uGNQ-dJbaHQMdHEJtXKJrnqJPHLqSN9m4ViyZ6igjWh3weuGsQvm3w5OcOoRtPS9XDX25DO_Wo_SgkB6JYY0LlLdJyBWSOoqrFMxyHI6yG04SvmeM2XukFEn_BJiGyQu8/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">O ato litúrgico seguia sem contratempos. Verônica assistia a tudo o que ocorria à sua volta como se não estivesse acontecendo com ela. Seu desejo era desaparecer daquele lugar. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Aquilo lhe parecia um pesadelo. A certa altura, fitou a imagem do Cristo crucificado e, envolvida pela emoção, orou baixinho:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Jesus, você foi crucificado e sofreu tudo o que não merecia. Sabe melhor do que ninguém o que é sofrer. Ajude-me, por favor... Eu quero sair desta situação e não sei como. Perdoe-me se me julga ingrata, mas não desejo ser freira nem servir à Igreja. Não acredito que a Igreja, tal qual se apresenta hoje, esteja a seu serviço.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sentindo a angústia aumentar, à medida que a solenidade se encaminhava para o momento de oficializar o ingresso das jovens nos serviços eclesiásticos, ela murmurou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ajude-me, por favor, Jesus. Ajude-me, minha mãe, de onde você estiver... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Enquanto as lágrimas lhe desciam pelo rosto, ela era conduzida por uma freira ao altar onde receberia a bênção do arcebispo e seria oficialmente recebida pela Igreja. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ao lado do arcebispo estava Boris.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela foi a última da três jovens e, ao aproximar-se, ouviu-o perguntar ao padre:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É esta?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, santidade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele a fitou de cima a baixo e, detendo-se nos olhos, comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tem os mesmos olhos irrequietos da mãe. Ante a surpresa de Verônica, chamou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Venha, minha filha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A jovem caminhou devagar. Ao chegar bem perto, ele disse, áspero:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero seu escapulário.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela o fitou, incrédula, e o ouviu prosseguir:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Assim que terminarmos, tire-o e segure-o. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quando nos despedirmos e vier me beijar a mão, entregue-o sem que ninguém perceba.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Incapaz de acreditar no que escutava, ela balbuciou, tentando sorrir:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pertenceu à minha mãe e é a única lembrança que trago dela. Não, meu senhor, não posso entregá-lo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E afastou-se depressa, antes que ele pudesse reagir. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Baixou a cabeça e voltou ao seu lugar próximo às outras noviças. Quando a solenidade terminou, Boris se aproximou dela e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não será tão ruim assim, você verá, minha prima.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela o encarou sem responder. Depois, levantou-se e seguiu as demais jovens sem dizer nada. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Acompanhava as outras moças pelo longo corredor, enquanto maquinava como faria para sair dali, para fugir da cidade. Seu coração batia descompassado e suas mãos estavam frias. Desejava ardentemente jamais ter entrado naquele local, naquela armadilha. Finalmente entrou em seu quarto; irmã Adriana fechou a porta, dizendo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Amanhã, às cinco horas, virei despertá-la para as orações da manhã. Depois teremos o desjejum e uma longa lista de tarefas a realizar. Assim que ba-ter, deverá levantar-se, entendeu?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem suportar mais, explodiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isto é uma verdadeira prisão! Vocês me transformaram em uma prisioneira!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A freira sorriu e respondeu, irônica:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Melhor presa aqui do que no tribunal da Inquisição, que é certamente onde estaria neste momento, se não tivesse sido acolhida por nós. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Agradeça a seu primo e à intervenção dele junto ao arcebispo, que está bastante disposto a colocá-la nas mãos dos inquisidores. Portanto, moça, aquiete-se e aprenda a servir à Igreja com devoção. Quem sabe, com isso, Deus se apiede de você e a perdoe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem esperar resposta, a moça fechou a pesada porta atrás de si e Verônica lançou-se na cama, chorando desesperada. Não demorou muito a ouvir barulho no corredor e logo a porta se abriu. Era Boris. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Verônica ajeitou-se na cama e perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que quer?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O arcebispo pediu que viesse buscar o escapulário.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não! Isso eu não vou dar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas por que, criatura?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E por que ele o quer tanto? O que deseja fazer com uma lembrança querida de minha mãe? Não posso me separar dele!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Olhe, Verônica, para mim essa medalha nada significa, mas o arcebispo a quer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Enfurecida, ela ergueu-se e desafiou, altiva:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois então que venha ele mesmo buscá-la e me diga por que deseja tanto uma coisa sem valor para ele, e que para mim vale tanto.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deixe-me apenas ver o escapulário. O padre que a recebeu me falou dele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Afinal, o que tem de tão especial? Boris insistiu:<br />- Deixe-me vê-lo. Não vou tirá-lo à força.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />De longe, Verônica tirou-o de dentro da blusa e deixou que o primo o visse.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele se espantou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não é à toa que o padre deixou-a entrar. Somente a alta cúpula da Igreja possui escapulários azuis, como esse. São extremamente raros e pertencem às mais eminentes personalidades. Onde Geórgia o conseguiu?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Guardando a peça, ela respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei, não faço a menor idéia. Minha mãe nunca me disse, mas jamais tirou-o do pescoço. Sempre o usou, desde as mais remotas lembranças eu a via com ele.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Seria melhor para você não fazer o arcebispo vir até aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se aproxime, Boris, ou vou gritar! Você já me fez muito mal.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Já bem perto da prima, Boris tocou-lhe os cabelos macios e disse, balançando a cabeça:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deveria me agradecer, priminha. Estou lhe prestando um grande favor. Sabe que não existiria futuro para você se eu não a estivesse ajudando.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Se deseja me ajudar mesmo, deixe-me ir embora daqui. Ajude-me a fugir! Não quero viver neste lugar... O jovem padre deu uma gargalhada e andou até a porta, dizendo:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você nunca sairá deste lugar, ouviu? Sua vida, agora, pertence à Igreja e também a mim. Vou usá-la de acordo com meus interesses. Afinal, sou seu protetor aqui dentro, e enquanto assim for estará suficientemente protegida. Saiba, porém, que a um estalar de meus dedos você estará em poder da Inquisição. Portanto, pense muito bem e se comporte, minha prima. Faça o que digo e continuará viva.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes que o jovem deixasse o quarto, ela indagou, entre lágrimas:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que me detesta tanto?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele a fitou, mas seu olhar parecia buscar alguma reminiscência do passado. Por fim, falou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Só o que sei é que sempre me provocou verdadeira aversão. Desde o primeiro dia em que pus os olhos em você. Não sei, deve ser algo que faz, o que você é... Talvez seja mesmo o demônio se expressando através de seus atos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Após tal afirmação, fechou a porta e saiu, deixando-a desconsolada. Muito tempo se passou até que ela adormeceu e recebeu uma visita espiritual; era uma jovem que, sentando-se ao seu lado na cama, disse com doçura:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Verônica, escute-me.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O corpo espiritual de Verônica se desprendeu e sentou-se, atordoado, ao lado da bela jovem. Ela disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sinto-me confusa e estranha. Quem é você? Que sensação é esta?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Vendo o próprio corpo adormecido na cama, gritou assustada:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que está acontecendo? Estou morta?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não, seu corpo físico está dormindo e precisamos conversar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quem é você?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sou uma amiga. Verônica, você tem de resignar-se à situação em que se encontra. Não deve arquitetar planos de fuga.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que me diz? Se não compreende o desespero que sinto neste lugar, você não pode ser minha amiga!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu compreendo bem seus sentimentos, acredite. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ainda assim, sei que você está no lugar em que deveria estar. A vida é muito mais do que as ilusões que alimentamos em torno dela. Nossa vida é eterna. Já tivemos outras existências e muitas outras teremos. Cada uma será o reflexo do bem ou do mal que plantarmos com nossos atos diários.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Limpando as lágrimas, a jovem encarnada afirmou:<br />- Mas eu não faço o mal.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tampouco faz o bem. Está na hora de usar sua sensibilidade e começar a ajudar as pessoas que necessitam. E que melhor lugar do que este, onde a oportunidade de auxiliar acontece dia e noite? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Do que está falando?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Aqui você terá oportunidade de ajudar muitas pessoas. E ainda poderá ser colaboradora de importante obra que está para principiar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Depois de breve pausa, ela prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Já ouviu falar de Jan Huss?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vagamente.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Poderá colaborar com ele, se tiver paciência e nos escutar. Verônica segurou a cabeça entre as mãos e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não estou entendendo nada...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Afagando-lhe os cabelos, a entidade espiritual esclareceu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você concordou em vir para cá e ficar perto de seu antigo inimigo, de modo a servir-lhe e buscar cultivar sua simpatia e seu perdão.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- De quem está falando?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que sentimentos Boris lhe desperta? Verônica pensou um pouco, depois nomeou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Medo, tristeza, culpa...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Exatamente. Em existência pregressa, há muitos séculos, você arquitetou a morte de seu enteado. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Distanciou-se do bem que poderia ter cultivado e perdeu-se em orgulho e vaidade. Após desencarnar vagou durante séculos, e seu inimigo a perseguiu por escuras cavernas, nas regiões sombrias do planeta. Sofreu muitas dores até ser finalmente resgatada por abnegados servidores da luz. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Em várias etapas de aprendizado, reencarnou algumas vezes. Por fim, mais preparada, aceitou regressar para resgatar os débitos contraídos com esse inimigo do passado. Agora tem nova oportunidade de convívio, exatamente como desejou. Seja forte.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Peça ajuda a Deus, com sinceridade, e submeta-se à sua vontade amorosa. E para seu próprio bem.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quando recobrou um pouco de lucidez, percebeu o quanto se desviara da senda que deveria trilhar e arrependeu-se. Não reincida num caminho tortuoso. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Aprenda a ouvir seu coração. Nós vamos lhe falar através dele. Ouça-nos. Ouça sua consciência. Sua sensibilidade foi intensificada para ajudá-la a nos perceber melhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fazendo grande esforço para compreender o que dizia aquela bela jovem, ela procurou confirmação:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quer dizer que prejudiquei Boris em outra vida?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito. Você colocou pai contra filho, e vice-versa. Suas intrigas e insinuações venenosas instilaram desconfiança e ódio entre os dois. E como resultado da intemperança do pai, ele acabou com a vida do filho.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica soltou um grito de horror e murmurou:<br />- Não pode ser verdade... Não posso ter sido esse monstro... Sorrindo afetuosa, a entidade tomou-lhe as mãos e falou, carinhosa: - Todos já praticamos crimes contra as leis de Deus. Não há um só ser que não tenha cometido erros. Estamos aqui para auxiliá-la a consertar os enganos do passado. Para isso, precisa aprender a perdoar-se, com humildade, e conviver com Boris, buscando ser-lhe útil, ganhando sua simpatia e por fim seu perdão. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Somente assim poderá refazer esse doloroso momento de sua história. Não conseguirá retomar o caminho da ascensão espiritual enquanto não se redimir com Boris.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica ficou muda por alguns instantes, depois comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não consigo me lembrar... Como era o nome dele?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele se chamava Crispus. Verônica arregalou os olhos e gemeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Crispus... Crispus... Sim, eu me lembro...</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-19078555528410427892017-09-17T13:36:00.003-07:002017-09-17T13:36:33.867-07:00Capítulo 22 - O Inverno<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhfItXy7KvZ58KM1-G_dN-Qnuik2wV_1SAKne0poRe_5qZcV2Qd3XjbF2xs9t6QED2qmfGokRooFevqhY-MloS4NXEIRQEibsojafh6wDYmEQUtQS07kbw8LpF-kvbNgYnAoNyS4CGDFrs/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhfItXy7KvZ58KM1-G_dN-Qnuik2wV_1SAKne0poRe_5qZcV2Qd3XjbF2xs9t6QED2qmfGokRooFevqhY-MloS4NXEIRQEibsojafh6wDYmEQUtQS07kbw8LpF-kvbNgYnAoNyS4CGDFrs/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">O Inverno de 1402 se anunciava dos mais rigorosos. O dia amanheceu muito frio. A neve cobria as ruelas da esplêndida cidade de Praga e o ar gelado dificultava a respiração dos caminhantes. O extenso rio Vltava, congelado, transformara-se na sensação das crianças e dos jovens, que adoravam andar sobre ele durante o período em que assim permanecia.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A reforma da bonita capela estava quase terminada.</span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Venceslau<span style="font-size: small;">9</span> veio pessoalmente supervisionar o andamento das obras. Depois de caminhar por todo o interior da capela, comentou, ao sair:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quando poderão entregá-la pronta?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Dentro de três ou quatro meses, majestade.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que tanto tempo? Já está quase tudo feito!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O arquiteto responsável calou-se, enquanto o rei meditou um pouco antes de determinar:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Contratem mais homens, se isso resolver. Quero que me entreguem a capela no máximo em dois meses. Vou colocá-la logo para funcionar!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Um dos arquitetos adiantou-se e disse, resoluto:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos providenciar mais homens para abreviar os trabalhos de renovação da capela.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Muito bem! Têm dois meses.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao entrar na carruagem, comentou com a esposa, que o aguardava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mais dois meses e estará pronta. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Está ficando uma beleza, Venceslau. Já decidiu quem vai ser o próximo responsável por ela?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O jovem rei pensou por instantes, visualizando a figura do homem que havia escolhido, e respondeu:<br />- Sim, vou colocá-la nas mãos de Jan Huss.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Excelente! Ninguém poderia ser melhor! Creio que esse é o homem escolhido por Deus para conduzir nossa capela de Belém<span style="font-size: small;">10</span>. Já contou a ele sobre sua nova responsabilidade?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ainda não.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois faça-o logo. Ele ficará feliz.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Jan tem estado muito ocupado. Suas atribuições como reitor da universidade estão tomando bastante seu tempo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se preocupe, querido. Sei que ele está decidido a denunciar os abusos da Igreja, e não há melhor modo de fazê-lo do que lhe oferecendo o púlpito da capela, onde vai falar em nossa própria língua, estendendo a todos a possibilidade de compreensão dos serviços religiosos. Ele saberá usá-lo muito bem. Afinal, tem preparo e coragem para enfrentar os clérigos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Venceslau, atento à manifestação da esposa, fitou-a sério e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acha mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não tenho qualquer dúvida.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O rei silenciou e ela sorriu, detendo-se em minuciosa observação da cape-la, enquanto a carruagem se afastava. A neve começou a cair novamente sobre a cidade, e Vesceslau e a rainha foram direto para o Castelo de Praga, lar da família real da Baviera.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao entrar, o soberano ordenou a um de seus mensageiros:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero que mandem chamar Jan Huss. Desejo vê-lo o quanto antes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Jan Huss, então com 33 anos de idade, havia assumido a reitoria da Facul-dade de Filosofia de Praga e comandava-a com paixão. Fortemente influenciado pelas obras de John Wyclif<span style="font-size: small;">11</span>, tornou-se abertamente defensor da idéia de que a Igreja precisava passar por profunda mudança, por uma reconstrução espiritual, para retornar à sua essência; não aceitava a supremacia papal, mas a doutrina de que Cristo, e não Pedro, era o chefe da Igreja, considerando o Evangelho como única lei que deveria ser seguida. Sentado a sua mesa, Jan empunhava a pena e escrevia quando o mensageiro do rei lhe bateu à porta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Entre.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Cumprimentando-o com sincera simpatia, o jovem mensageiro informou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sua alteza, o rei Venceslau, deseja vê-lo, senhor. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Quer que jante com ele esta noite.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"></span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Jan Huss se levantou e caminhou até a janela. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Entreabriu-a e logo sentiu no rosto o vento gelado. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois, virou-se para o rapaz e disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É claro que irei ter com o rei. Pode confirmar minha presença à mesa real.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O mensageiro se retirou e o padre ficou fitando pela janela a bela cidade de Praga, que se tornara seu lar; havia muito trocara sua pequena Husinec pela grande cidade. Depois voltou a sentar-se e retornou as notas com as quais preparava uma obra em que denunciava os abusos da Igreja Católica. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Jan amava o Evangelho com desvelo e recitava-o praticamente de cor. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Meditava nas lições deixadas por Jesus e encantava-se com a beleza e profundidade daqueles ensinos, que julgava ainda distantes da compreensão dos religiosos de seu tempo. Por alguma razão de que não tinha total clareza, a grande maioria do clero não entendia o Evangelho, tampouco se comprometia em aprofundar suas experiências e meditações sobre Jesus e seus ensinamentos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Para ele, a Igreja tornara-se um amontoado de dogmas e regras que serviam aos interesses temporais e terrenos de seus líderes, que estavam muito distantes das verdadeiras lições do Mestre de Nazaré. Jan se preocupava também com o povo e seus sofrimentos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tocado pela dor do próximo, era freqüentemente visto pelas ruas distribuindo mantimentos e conversando com as pessoas, que buscava consolar e atender sempre que podia. Tornara-se um homem respeitado pelo clero e pela nobreza, e amado pelo povo tcheco.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Logo que entardeceu, Jan se dirigiu ao castelo. Sentado à mesa em companhia de Venceslau, da rainha Sofia, do arcebispo de Praga e de alguns membros da nobreza tcheca, o rei informou sua decisão.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- A capela de Belém em breve estará completamente renovada. Quero que assuma sua direção e seu púlpito, Jan.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O padre sorriu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fico extremamente honrado, majestade. Gostaria imensamente de expressar com maior liberdade meus pensamentos a respeito das mudanças que creio serem necessárias à Igreja.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois, com meu consentimento, tão logo a capela esteja pronta, assumirá seu comando e poderá dizer o que pensa sobre a situação da Igreja e apresentar suas idéias para a necessária renovação. Erguendo pesada taça de ouro puro, cravejada com pedras preciosas, Venceslau levantou-se e conclamou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Um brinde à nossa capela e ao seu novo líder. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tocados os copos, o rei finalizou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Saúde.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com discreto sorriso nos lábios, o arcebispo acompanhava a movimentação. Simpatizava com Jan, embora por vezes o achasse demasiado apaixonado e emotivo. No entanto, acreditava que eram arroubos do jovem pobre de Husinec que em poucos anos se tornara influente e admirado. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Acompanhava seus mínimos gestos e analisava-os com atenção.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ao final da celebrada ocasião, despediu-se de seu anfitrião:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Preciso retirar-me, alteza. O rei objetou.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tão cedo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Meus deveres são muitos, senhor, preciso mesmo ir.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois então vá, arcebispo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes que o clérigo terminasse de vestir a capa, com vista a proteger-se do intenso frio que fazia fora do palácio, o rei indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Crê que nossa capela de Belém estará em boas mãos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como não? Jan é um padre estudioso e capacitado, e seu poder de retórica o fará um excelente pregador. Temos o homem apropriado para as funções.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fico satisfeito.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Boa noite, alteza.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Retirando-se, o arcebispo foi direto para o monastério, à procura de Verônica. Assim que chegou, perguntou sobre a jovem. Adriana informou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ela está trancada em seu quarto, senhor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vou até a biblioteca. Traga-a até mim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ocupando uma cadeira espaçosa próxima à lareira, o arcebispo ajeitava de leve a lenha quando Verônica, assustada, apareceu à porta. Estendendo-lhe a mão para que a beijasse, o arcebispo convidou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, minha filha, entre.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Como a moça parecia hesitar, ele insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Entre. Sente-se, precisamos conversar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica entrou e se acomodou em uma cadeira de onde o olhava de frente. Ele limpou a garganta e disse, pegando de sobre a mesa uma carta manus-crita:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Tenho aqui informações sobre a senhorita. Fugiu, não é mesmo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica observava o religioso em absoluto silêncio. Seus olhos azuis acompanhavam-lhe os menores gestos. Ele ergueu-se, caminhou até bem próximo dela, fitou-lhe o rosto e comentou: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- E muito bonita, Verônica... Como sua mãe. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ouvindo falar da mãe, a jovem animou-se a perguntar:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Conhecia minha mãe?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim, conhecia-a muito bem. Fez breve pausa, depois prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como acha que conseguiu entrar neste mosteiro?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei. Acho que por causa de meu primo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Boris?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Esboçando cínico sorriso, o arcebispo redarguiu:<br />- Sua entrada neste santuário nada tem a ver com seu primo, muito embora agora ele seja o responsável por você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O arcebispo se ergueu novamente, caminhou até a moça e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deixe-me ver o escapulário.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Instintivamente, como para proteger a preciosa lembrança que trazia da mãe, ela segurou-o forte sob as vestes e murmurou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E um presente de minha mãe. Pertencia a ela e agora é meu. Erguendo ligeiramente a voz, o religioso ordenou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quero vê-lo já! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">-Não!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Minha jovem, não seja inconseqüente. Sei que não é isso que sua mãe desejaria, por isso mesmo deu a você esse precioso objeto que agora ordeno que me entregue.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica continuou a segurá-lo firme, e o arcebispo acrescentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho um pedido aqui em minhas mãos para entregá-la à Inquisição, a fim de que a investiguem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com os olhos arregalados de terror, a jovem ajoelhou-se diante do religioso e implorou:<br />- Por favor, não faça isso... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Erguendo-a, ele sussurrou-lhe ao ouvido:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Então colabore. Deixe que eu veja o escapulário. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Temerosa, a jovem puxou a pequena peça e colocou-a sobre a roupa. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">O arcebispo tomou-a nas mãos, observou-a atentamente e a arrancou com força do pescoço da jovem, que caiu no chão em prantos, indagando:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que faz isso? O que tem meu escapulário que não pode permanecer comigo? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Diga-me vossa santidade, explique-me para que eu entenda...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Com a peça presa nas mãos, ele disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E um escapulário muito especial, feito exclusivamente para uns poucos servidores da Igreja; existem apenas cinco.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Retirou de dentro da batina seu próprio escapulário, e Verônica percebeu que eram idênticos. Ele prosseguiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não deveria estar nas mãos de hereges! </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Ele pertencia à minha mãe e agora pertence a mim!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não. Pertence a seu pai, que jamais o deveria ter dado. Entretanto, apesar dos graves deslizes que ele cometeu, permanece fiel à Igreja. Vou devolver esta jóia ao legítimo dono.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica mal podia respirar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O arcebispo ergueu-se e caminhando para a porta comentou, antes de sair:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O padre que a recebeu à porta na outra noite é o verdadeiro dono do escapulário.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele saiu, deixando Verônica trêmula pela chocante revelação. Adriana apareceu em seguida e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, precisamos nos recolher; já é muito tarde, venha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Quase incapaz de se manter sobre as próprias pernas, Verônica andou até o quarto e, sem pronunciar sequer uma palavra, entrou e sentou-se em sua cama, ainda chocada. </span><br />
<br />
<br />
9 Venceslau IV, da casa de Luxemburgo, foi rei da Boêmia e governou entre 1363 e 1419.<br />
<br />
10 A capela de Belém foi fundada no ano 1391, como o lugar onde se pregava em checo, e tinha capacidade de albergar 3 mil pessoas.<br />
<br />11 John Wyclif foi professor da Universidade de Oxford, teólogo e reformador religioso inglês, considerado precursor das reformas religiosas que sacudiram a Europa nos séculos XV e XVI. Trabalhou na primeira tradução da Bíblia para o idioma inglês, que ficou conhecida como a Bíblia de Wyclif.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-50748414077417342462017-09-17T13:24:00.002-07:002017-09-17T13:24:36.359-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 23 -Verônica Fitava O Nada</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhfItXy7KvZ58KM1-G_dN-Qnuik2wV_1SAKne0poRe_5qZcV2Qd3XjbF2xs9t6QED2qmfGokRooFevqhY-MloS4NXEIRQEibsojafh6wDYmEQUtQS07kbw8LpF-kvbNgYnAoNyS4CGDFrs/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhfItXy7KvZ58KM1-G_dN-Qnuik2wV_1SAKne0poRe_5qZcV2Qd3XjbF2xs9t6QED2qmfGokRooFevqhY-MloS4NXEIRQEibsojafh6wDYmEQUtQS07kbw8LpF-kvbNgYnAoNyS4CGDFrs/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">Verônica fitava o nada, enquanto sentia as lágrimas quentes descerem pelo rosto. Deitou-se e, fechando os olhos, chorou amargurada. O que a vida lhe reservara? Somente dor e angústia. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois pensou no pai, de quem a mãe pouco lhe falava; quando o fazia era com carinho e ternura e sempre dizia que ele fora servir a Deus em outras terras. Ela não compreendia, e a mãe não es-clarecia. Deitada sob o teto do monastério, a jovem refletia: então a mãe a enviara ao encontro do pai, e não do primo? Seria mesmo verdade? E por que o pai não lhe dissera nada? Afinal, como poderia ser um padre da Igreja, e com o conhecimento do arcebispo? Sentia-se confusa e triste. Depois de chorar muito, acabou por adormecer.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Duas semanas se passaram. A rotina de Verônica era desgastante: levantava-se por volta de cinco horas da manhã e seguia direto para a capela, onde fazia suas preces junto com outras noviças e freiras. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Então seguiam em absoluto silêncio até uma grande sala de refeições; a uma mesa enorme, todas faziam o desjejum sem qualquer barulho. Logo em seguida ela começava sua jornada de trabalho, que incluía limpar o chão dos corredores, dos quartos e dos demais cômodos, enfim, do grande mosteiro. Antes do almoço ela se lavava e retornava à capela, para mais orações. Depois do almoço, nova rodada de trabalho, desta vez na cozinha. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">E assim que começava a escurecer, jantava e ia direto para o quarto. Presa naquela rotina diária, sentia-se prestes a enlouquecer. Naquela noite, em especial, quando voltou para o quarto, sentou-se na cama, desalentada. Sentia que suas forças se esvaíam e estava quase desfalecendo. Sem ânimo para se vestir para dormir, permaneceu longo tempo sentada. Então, bateram na porta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que deseja, irmã Adriana? - ela disse. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Estou muito cansada e me preparando para dormir.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Uma voz de homem respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei que está cansada, minha filha, mas deixe-me entrar. Ela se levantou e foi até a porta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quem é você?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />O homem baixou ligeiramente a voz ao dizer:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sou padre Thomas. Abra, por favor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que deseja?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Preciso falar com você. Somente um instante.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso falar com ninguém, padre. Estou aqui, reclusa. Não vê minha situação? Todas as moças estão juntas num mesmo quarto, mas eu permaneço isolada.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu sei, filha. Mas tenho algo que lhe pertence.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Curiosa, Verônica entreabriu a porta e reconheceu de imediato o semblante do padre que a recepcionara no dia de sua chegada. Seu coração disparou e parecia querer sair-lhe pela boca. Pela pequena fresta da porta aberta o fitava, quando ele insistiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deixe-me entrar, Verônica.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Enfim ela abriu mais a porta e o padre logo entrou, fechando-a. Verônica se afastou, sem desviar o olhar daquele homem, em quem via seus próprios olhos e a mesma cor dos seus cabelos. Padre Thomas aproximou-se um pouco mais e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não tenha medo, estou aqui para oferecer meu apoio.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Um pouco tarde, não acha?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Nunca é tarde, filha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois para mim é. Minha vida está destruída. E tudo por quê? Porque vim para este lugar...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sei que está sofrendo, porém precisa aprender a acalmar seu coração e a confiar em Deus. Ele sabe o que é melhor para nós.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso aceitar a vida que estou levando.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sua mãe a enviou para cá para protegê-la, e você sabe disso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Proteger-me do quê?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- De seu dom.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Do que está falando? - De sua capacidade de ver e falar com pessoas que já morreram, de prever o futuro, de saber fatos que aconteceram em locais distantes, totalmente desconhecidos por você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não me lembro de nada disso...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você é sonâmbula e faz isso enquanto dorme, Verônica.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como sabe?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sua mãe me contou em diversas ocasiões.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como, se nunca vi os dois juntos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu a encontrava rapidamente quando passava pelo vilarejo, em alguma viagem. Foram poucas as vezes, mas nos vimos e ela me contou sobre o que ocorria com você. Sua mãe se preocupava bastante com seu futuro, com sua segurança, e por isso não teve escolha, a não ser enviá-la para cá. Ela sabia que assim, mais perto, eu poderia tomar conta de você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Baixando a cabeça, Verônica guardou silêncio. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Padre Thomas deu seqüência à narrativa:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu e sua mãe nos conhecemos antes de eu me tornar padre e nos apaixonamos. Minha família, constituída por nobres, planejava que eu servisse à Igreja, contudo, meu coração pertencia a Geórgia, não mais a mim mesmo. A família de sua mãe era de camponeses, gente simples e honesta. Meus pais não admitiam sequer a hipótese de nos casarmos. E quando descobriram que ela possuía capacidade semelhante à sua meu pai ameaçou entregá-la à Inquisição, caso eu insistisse em vê-la. Disse inclusive que, se decidíssemos fugir, nos caçaria até o fim do mundo e a entregaria à Inquisição. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Geórgia via espíritos até desperta, e ficava completamente tomada pelas visões. O padre silenciou brevemente, e Verônica balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu sei... Presenciei o fato algumas vezes.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu era jovem e não sabia ao certo o que fazer. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tentando protegê-la, aceitei sagrar-me padre. Meu pai ficou satisfeito e acalmou-se. Antes, entretanto, decidi encontrar-me com ela uma última vez e explicar-lhe o que se passava. Foi aí que descobri que ela esperava um filho... você, Verônica.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Lágrimas desciam dos olhos do padre. Verônica o escutava com atenção e ele prosseguiu.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu não podia fazer nada... Não podia casar-me com ela, como desejava, porque se o fizesse minha família a destruiria. Nós dois concordamos, então, que ela deveria ir para longe de Praga, para algum lugar distante, onde pudesse criar você. Eu lhe dei todo o dinheiro que consegui, bem como adquiri uma pequena propriedade, onde vocês passaram a residir. No dia em que ela partiu, antes ainda de você nascer, entreguei-lhe isto. Padre Thomas depositou o escapulário nas mãos de Verônica e fechou-as, enquanto continuava:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sempre que podia, passava lá para vê-la, sem jamais me aproximar muito, temeroso das conseqüências que isso poderia acarretar a ela e depois a você.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele emudeceu por longo tempo. Depois, acariciando-lhe os cabelos dourados, disse:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sinto muito, minha filha, por tudo o que você já sofreu. Sinto não lhe ter dado tudo o que eu desejava. Não foi possível... Não tive a coragem suficiente para lutar contra todos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Tive muito medo por sua mãe e por você. Eu já presenciei diversas ações da Inquisição e sei do que é capaz. Não poderia permitir que vocês se expusessem a qualquer risco. Consegui proteger sua mãe e você. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Mesmo meu pai sabendo de tudo, fiz um acordo com ele para que nada as atingisse, se me mantivesse a serviço da Igreja. E aqui estou, cumprindo minha parte. Meu pai também cumpriu a dele, enquanto estava vivo. Há dois anos morreu, e o cerco começou a se fechar sobre você e sua mãe. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Só aqui você poderia estar em relativa segurança. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Abraçando-a com profundo carinho, pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não duvide do meu amor por você, filha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica fitou o pai com seus grandes olhos azuis e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Essa injustiça nunca terá fim? A Igreja seguirá abusando do poder, sem pensar em nada e em ninguém? Onde está Deus que não faz nada?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Deus está sempre perto de nós, filha.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas como?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ele envia seus mensageiros para orientar os homens. Existe um padre em Praga que está se levantando para falar sobre os abusos da Igreja, os absurdos que são feitos em nome de Deus. Ele traz alguma esperança aos corações daqueles que, como nós, se sentem oprimidos pelo poder esmagador da Igreja.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Limpando as lágrimas, a moça indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Quem é ele?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Jan Huss.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Acho que vi esse nome entre as coisas de minha mãe.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Dei a ela cópia de alguns manuscritos que ele escreveu. Geórgia desejava ardentemente que mudanças acontecessem. Ela não sabia ler muito bem, mas esforçava-se para tentar ler os manuscritos de Huss. Onde estão eles?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica abriu uma pequena caixa que pertencera à mãe e mostrou os manuscritos. Ele comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Você saber ler, não é?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Um pouco. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">-Então aproveite para conhecer os escritos de Huss. Sei que lhe farão bem, filha. E lembre-se de pedir por ele em suas preces... Se prosseguir com suas declarações, precisará do apoio de todos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ambos se conservaram em silêncio por alguns minutos, até que o padre anunciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agora é prudente que eu vá. Não perca as esperanças. Sobretudo, não perca a fé em Deus.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Apertando o escapulário que mantinha entre as mãos, Verônica perguntou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O arcebispo vai tirá-lo de mim outra vez?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por ora, guarde-o em algum lugar seguro, da mesma forma que os escritos de Huss. O arcebispo o aceita, mas sei que não comunga das suas idéias. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Guarde o escapulário com carinho. Ele é seu, minha filha, não importa o que qualquer um diga a respeito disso.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E o arcebispo? O que fará se souber que não tem mais a jóia?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se preocupe. Deixe que me entendo com ele. Verônica fitou o pai e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não pode ajudar-me a fugir daqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu gostaria muito... Acontece que seu primo tem forte ascendência junto ao arcebispo e o convenceu plenamente de que seu lugar é aqui, para que possa redimir-se de seus pecados contra a Igreja.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Isso não é verdade...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu sei que é um equívoco, mas Boris é influente e não sei por que motivo cismou que você deve ser freira, para ser protegida de si mesma...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- É um absurdo...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- São muitos os absurdos, Verônica, ainda muito maiores do que este nosso drama pessoal.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Dirigindo-se para a porta, ele se despediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Agora devo ir, filha. Boa noite.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Hesitante, a jovem só respondeu depois que a pesada porta se fechou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Boa noite... pai...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica pôde escutar os passos do pai que acabara de conhecer se afastarem pelo longo e úmido corredor. Buscou, então, os escritos de Jan Huss e sentou-se na cama. Com a vela que iluminava o ambiente já bem pequena, mesmo assim ela começou a ler os textos. Quando a luz se apagou por completo, ajeitou-se entre as cobertas e pela primeira vez em muito tempo sorriu antes de pegar no sono.</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3531131734290615787.post-4161075484896793272017-09-17T13:16:00.001-07:002017-09-17T13:16:13.276-07:00<span style="color: #660000;"><span style="font-size: x-large;">Capítulo 24 - O Dia Amanhecera</span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgElvjv7c9huzMiU0hhXELL-XOlFqM8PoA2QMpGNCWq3jlBX3_VyhxAES1L5SJClxwLH0HojLlWPQ1s2I-0Bt62NJdLfGvHufzMmr6_4KCj13NS_Yx2QXFm6oRVSzPgumdEgcz7E-RcseI/s1600/cap.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="347" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgElvjv7c9huzMiU0hhXELL-XOlFqM8PoA2QMpGNCWq3jlBX3_VyhxAES1L5SJClxwLH0HojLlWPQ1s2I-0Bt62NJdLfGvHufzMmr6_4KCj13NS_Yx2QXFm6oRVSzPgumdEgcz7E-RcseI/s200/cap.jpg" width="138" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-large;">O dia amanhecera radiante, cheio de energia; uma vibração suave e ao mesmo tempo intensa podia ser captada pelas almas mais sensíveis. As ruas da cidade estavam repletas de flores, cujo perfume se espalhava pelo ar em todas as direções. Era primavera em Praga e naquela manhã especial as pessoas não cessavam de chegar para a missa inaugural de Jan Huss à frente da Capela de Belém. Quando, enfim, ele se dirigiu ao púlpito, o recinto estava lotado. Muitos fiéis acorriam para vê-lo e ouvi-lo, dentre eles padre Thomas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Grande número de espíritos a serviço de Jesus também se fazia presente, envolvendo o ambiente em luz fulgurante e lhe conferindo igualmente forte proteção, de maneira a impedir que entidades das trevas ali penetrassem.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Antes de sair de sua sala, Jan observou o salão lotado. Sentindo o coração envolvido pelas suaves luzes que enchiam a atmosfera, respirou fundo, como a sorver aquelas vibrações e, com os olhos rasos de lágrimas, orou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Jesus, meu Mestre, graças te dou pela oportunidade de falar em teu nome, pela possibilidade de te servir por meio das palavras. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Sinto em meus ombros o peso da responsabilidade por aquilo que proferirei a todas essas pessoas, que aqui procuram o alimento para suas almas. Ajuda-me, senhor, a falar o que é de tua vontade. Não me permite colocar os olhos em mim mesmo; impede-me de dizer uma só palavra que esteja em desacordo com a tua vontade e os teus desejos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ampara-me a boca e os lábios, para que sejam instrumentos de tuas misericordiosas palavras. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Amém.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Em seguida, resoluto, adentrou o salão e ocupou seu lugar ao lado do rei. Venceslau outorgou-lhe oficialmente, diante de todo o povo, a condução da capela e o seu púlpito, e depois se sentou. A rainha Sofia presenciava, satisfeita, a solenidade. O arcebispo também acompanhava os mínimos movimentos do clero, da nobreza, e especialmente de Jan Huss. Ele, então, tomou o púlpito e pela primeira vez celebrou toda a missa na língua tcheca, e não em latim, como era o usual em todas as igrejas católicas, de sorte que todos o podiam compreender. Falou sobre a força da fé em Deus e a necessidade do homem de nele depositar total confiança. Depois levou o povo a meditar sobre a urgência das reformas que a Igreja precisava se comprometer a realizar, se quisesse servir a Deus, auxiliando o povo a fortalecer sua fé.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Eloqüentes e persuasivas, suas palavras foram recebidas com extrema simpatia pela quase totalidade dos presentes. Não obstante guardasse reservas frente à empolgada preleção de Huss a respeito dos abusos da Igreja, o clero o apoiava, na maioria, crendo que suas pregações fortaleceriam a Igreja tcheca.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Vesceslau e especialmente Sofia estavam radiantes ao deixar a capela. Sentiam, confiantes, como se nova etapa se iniciasse. De fato, aquele momento marcaria a oposição declarada de Praga aos abusos eclesiásticos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A alguns quilômetros dali, em uma clareira, quatro entidades espirituais assistiam a distância a movimentação na capela. Uma delas comentou, visivelmente contrariada:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não estou gostando nada do que vejo.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E... Também não me agrada o rumo que as coisas estão tomando - respondeu outra. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Com esse andar a situação poderá complicar-se para nós.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A terceira comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não pudemos nos aproximar... Isso não é bom...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E a que se mantivera calada ergueu a voz para ordenar:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Calem-se. Não estão vendo que necessitamos de concentração? Precisamos de Núbio aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por quê? Ele é capaz de nos trucidar por não termos sequer nos aproximado...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Fique quieto, se não tem nada inteligente a dizer...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A grotesca figura ia se defender, quando chegou uma entidade espiritual envolta em pesado e negro manto. Os quatro se colocaram em posição de reve-rência e cumprimentaram Núbio, que os fitou e indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que se passa? Por que me chamaram?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não pudemos alcançar a capela e não conseguimos saber detalhes do que está acontecendo...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele olhou atentamente para o local e depois comentou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ora, não é preciso esforço algum para saber o que se passa.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />E tomando com violência o rosto de um deles, mostrou a movimentação:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estúpida criatura, o que está vendo?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não sei...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Olhe bem, preste atenção...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estão conversando, sorrindo... Parecem felizes...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Exatamente! Exultantes, para ser exato.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que não pudemos ir até lá?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vocês são patéticos... O que acham? Os espíritos de luz nos impuseram barreira vibratória.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas você não poderia tê-los impedido?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E claro que poderia, se estivesse aqui, não é mesmo? Esse era o trabalho de vocês... Em busca de defesa, uma das entidades objetou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Nós tentamos... E foi por isso que o chamamos... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Bufando impaciente, Núbio ficou longo tempo a observar e viu quando Jan Huss saiu da capela em alegre conversação, junto ao arcebispo de Praga. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Depois verificou que diversos padres e bispos o cumprimentaram com sincera simpatia e, virando-se para os companheiros, declarou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Temos muito a fazer aqui. Esse Jan Huss parece que nos dará trabalho. Conquistou a simpatia do clero. Continua lendo aquele professor inglês?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenho acompanhado seus estudos e escritos e sei não só o lê com freqüência, como parece inspirar-se nele para escrever os próprios textos. E evidente que o adotou por mentor.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como eu imaginava. Estamos diante de uma criatura que certamente nos criará problemas.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Calou-se por instantes, pensativo, e concluiu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Mas nada que não possamos controlar e vencer. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Vamos, temos muito trabalho a fazer. Esse Jan Huss precisa ser destruído.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />As quatro entidades, lideradas por Núbio, logo desapareceram, enquanto comentavam:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como faremos?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não se preocupem. Nossa falange é grande e temos auxiliares espalhados em todos os cantos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Não será difícil manipular os homens de acordo com nossos interesses.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Na porta da capela, padre Thomas cumprimentou Huss, parabenizando-o pela importante conquista. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Assim que saiu, retornou para o mosteiro e foi dire-to procurar a filha. Batendo na porta do quarto, chamou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Verônica, você está aí?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abrindo pequena fresta, ela respondeu baixinho:<br />- Sim, estou aqui.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Thomas percebeu que a jovem escondia o rosto e estranhou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que está havendo, filha? Abra a porta.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Hesitante, a jovem acabou por abrir, e o pai entrou. Ao ver seu rosto machucado e suas mãos em carne viva, assustou-se:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que aconteceu com você?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ela baixou os olhos e, esforçando-se para conter a tristeza, balbuciou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu caí...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Ele examinou o ferimento perto dos olhos e o das mãos, e insistiu:<br />- Vamos, conte-me. O que está havendo? O que aconteceu? Não suportando mais, ela explodiu em lágrimas: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Eu estava limpando a escadaria principal do mosteiro. Boris me obrigou a limpá-la quinze vezes. Cada vez que aparecia, dizia que o serviço estava mal feito, que eu precisava fazer tudo outra vez. E de novo e de novo me obrigou a limpar. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Da última vez, eu já não conseguia pegar o pano, mas ele insistiu que eu deveria repetir a limpeza. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ergui-me e mostrei-lhe o estado de minhas mãos, mas ele retrucou que aquilo não era nada, que muitas penitências a que ele próprio se obrigara já o haviam ferido muito mais. Eu não suportei: </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">avancei contra ele, que me empurrou. Caí e ele me empurrou novamente; desequilibrei-me e rolei da escada... Foi assim que feri os olhos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E ele, o que fez?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Cheia de ódio, Verônica respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Saiu dizendo que pediria a alguém para me ajudar.<br />- Não a acudiu?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Nem tomou conhecimento. Fiquei caída, gemendo, até que a irmã Adriana veio me ajudar, garantindo que a culpa fora minha por tentar agredir o padre Boris. Deu-me o recado de que deveria terminar o trabalho e depois ir para a capela do mosteiro, rezar durante o resto da noite para ser perdoada por tê-lo agredido...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A jovem não conseguiu dizer mais nada. Thomas abraçou-a com profundo carinho e ela chorou convulsivamente em seu ombro. Quando conseguiu se acalmar, indagou entre suspiros e soluços:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por que isso tem de acontecer? O que fiz ao meu primo para que ele me odeie? O que fiz, pai?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />-Não sei, filha. Às vezes parece-nos que a vida é injusta, mas sei que não é.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Claro que é, pai! Esse Deus a quem vocês tanto dizem obedecer é um ser que não nos ama. Do contrário, por que nos faria sofrer tanto? Não consigo aceitar...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fitando-a longamente, Thomas custou a falar. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Enfim, inspirado por Angélica, entidade espiritual que o acompanhava, indagou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que sua mãe costumava dizer sobre questões dessa natureza?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica limpou os olhos e fitou o pai em silêncio. Depois, baixou a cabeça e respondeu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Dizia-me que Deus sabe todas as coisas, que é bom e amoroso, mas que a Igreja tomou o seu lugar na Terra e está abusando demais do poder que o Todo Poderoso lhe concede.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Geórgia era uma mulher singular. Tinha uma compreensão tão clara das coisas que chegava a me assustar. Ela estava certa, filha. Entendia as verdades espirituais melhor do que a maioria dos padres. Não podemos atribuir a Deus uma culpa que é nossa. - Nossa culpa?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Dos homens em geral.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não posso concordar. Então, por que ele permite que coisas como essas aconteçam? Por que permite que homens inescrupulosos abusem do poder, destruindo vidas, como faz a Inquisição?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- E quem diz que permite? Quem diz que o Pai não está agindo para mudar as coisas?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Não... Não posso aceitar esse Deus. Há muita injustiça na Terra. Veja o meu caso: o que fiz para ter de sofrer desta forma?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Sem saber o que responder, Thomas voltou a abraçar a filha e pediu:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Tenha calma, por favor. Ainda que não possamos compreender de imediato, deve haver uma razão; nós é que a desconhecemos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Temos de confiar em Deus, Verônica, e ele haverá de nos auxiliar. Não podemos desacreditar...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Eu não posso confiar em um Deus que permite tantas injustiças e tanta dor...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Abraçando-a mais forte, Thomas ficou calado por um bom tempo; então, segurando o rosto belo e delicado da filha, limpou-lhe as lágrimas e pediu mais uma vez:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos confiar em Deus. Afinal, houve algo de bom em tudo isso: nós nos encontramos e estamos juntos.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Verônica esboçou leve sorriso, depois baixou a cabeça e chorou sentida. Estavam ainda juntos quando Boris bateu à porta:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Vamos, Verônica, tenho trabalho para você. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Thomas abriu e o jovem padre o fitou, empertigado:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- O que faz aqui?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Estou visitando a jovem Verônica.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Sua filha, não é? </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">-Sim.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Pois é bom que não interfira em meus métodos. </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">Ela é minha responsabilidade, e pretendo ensinar-lhe, a meu modo, como se serve à Igreja. Haverá de ser mais humilde e obediente, isso será mesmo!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Ela está muito machucada, Boris. Apenas dê-lhe um tempo para se recuperar.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Venha, Verônica. Vamos limpar a capela hoje.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />A jovem arregalou os olhos e, mostrando as mãos, questionou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Como poderei limpar algo, com as mãos neste estado?</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Que limpe com a boca, com os pés! Vai trabalhar para a Igreja para aprender a ser-lhe útil.</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Por favor, Boris, deixe-me descansar um pouco... </span><br />
<br />
<span style="font-size: x-large;">- Venha, agora!</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Thomas fez menção de interferir, mas Boris antecipou-se e avisou:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Se você se intrometer, Thomas, vai piorar a situação dela. E farei com que seja transferido para bem longe. Talvez para outro continente, quem sabe? Precisamos expandir a mensagem da Igreja por toda a parte...</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />Fazendo breve pausa, virou-se para Verônica, puxou-a pelo braço e ao saírem dizia:</span><br />
<span style="font-size: x-large;"><br />- Venha, vamos trabalhar, que o seu mal é a preguiça...</span>Unknownnoreply@blogger.com0